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quinta-feira, 27 de novembro de 2014

É um outono que não é outono. (Natália Correia)


Parque Terra Nostra, Furnas, ilha de São Miguel


É um outono que não é outono.
Tampouco a estação por que se espera
na dor de nos deixarem ao abandono
as ninfas que são flores na primavera.

No entanto nas coisas o segredo
de uma só alma põe a sabedoria
dando à terra repouso no arvoredo
de que o cedro é a sagrada biografia.

 

Natália Correia, “A recusa das imagens evidentes – III”
 in Dimensão encontrada (1957)

 

 

No verso inicial, "É um outono que não é outono", o sujeito poético manifesta uma contradição intrigante. O outono, geralmente associado à queda das folhas e ao declínio da natureza, parece não se enquadrar no padrão esperado.

O sujeito poético continua a explorar essa ideia de contradição e ambiguidade ao afirmar que "Tampouco a estação por que se espera", sugerindo que as expectativas não estão a ser cumpridas. Isso pode ser lido como uma metáfora para a vida, onde nem sempre as coisas acontecem conforme planeado ou esperado.

A seguir, o sujeito poético alude à dor de sermos "deixados ao abandono", uma sensação de desamparo e solidão que muitas vezes acompanha as transições na vida. As "ninfas que são flores na primavera" representam a juventude e a beleza que eventualmente desaparecem, deixando-nos em um estado de desolação.

Na segunda quadra, a voz poética revela que há um segredo nas coisas, que só pode ser descoberto por uma alma única e sábia. Esse segredo é o de dar à terra repouso no arvoredo, ou seja, de aceitar a natureza como ela é, sem lhe impor uma imagem idealizada. O arvoredo representa a diversidade e a riqueza da vida, que se manifesta em diferentes formas e cores. O cedro é a sagrada biografia do arvoredo, pois é uma árvore nobre, forte e duradoura, que simboliza a resistência e a permanência.

Apesar das aparentes contradições e desilusões da vida, há uma sabedoria subjacente que reside na unidade e na harmonia da natureza e do mundo.

O "cedro" mencionado no poema pode ser visto como um símbolo dessa sabedoria, representando a resistência e a longevidade da natureza.








CARREIRO, José. “É um outono que não é outono. (Natália Correia)”. Portugal, Folha de Poesia: artes, ideias e o sentimento de si, 27-11-2014. Disponível em: https://folhadepoesia.blogspot.com/2014/11/cibertertulia-sobre-um-verso-de-natalia.html


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