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quarta-feira, 10 de setembro de 2014

INQUIETAÇÃO (José Mário Branco)


          
            
INQUIETAÇÃO

A contas com o bem que tu me fazes
A contas com o mal por que passei
Com tantas guerras que travei
Já não sei fazer as pazes
        
São flores aos milhões entre ruínas
Meu peito feito campo de batalha
Cada alvorada que me ensinas
Oiro em pó que o vento espalha
Refrão
Cá dentro inquietação, inquietação
É só inquietação, inquietação
Porquê, não sei
Porquê, não sei
Porquê, não sei ainda
        
Há sempre qualquer coisa que está pra acontecer
Qualquer coisa que eu devia perceber
Porquê, não sei
Porquê, não sei
Porquê, não sei ainda.
         
Ensinas-me fazer tantas perguntas
Na volta das respostas que eu trazia
Quantas promessas eu faria
Se as cumprisse todas juntas

Não largues esta mão no torvelinho
Pois falta sempre pouco para chegar
Eu não meti o barco ao mar
Pra ficar pelo caminho
        
Refrão /2 vezes
         
Há sempre qualquer coisa que eu tenho que fazer
Qualquer coisa que eu devia resolver
Porquê, não sei
Mas sei
Que essa coisa é que é linda!
          
Letra e música de José Mário Branco
             
             
Ficha de abordagem do tema musical “Inquietação
               
1. Caracteriza esta canção, quanto à sua melodia.
2. Atendendo à época em que a canção foi escrita, refere o motivo da inquietação do poeta.
3. Identifica a “coisa linda” que o poeta tem de resolver.
4. Destaca a importância da repetição no poema.
5. Menciona a personagem da peça: ”Frei Luís de Sousa” que melhor se identifica com esta mensagem do poeta? Justifica.
             
José Manuel Cardoso Belo. Vila Real, Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, 2010, p. 175.
         
                  
Texto de apoio
            
A Simbiose Sinestésica Intertextual da Poesia Musicada em Sala de Aula:“Inquietação” (letra e música José Mário Branco)
          
Ritmo –quaternário.
Melodia -marcada pela viola, pela expressiva e simbólica guitarra de fado com laivos de solos enigmáticos e “jazzísticos” de saxofone. Sendo este último símbolo da voz humana, a sua intervenção evoca inquietação e angústia. À semelhança do soneto, cujo último verso se chama “Chave de Ouro”, também este derradeiro verso termina em apoteose.
Harmonia – rica, constituída por vários instrumentos com influência de música jazz, solta, liberta.
Análise semântica - Na primeira quadra, o passado de sofrimento de lutas pelas quais o autor passou impede-o de desfrutar de um momento de harmonia com o próprio poeta, “de fazer as pazes”. Na segunda, o poeta hiperboliza, ironizando com as flores que nada valem para o conforto pessoal. O autor utiliza a primeira pessoa com a finalidade de conseguir exprimir a sua tentativa de desprezo para com a inquietação “cada alvorada que me ensinas oiro em pó que o vento espalha”.
O refrão apresenta uma melopeia – repetição de sons nasais que, à semelhança do eco, vai em busca do recetor; contudo, volta ao ponto de partida. Esta característica gera um conflito pessoal revelado a nível musical pelas cordas abafadas, reprimidas da viola. O mal-estar provocado pela inquietação está evidente no som do saxofone alto que exprime variações insistentes de sofrimento. O cantautor sente o impulso de atingir o objetivo, de dar resposta à sua inquietação pois não consegue justificar a sua atração pelo desconhecido, pelo ainda irrealizável, pela concretização de um bom sonho – viver em democracia. O motivo de inquietação de Madalena – personagem da peça: “Frei Luís de Sousa” conteúdo programático abordado, é a tentativa infrutífera de fugir ao destino: tal como acontece no poema em análise: “Isso é que seria lindo”.
            
José Manuel Cardoso Belo. Vila Real, Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, 2010, p. 130-131.
        
           
Poderá também gostar de:
   
 Poesia útil e literatura de resistência” (A literatura como arma contra a ditadura e a guerra colonial portuguesas), José Carreiro

   
                        


[Post original: http://comunidade.sol.pt/blogs/josecarreiro/archive/2014/09/10/inquietacao.aspx]

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