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quarta-feira, 29 de junho de 2022

Shakespeare: De ti me separei na primavera

 

Soneto 98

 

De ti me separei na primavera:

quando o risonho abril, ao sol voando,

em cor e luz, a plenas mãos, cantando,

nova alegria entorna1 pela esfera2

 

No viridente3 bosque até dissera

o pesado Saturno4 ver folgando5

Porém nem cor vistosa ou cheiro brando

Lograram6 incender7 minha quimera8.

 

A brancura dos lírios, não a vi…

O vermelhão das rosas desmaiava…

Eram fantasmas só… ao pé de ti

– o seu modelo – quanto lhes faltava!

 

Par’cia inverno; e eu, a viva alfombra9,

Só pude imaginá-la a tua sombra.

 

“Soneto XCVIII”, William Shakespeare, trad. Luís Cardim,

Rosa do mundo, 2001 poemas para o futuro,

Lisboa, Assírio & Alvim, 2001, p. 915

 

Notas:

1.     Entorna – verte, derrama.

2.    Esfera – Terra.

3.    Viridente – verdejante, viçoso.

4.    Saturno: personificação mitológica do Tempo. O deus romano Saturno refugiou-se no Lácio, onde fez florescer a idade de ouro, transmitindo ao Homem os segredos da agricultura.

5.    Folgando – brincando, divertindo-se.

6.    Lograram – conseguiram.

7.     Incender – incendiar, atear, inflamar, abrasar.

8.    Quimera – ilusão, sonho, fantasia, coisa resultante da imaginação.

9.    Alfombra – erva, tapete de verdura, chão arrelvado.




Questionário sobre a leitura do Soneto 98 de Shakespeare.

1. No Soneto 98 de Shakespeare, o sujeito poético recorda um acontecimento da sua vida. Indica de que acontecimento se trata. Esclarece também por que razão é expressiva a antítese entre esse acontecimento e a estação do ano em que tal ocorreu.

2. Refere a forma como a Natureza é caracterizada nas três primeiras estrofes e identifica o recurso expressivo presente nessa caracterização.

3. Justifica a utilização do advérbio “porém”, no verso 7.

4. Apresenta a forma como o sujeito poético vê a natureza na terceira estrofe, justificando a sua perceção.

5. Refere o recurso expressivo presente na expressão “Par’cia inverno” e justifica esta afirmação final.

6. Identifica o tema do texto.

 

Correção:

1. O sujeito poético recorda que a separação da mulher amada ocorreu na estação do ano menos prevista, visto que a primavera é frequentemente associada ao impulso da vida, ao início de um ciclo de prosperidade e, por conseguinte, à vida amorosa que também deve florescer e crescer dentro de nós.

2. Através da personificação do mês de abril, o sujeito poético realça uma natureza alegre, luminosa, dinâmica, verdejante, despreocupada e brincalhona.

3. O advérbio conetivo «porém», usado no início do verso 7, marca um contraste entre a realidade descrita atrás, associada à felicidade, e o que sucedeu ao sujeito poético, relacionado com a tristeza e a deceção.

4. A natureza não tem beleza para o sujeito lírico: os lírios não têm a brancura normal e o vermelho das rosas era ténue. A natureza é vista desta forma porque o sujeito lírico não está perto da mulher amada, que é para ele o modelo em que a natureza se inspira para ser bela. A natureza reflete os sentimentos do sujeito lírico.

5. Ao utilizar a comparação, o sujeito lírico sente que vive no inverno, porque não consegue sentir-se em sintonia com a primavera e mesmo o que a natureza ainda possui de belo só poderá ser, para ele, uma sombra da beleza da mulher amada.

6. O tema do poema é sobre os efeitos que a separação da amada provocam no sujeito poético.

 

Bibliografia:

Conto Contigo 8, Conceição Monteiro Neto et al. Porto, Areal Editores, 2013.

Contos & Recontos 8, Carla Marques e Inês Silva. Lisboa, ASA, 2014.

P8, Ana Santiago e Sofia Paixão. Lisboa, Texto Editores, 2014 (2.ª ed.).

(Para)textos 8, Ana Paiva et al. Porto, Porto Editora, 2014.




CARREIRO, José. “Shakespeare: De ti me separei na primavera”. Portugal, Folha de Poesia, 29-06-2022. Disponível em: https://folhadepoesia.blogspot.com/2022/06/shakespeare-de-ti-me-separei-na.html


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