terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

O QUE FAZ UM ESCRITOR, SEGUNDO RUBEM FONSECA

           
No Correntes d'Escritas de 2012 Rubem Fonseca apresentou os seus cinco mandamentos para se fazer um escritor: loucura, alfabetização, paciência, motivação e imaginação.
           
          
loucura
          
"É preciso ser louco", disse ele, glosando o escritor norte-americano E. L. Doctorow, para quem escrever é uma forma socialmente aceite de esquizofrenia. E acrescentou: "Nessa mesa somos todos loucos. Cada um à sua maneira". Têm dúvidas? "Então leiam o texto do Foucault sobre as relações entre a loucura e a escrita literária".
          

alfabetização
          
"Basta ser louco?", questionou-se Rubem Fonseca. "Não. É preciso ser alfabetizado". Ajuda, de facto. "Mas não precisa de ser muito", brincou o autor de Bufo & Spallanzani. "Só existe um exemplo de um escritor analfabeto e foi no século XIV. Catarina de Siena". Mas esta era santa. Por isso: "Só podia ser milagre". Mas atenção, frisou Rubem Fonseca: "Como santa ela era louca, porque todos os santos são loucos". Não há dúvida.
          
Adiante, que um terceiro mandamento se seguiu. Antes, uma ideia retirada de Conrad. "Todo o escritor deve fazer um leitor sentir e, acima de tudo, ver. Eis o que é mais importante. Ver para poder entender". E isso envolve inteligência? Nem por isso, basta lembrar o que dizia Somerset Maugham: "Ele conheceu centenas e centenas de escritores e poucos, muito poucos eram inteligentes. Eu concordo com ele, sabiam?".
          

motivação
          
Então o que é preciso? O terceiro mandamento: "O escritor tem de ser motivado". Sem ela, nada faz. O mesmo dizia Rubem Fonseca no livro de crónicas José, em que recorda a sua infância: "Se o aspirante a escritor não tiver uma motivação forte escreverá quando muito alguns poemas de dor de cotovelo, alguns contos, talvez mesmo um romance, mas logo desistirá".
          
Não se pense, contudo, que a motivação é coisa de outro mundo. Qualquer uma é válida. Veja-se o caso de Manuel Vázquez Montalbán, lembrou Rubem Fonseca: "Ele escrevia para poder ser alto e bonito", pois era "baixinho" e um "pouco feio".
          

paciência
                
Já íamos com três características dos escritores. Faltavam duas, percebemos à medida que o show continuava. "É tudo? Não. Ele, o escritor, tem de ter paciência." Não uma paciência qualquer, mas a que o imperador romano Augusto cultivava, segundo Suetónio: Festina lente. "Apressa-te devagar". Nunca parar de fazer, mas fazê-lo devagarinho, como diria um bom alentejano. Todos os dias. Escrever, mas procurar sempre "le mot juste" de que falava Flaubert. "Ele, sim, sabia que não havia sinónimos. Ouviram, não existem sinónimos". Para esta intervenção também não. Um espectáculo. Que ainda não estava acabado.
          

imaginação
          
"Muito bem", continuou Rubem Fonseca, com a nossa concordância. "Acabou?", acrescentou, com a plateia a responder por ele: "Não". Pois é. Faltava uma coisa. "Ele, o escritor, tem de ser imaginativo. Tem de ter imaginação." A mesma que encontramos nos seus livros.
             
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            Texto de Luís Ricardo Duarte , 24 de Fevereiro de 2012.
          
[Post original: http://comunidade.sol.pt/blogs/josecarreiro/archive/2012/02/28/escritor.aspx]