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quarta-feira, 14 de dezembro de 2022

D. Tareja e D. Filipa de Lencastre, heroínas da Mensagem, de Fernando Pessoa

Mensagem, de Fernando Pessoa

Primeira Parte – Brasão

II - Os Castelos

 



 

Quarto

D. TAREJA

 

As nações todas são mistérios.
Cada uma é todo o mundo a sós.
Ó mãe de reis e avó de impérios.
Vela por nós!

Teu seio augusto amamentou
Com bruta e natural certeza
O que, imprevisto, Deus fadou.
Por ele reza!

Dê tua prece outro destino
A quem fadou o instinto teu!
O homem que foi o teu menino
Envelheceu.

Mas todo vivo é eterno infante
Onde estás e não há o dia.
No antigo seio, vigilante,
De novo o cria!

24-9-1928

Fernando Pessoa, Mensagem. Lisboa: Parceria António Maria Pereira, 1934 (Lisboa: Ática, 10ª ed. 1972).  – 28. Disponível em: http://arquivopessoa.net/textos/1286

 

 


  

Linhas de leitura do poema D. Tareja, de Fernando Pessoa:

 

  • D. Tareja - versão arcaica do nome de D. Teresa, mãe de Afonso Henriques. 


  • "cada nação é todo o mundo a sós"- cada nação constitui um todo que, enquanto tal, é diferente de todas as outras;

 

  • D. Tareja representa, simbolicamente, o começo e a origem de Portugal: "mãe de reis e avó de impérios vela por nós" - chama a D. Teresa mãe de Portugal e a partir daqui passa a considerar simbolicamente o País como transfiguração do seu primeiro rei.

 

  • "...com bruta e natural certeza"- "bruta" significa aqui "de acordo com a natureza” e, portanto, "bruta e natural" constitui um pleonasmo.

 

  • "o que, imprevisto, Deus fadou."- O país improvável que é Portugal, tal como Afonso Henriques, que enfrentou o poderoso reino de Leão e os potentados islâmicos e cujas probabilidades de sucesso pareciam, à partida, muito remotas.

 

  • "dê tua prece outro destino a quem fadou o instinto teu! O homem que foi o teu menino envelheceu."- que a tua prece mude o rumo de Portugal que hoje (na década de 1930) é um país sem vitalidade.

 

  • "Mas todo vivo é eterno infante/ Onde estás e não há o dia. No antigo seio vigilante de novo o cria!"- D. Teresa está morta (no reino dos mortos = "onde estás e não há o dia") e Portugal ainda está vivo e enquanto existir tem em si o potencial de se renovar ("é eterno infante" = é sempre jovem). No último verso pede que o País seja recriado = reinventado = ganhe novo vigor.

 

João Mimoso, Mensagem, de Fernando Pessoa. Lisboa, 31-08-2003 (última revisão: 01-08-2014). Disponível em: https://www.inverso.pt/Mensagem/Brazao/Dhenrique.htm#tareja

 

***

 

Sugestão: visiona o Módulo de Português do 12.º Ano respeitante à análise e interpretação do poema “D. Tareja”, de Fernando Pessoa:





In: Projeto #ESTUDOEMCASA. Mensagem, de Fernando Pessoa: os poemas "D. Tareja" e "D. Dinis".| Aula 20| 29 min| 27 Jan. 2021. Inicia no minuto 10’15’’. Disponível em: https://www.rtp.pt/play/estudoemcasa/p7907/e520354/portugues-12-ano

 


Mensagem, de Fernando Pessoa

Primeira Parte – Brasão

II - Os Castelos

 


Sétimo (II)

D. FILIPA DE LENCASTRE

 

Que enigma havia em teu seio
Que só génios concebia?
Que arcanjo teus sonhos veio
Velar, maternos, um dia?
Volve a nós teu rosto sério,
Princesa do Santo Gral,
Humano ventre do Império,
Madrinha de Portugal!

26-9-1928
Fernando Pessoa, Mensagem. Lisboa: Parceria António Maria Pereira, 1934
(Lisboa: Ática, 10.ª ed. 1972).  - 33. Disponível em: http://arquivopessoa.net/textos/168

 

D. Tareja e D. Filipa de Lencastre, heroínas da Mensagem, de Fernando Pessoa

Longe da heroína guerreira ou da heroína agente de mudança está, pois, a mulher n'Os Lusíadas ou na Mensagem. Se, em Camões, o seu papel, à parte o seu contributo na caracterização do Amor, se confina à boa ou má influência que ela exerce sobre os homens (casos da fermosíssima Maria e de Leonor Teles), em Fernando Pessoa, ela surge investida da função de procriar, paradigmaticamente ilustrada nas figuras de D. Filipa de Lencastre e de D. Tareja.

Aquela é o «Humano ventre do Império» (M, 23), predestinado a conceber os «génios» que dariam forma ao ideal de ser português; esta, «mãe de reis e avó de impérios» (M, 28).

Uma e outra ligadas a essa verdade perdida do que somos: D. Filipa, cujo gesto criador é legitimado pela visita do «arcanjo», é a «Princesa do Santo Graal»; D. Tareja o instinto patriótico perdido. Uma exemplaridade que, em D. Tareja, se reveste de características particulares: a heroína é-nos apresentada quer como símbolo de protetora fecundidade («Teu seio augusto amamentou / Com bruta e natural certeza / O que, imprevisto, Deus fadou» - M, ibid.), bafejada pelo sagrado que o adjetivo «augusto» denuncia, quer como fonte de regeneração («No antigo seio vigilante / De novo cria»), sob os auspícios de um destino que a transcende. Note-se, ainda, que a «(bruta e natural certeza»), com que o destino se cumpre através dela, lhe realça o instinto e a função maternal da amamentação, fazendo lembrar a loba de Rómulo e Remo, cuja ligação ao Império romano tem o mesmo valor mítico que a de D. Tareja ao Império português.

O que D. Filipa e D. Tareja representam, em suma, é a mesma energia criativa, o mesmo poder de regeneração que outros autores encontram no mito da Terra-mãe, ausente da Mensagem, se excetuarmos a alusão que lhe é feita em «Fernão de Magalhães).

Artur Veríssimo, Dicionário da Mensagem. Porto, Areal Editores, 2000

 ***

 

Questionário sobre o poema “D. Filipa de Lencastre”, de Fernando Pessoa:

Das hipóteses apresentadas (A, B, C e D), assinala a correta.

1 - O texto poético B pertence à coletânea Mensagem. Qual é o objetivo que presidiu à elaboração dessa coletânea?

A) Narrar um conjunto de mitos e lendas da História de Portugal.

B) Narrar factos da História de Portugal.

C) Transmitir mensagens de esperança às gerações vindouras.

D) Apresentar uma visão mítico-poética da História de Portugal.

 

2 - Quais são as partes nucleares em que se divide a coletânea Mensagem?

A) Brasão/Mar Português/O Encoberto.

B) Brasão/O Timbre/Os Tempos.

C) Os Castelos/Mar Português/O Encoberto.

D) Os Castelos/O Infante/O Encoberto.

 

3 - A que parte da coletânea Mensagem pertence o poema B?

A) Brasão/A Coroa.

B) Brasão/Os Castelos.

C) Brasão/As Quinas.

D) Brasão/O Timbre.

 

4 - Quem foi D.ª Filipa de Lencastre?

A) Uma vítima da História Trágico-Marítima.

B) Esposa de D. Duarte.

C) Esposa de D. João I.

D) Esposa de D. João II.

 

5 - Como são conhecidos os "génios" concebidos por D.ª Filipa de Lencastre?

A) Ínclita Geração.

B) Geração de 70.

C) Geração de Sucesso.

D) Geração de Ilustres.

 

6 - Por que dedica o poeta um poema a D.ª Filipa de Lencastre?

A) Porque D.ª Filipa de Lencastre era a musa inspiradora do poeta.

B) Porque o poeta considera D.ª Filipa de Lencastre a dama mais ilustre da História de Portugal.

C) Porque D.ª Filipa de Lencastre é interpretada como a matriz de Portugal.

D) Porque D.ª Filipa de Lencastre merece o reconhecimento de Portugal por ter dado à Pátria filhos ilustres.

 

7 - Qual é a mensagem final da obra Mensagem?

A) Mensagem de esperança e de encorajamento.

B) Mensagem de desencanto e de encorajamento.

C) Mensagem de esperança e de confiança no futuro.

D) Mensagem de desencanto e de amargura.

 

Chave de correção: 1-D, 2-A, 3-B, 4-C, 5-A, 6-D, 7-B.

Disponível em http://www.profareal.pt/testes/doc.asp?tema_id=777 (Consultado em 11-06-2007)

   

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Fernando Pessoa - Apresentação crítica, seleção, notas e sugestões para análise literária da obra de Fernando Pessoa, por José Carreiro. 




“D. Tareja e D. Filipa de Lencastre, heroínas da Mensagem, de Fernando Pessoa” in Folha de Poesia, José Carreiro. Portugal, 14-12-2019. Disponível em: https://folhadepoesia.blogspot.com/2022/12/d-tareja-e-d-filipa-de-lencastre.html


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