Parque Terra Nostra, Furnas, ilha de São Miguel |
É
um outono que não é outono.
Tampouco a estação por que se espera
na dor de nos deixarem ao abandono
as ninfas que são flores na primavera.
No entanto nas coisas o segredo
de uma só alma põe a sabedoria
dando à terra repouso no arvoredo
de que o cedro é a sagrada biografia.
Natália Correia, “A recusa das imagens evidentes – III”
in Dimensão
encontrada (1957)
No verso inicial, "É um
outono que não é outono", o sujeito poético manifesta uma contradição
intrigante. O outono, geralmente associado à queda das folhas e ao declínio da
natureza, parece não se enquadrar no padrão esperado.
O sujeito poético continua a explorar
essa ideia de contradição e ambiguidade ao afirmar que "Tampouco a estação
por que se espera", sugerindo que as expectativas não estão a ser
cumpridas. Isso pode ser lido como uma metáfora para a vida, onde nem sempre as
coisas acontecem conforme planeado ou esperado.
A seguir, o sujeito poético
alude à dor de sermos "deixados ao abandono", uma sensação de
desamparo e solidão que muitas vezes acompanha as transições na vida. As
"ninfas que são flores na primavera" representam a juventude e a
beleza que eventualmente desaparecem, deixando-nos em um estado de desolação.
Na segunda quadra, a voz poética
revela que há um segredo nas coisas, que só pode ser descoberto por uma alma
única e sábia. Esse segredo é o de dar à terra repouso no arvoredo, ou seja, de
aceitar a natureza como ela é, sem lhe impor uma imagem idealizada. O arvoredo
representa a diversidade e a riqueza da vida, que se manifesta em diferentes
formas e cores. O cedro é a sagrada biografia do arvoredo, pois é uma árvore
nobre, forte e duradoura, que simboliza a resistência e a permanência.
Apesar das aparentes contradições
e desilusões da vida, há uma sabedoria subjacente que reside na unidade e na
harmonia da natureza e do mundo.
O "cedro" mencionado no
poema pode ser visto como um símbolo dessa sabedoria, representando a
resistência e a longevidade da natureza.
CARREIRO, José. “É um outono que não é outono. (Natália
Correia)”. Portugal, Folha de Poesia: artes, ideias e o sentimento
de si, 27-11-2014.
Disponível em: https://folhadepoesia.blogspot.com/2014/11/cibertertulia-sobre-um-verso-de-natalia.html
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