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sexta-feira, 20 de dezembro de 2024

A Cidade da Confusão

Para além do «ser ou não ser» dos problemas ocos,
o que importa é isto:
- Penso nos outros.
Logo existo.

José Gomes Ferreira, Poeta Militante I


Rua do Benformoso, junto à praça do Martim Moniz, 19-12-2024
https://www.rtp.pt/noticias/pais/autarca-de-junta-indignado-com-operacao-policial-no-martim-moniz-pede-saida-da-ministra_n1622798

 

E assim João Sem Medo partiu para a singular Cidade da Confusão.

Os habitantes dessa cidade, como já sabem, andavam de pernas no ar, usavam gravatas na cintura, cintos no pescoço, galochas nas mãos e luvas nos pés. Os prédios em que moravam não dispunham de portas nem de janelas. Entrava-se e saía-se dos andares, através dos telhados, por intermédio de elevadores montados nas paredes exteriores das fachadas. Outra particularidade a distinguia das demais cidades: apresentava diariamente um aspeto panorâmico novo, porque não possuía ruas fixas. Na verdade a Lei obrigava os donos dos prédios a mudarem-nos todos os dias de orientação e de rua, segundo um plano de barafunda paranoica estabelecido por poetas surreal reformados. Para esse fim, e obedecendo a métodos de construção especiais, edificavam-nos sobre largas plataformas metálicas com rodas, para se deslocarem com mais facilidade. Mercê deste processo ideal, a confusão da Cidade atingia requintes impossíveis de ultrapassar porque os habitantes ignoravam onde moravam.

Em resumo: ninguém sabia a quantas andava. Os relógios não marcavam as horas, os minutos e os segundos, mas os séculos. Os governantes, os professores e o escol intelectual, cuidadosamente escolhidos entre as pessoas mais insignificantes da Cidade, pugnavam com denodo pela mumificação do Disparate de pernas para o ar. E ai daquele que não pronunciasse pelo menos dez asneiras por minuto. Ou não sujasse as grandes descobertas e empresas humanas (como a energia atómica ou os satélites, por exemplo) com teorias imbecis de amesquinhamento reles. Considerados moralmente mortos, os colegas tratavam logo de excluí-los, sem relutância nem remorsos, das respetivas Academias e Universidades.

Esta estupidez, preceituada como uma das mais galhardas manifestações da alma da Raça, cultivava-se desde a infância com esmeros maternais. As Escolas, onde os mestres se selecionavam não pela ciência demonstrada mas pela maneira de trajar e de fazer o nó na gravata, incumbiam-se de torcer os meninos até à incapacidade perfeita. Ensinavam-lhes de propósito coisas sem significação, palavras vazias, matérias inoperantes, ideias cadavéricas, sempre com mais de duzentos anos, pelo menos, e que, conservadas em álcool, graças ao seu desuso em cabeças vivas serviam para simulações de sistemas geniais recentes.

Também se chamavam ursos aos raros estudiosos. E, por severa determinação legal, só os incompetentes comprovados, com mais de 80% de erros ortográficos nas provas escritas e total inépcia para acertar nas contas de dividir, podiam ocupar os cargos cimeiros da Cidade da Confusão.

Por isso, ouviam-se com frequência frases elogiosas deste género: «Fulano é um idiota chapado! Está apto a solucionar todos os problemas, sobretudo os insolúveis! O Poeta Tal é um imbecil de génio!», etc., etc.

No meio desta trapalhada, em que tudo parecia desengonçar-se e fazer o pino, o pobre João Sem Medo esforçava-se por se manter imune ao contágio, repugnando-lhe aderir à lógica absurda de certos hábitos e cerimónias.

Assim, por exemplo: porque é que os confusionistas se sentavam sempre de costas voltadas para o palco a aplaudirem-se a si mesmos com delírio? (…) Porque mandavam para os museus os quadros maus? Porque frequentavam as praias de casaca e colarinhos de goma (consoante prescrevia a Lei), enquanto as mulheres passeavam pelas ruas com vestidos de noite e iam a bailes de fato de banho? (…)

As respostas a estas perguntas afiguravam-se tão precárias a João sem Medo que, certa manhã, receoso de ficar com a cabeça do avesso, decidiu meter-se no primeiro comboio (mesmo com asas) e safar-se da Cidade da Confusão.

Mas neste entrementes, ao virar a última esquina antes da estação, esbarrou com um indivíduo inquietante. Nada menos, nada mais do que um homem com os pés no chão, as mãos no ar, chapéu na cabeça, gravata em redor do pescoço, cinto na cintura e sapatos nos pés.

Caíram nos braços um do outro como velhos amigos.

— Até que enfim que encontro uma pessoa de juízo, um tipo normal — gritou João Sem Medo eufórico.— Já tinha saudades, palavra.

— E eu, então?... Ah!, quem me dera ter nascido na tua terra — queixou- -se o pobre homem.

— Porquê?

— Porque nesta cidade ninguém me entende… Porque choro quando sofro e rio quando me alegro. Porque digo «boas-tardes» de tarde e «bons-dias» de manhã. Porque não tomo banho vestido. Porque acendo a luz elétrica de noite, etc. — Isso prova apenas que tens a cabeça no lugar próprio — consolou-o João Sem Medo. — Pois é… Mas julgas que alguém acredita em mim? Qual! Todos os dias publico artigos de propaganda no meu jornal clandestino: Mãos no Ar. Pois parece que ninguém os lê. Até hoje, na Cidade da Confusão só consegui arranjar cinquenta adeptos da minha doutrina. (…) As autoridades acusam-me de traidor, calcula. Dizem que quero destruir as tradições da Raça. Fundaram até um jornal de propósito para me refutarem: O Coice. Segundo eles, a posição de mãos no chão e pés no ar é puramente espiritual… Um coice nas estrelas… Um coice para as Alturas…

Não pôde prosseguir. Num burburinho súbito, meia dúzia de homens saltaram dum automóvel aéreo e, com a rapidez petulante dos profissionais de dominar homens, enfiaram-lhe uma camisa de forças, impuseram-lhe uma mordaça e, a pontamãos (comparáveis em violência aos nossos pontapés), arrastaram o desgraçado para o carro.

— Pelo que vejo o senhor é estrangeiro! — observava entretanto um dos assaltantes, dirigindo-se a João Sem Medo.

— E com muito prazer.

— Desculpe o acidente — resmoneou o outro. — Mas o senhor estava a falar com um doido perigoso, fugido do manicómio.

— Um doido?... Devem estar enganados… Pareceu-me inteiramente normal!... Contou-me que era diretor dum periódico…

— Mentira! — interveio outro dos assaltantes (enfermeiro? polícia?) com os olhos cheios de lágrimas de riso. — É um pobre doido com a mania de nos querer obrigar a trazer os pés no chão. Como se isso fosse possível!

— É verdade!... Como se isso fosse possível! – repetiram todos em coro, a chorar às gargalhadas.

Então, João Sem Medo tapou os ouvidos e desarvorou para a estação de caminho de ferro mais próxima.

 

José Gomes Ferreira, “Capítulo VII - A Cidade da Confusão” in Aventuras de João Sem Medo. Lisboa: Dom Quixote, 2012, pp. 70-74

 


Aventuras de João Sem Medo é um livro constituído por 15 capítulos, nos quais se descrevem as aventuras que João viveu, após saltar o Muro que separava Chora-Que-Logo-Bebes, onde vivia, e a Floresta Branca.

Escreve um texto expositivo em que apresentes as linhas fundamentais da leitura do capítulo VII, “A Cidade da Confusão”, do livro Aventuras de João Sem Medo. O teu texto deve incluir uma parte introdutória, uma parte de desenvolvimento e uma parte de conclusão, respeitando os seguintes pontos.

• Explicitação do significado da expressão “singular Cidade da Confusão”.

• Referência ao que está incluído na expressão “Esta estupidez”.

• Indicação do que é normalidade e loucura para João Sem Medo, para os assaltantes e para o homem que é levado numa camisa-de-força.

• Explicitação das razões que levaram à escolha do título Mãos no Ar para o periódico.

• Explicitação da intenção da existência do jornal O Coice.

• Razões para a fuga de João Sem Medo para a estação.

(Fonte: Letras & Companhia. Português 9.º Ano. Carla Marques e Inês Silva. Edições Asa, 2013, pág. 227)



sábado, 14 de dezembro de 2024

Salgueiro Maia

 


SALGUEIRO MAIA

Aquele que na hora da vitória
Respeitou o vencido

Aquele que deu tudo e não pediu a paga

Aquele que na hora da ganância
Perdeu o apetite

Aquele que amou os outros e por isso
Não colaborou com sua ignorância ou vício

Aquele que foi «Fiel à palavra dada à ideia tida»
Como antes dele mas também por ele
Pessoa disse

 

Sophia de Mello Breyner Andresen, Musa, 1.ª ed., 1994, Lisboa, Editorial Caminho • 2.ª ed., 1995, Lisboa, Editorial Caminho • 3.ª ed., 1997, Lisboa, Editorial Caminho • 4 ed., 2001, Lisboa, Editorial Caminho • 5.ª ed., revista, 2004, Lisboa, Editorial Caminho.

 



SALGUEIRO MAIA

Ficaste na pureza inicial
do gesto que liberta e se desprende.
Havia em ti o símbolo e o sinal
havia em ti o herói que não se rende.

Outros jogaram o jogo viciado
para ti nem poder nem sua regra.
Conquistador do sonho inconquistado
havia em ti o herói que não se integra.

Por isso ficarás como quem vem
dar outro rosto ao rosto da cidade.
Diz-se o teu nome e sais de Santarém
trazendo a espada e a flor da liberdade.

“Salgueiro Maia”, Manuel Alegre, 04-04-2012. Disponível em: https://manuelalegre.com/301000/1/002731,000014/index.htm



Os poemas de Sophia de Mello Breyner Andresen e Manuel Alegre, dedicados a Salgueiro Maia, oferecem duas perspetivas distintas, mas complementares, sobre a figura do Capitão de Abril. Ambos os autores destacam a integridade, a abnegação e o papel crucial de Salgueiro Maia na Revolução dos Cravos, mas com nuances que enriquecem a nossa compreensão do herói.

"Salgueiro Maia" de Sophia de Mello Breyner Andresen:

Este poema foca-se na dimensão ética e moral de Salgueiro Maia. Através de uma estrutura anafórica ("Aquele que..."), Sophia constrói um retrato idealizado do homem justo e virtuoso. Destacam-se os seguintes aspetos:

  • Respeito pelo vencido: Sublinha a nobreza de caráter de Salgueiro Maia, que mesmo na vitória não humilhou ou explorou o adversário. Este traço humanista é fundamental para compreendermos o espírito do 25 de Abril, que se pretendia pacífico e reconciliador.
  • Abnegação e desinteresse: O verso "Aquele que deu tudo e não pediu a paga" enfatiza o altruísmo de Salgueiro Maia, que agiu movido por ideais e não por ambição pessoal. Esta característica contrasta com a postura de outros atores políticos que, após a Revolução, procuraram proveitos e vantagens.
  • Resistência à ganância e à corrupção: Sophia destaca a integridade de Salgueiro Maia, que se manteve imune às tentações do poder e da riqueza. Esta postura é particularmente relevante no contexto pós-revolucionário, marcado por tensões e disputas políticas.
  • Fidelidade aos princípios: A citação de Fernando Pessoa ("Fiel à palavra dada à ideia tida") reforça a ideia de coerência e retidão moral que pautou a vida de Salgueiro Maia. Esta referência intertextual estabelece uma ligação entre o herói de Abril e a tradição da poesia portuguesa, elevando a sua figura a um patamar simbólico.

O poema de Sophia é, assim, um elogio à virtude e à integridade, personificadas em Salgueiro Maia. A linguagem é concisa e direta, com um ritmo marcado pela repetição anafórica, que confere solenidade e força expressiva ao poema.

"Salgueiro Maia" de Manuel Alegre:

Este poema assume um tom mais épico e celebratório, enfatizando o papel de Salgueiro Maia como líder e símbolo da liberdade. Destacam-se os seguintes aspetos:

  • Pureza do gesto libertador: Alegre evoca a imagem de um gesto inaugural e puro, que marca o início de uma nova era para Portugal. A palavra "desprende" sugere um ato de libertação não apenas do regime ditatorial, mas também das amarras do passado.
  • Figura heroica e idealizada: Salgueiro Maia é apresentado como um herói que "não se rende" e que "não se integra" nos jogos políticos do poder. Esta imagem idealizada reforça o seu estatuto de símbolo da resistência e da integridade.
  • Conquista do sonho da liberdade: O verso "Conquistador do sonho inconquistado" sublinha a dimensão utópica da Revolução dos Cravos, que procurava construir uma sociedade mais justa e livre. Salgueiro Maia surge como o líder que concretiza esse sonho.
  • Ligação à cidade e à memória coletiva: A referência a Santarém, de onde partiu a coluna militar liderada por Salgueiro Maia, e a imagem da "espada e a flor da liberdade" criam uma forte ligação entre o herói, o território e os valores da Revolução. O poema termina com uma nota de esperança e renovação, sugerindo que o nome de Salgueiro Maia continuará a inspirar as gerações futuras.

O poema de Alegre é, assim, uma ode à liberdade e ao heroísmo, com uma linguagem mais rica em imagens e metáforas. O ritmo é mais fluido e narrativo, evocando a marcha vitoriosa de Salgueiro Maia rumo a Lisboa.

Em suma, ambos os poemas celebram a figura ímpar de Salgueiro Maia, destacando a sua integridade, coragem e papel fundamental na história de Portugal. Enquanto Sophia enfatiza a dimensão ética e moral do homem, Alegre foca-se no seu papel como líder e símbolo da liberdade. A leitura conjunta dos dois poemas oferece-nos um retrato multifacetado e enriquecedor de um dos maiores heróis da democracia portuguesa.

 

Gemini 2.0 Flash Experimental (Modelo de Linguagem). (2024). Resposta à pergunta sobre recensão literária dos poemas sobre Salgueiro Maia. Data da consulta: 14-12-2024. Disponível em: https://gemini.google.com/app/33d40e789b812a69?utm_source=app_launcher&utm_medium=owned&utm_campaign=base_all

quinta-feira, 18 de julho de 2024

O papagaio, Sebastião da Gama


 

O PAPAGAIO

Deixem-no lá, deixem-no lá, o papagaio!
Deixem-no lá, bem preso à terra,
vibrando!

Aos arranques,
a fazer tremer a terra,
a querer voar
pelo ar
até pertinho do Céu...

Deixem-no lá, deixem-no lá, o papagaio!
Deixem-no lá viver a sua inquietação
e ser verdade aquela ânsia
de fugir.
Não lhe cortem o cordel!
Poupem o papagaio à dor enorme
de cair,
papel inútil roto, pelo chão.

Não lhe ensinem,
ao pobre papagaio de papel,
que a sua inquietação
é a única força que ele tem.

Deixem-no lá,
naquela ânsia de fuga,
no sonho (a que uma navalha
pode dar o triste fim)
de fazer ninho no Céu:
Sempre anda longe da terra, assim,
o comprimento do cordel...

Deixem-no lá, deixem-no lá,
o papagaio de papel!...

 

Sebastião da Gama, Itinerário Paralelo. Lisboa, Edições Ática, 1967

 

I - Esquema interpretativo do poema “O papagaio”, de Sebastião da Gama






Fonte: Projeto #EstudoEmCasa – Aula n.º 48 de Português dos 7.º e 8.º anos sobre os poemas "O papagaio", de Sebastião da Gama, e "As minhas asas", de Almeida Garrett, 2021-05-07.

 Assistir à aula da Professora Tereza Cadete Sampainho, em https://www.rtp.pt/play/estudoemcasa/p7828/e542348/portugues-7-e-8-anos

 

***

II - Questionário sobre o poema “O papagaio”, de Sebastião da Gama

1. Indica a quem se dirige o sujeito poético.

2. Explicita o(s) apelo(s) que faz.

2.1. Regista os versos em que surge(m) esse(s) apelo(s).

2.2. Identifica o tipo de frase presente nesses versos.

2.3. Identifica o tempo e o modo utilizados.

3. Descreve o comportamento do papagaio que o sujeito poético quer proteger.

3.1. Explica o que esse comportamento simboliza.

 

Fonte: Projeto #EstudoEmCasa – Aula n.º 48 de Português dos 7.º e 8.º anos sobre os poemas "O papagaio", de Sebastião da Gama, e "As minhas asas", de Almeida Garrett, 2021-05-07. Disponível em: https://estudoemcasa.dge.mec.pt/2020-2021/7o-e-8o/portugues/48

 

Sugestão de respostas:

1. O sujeito poético dirige-se ao leitor ou a quem possa interferir com o papagaio, pedindo-lhes que não o perturbem.

2. O apelo principal que o sujeito poético faz é para que deixem o papagaio em paz, sem cortar o cordel que o liga à terra, permitindo-lhe viver a sua inquietação e sonho de voar alto.

2.1. Os apelos surgem nos seguintes versos:

«Deixem-no lá, deixem-no lá, o papagaio!» (v. 1)

«Deixem-no lá viver a sua inquietação» (v. 10)

«Não lhe cortem o cordel!» (v. 13)

«Deixem-no lá, deixem-no lá, / o papagaio de papel!...» (vv. 28-29)

2.2. O tipo de frase presente nesses versos é imperativa.

2.3. O tempo e modo utilizados são o presente do modo conjuntivo (com valor imperativo).

3. O comportamento do papagaio que o sujeito poético quer proteger é o de vibrar, tentar voar, tremer a terra, viver na ânsia de fuga, e manter o sonho de alcançar o céu, mesmo estando preso à terra pelo cordel.

3.1. Esse comportamento simboliza a aspiração humana, a busca de liberdade, o desejo de alcançar objetivos elevados e de sonhar, mesmo diante das limitações e restrições impostas pela realidade. Enquanto o cordel representa as restrições e as amarras que todos enfrentamos na vida, o papagaio de papel representa a força do sonho e da inquietação como motivadores para tentar superar as limitações. Assim, o poema convida-nos a valorizar a inquietação e a busca por algo mais, mesmo que isso signifique permanecer distante do chão seguro e conhecido.



quinta-feira, 25 de abril de 2024

25 de Abril: 50 anos | Camões: 500 anos


 

Há 100 anos, celebrou-se em Portugal o 4.º centenário de Luís de Camões. Foi estreada na Faculdade de Letras de Lisboa uma nova cadeira, chamada Estudos Camonianos. Na aula inaugural, o Prof. José Maria Rodrigues sintetizou desta maneira a razão de lermos o maior poeta de Portugal:

«Estudemos "Os Lusíadas", para neles haurirmos o mesmo estímulo que impulsionou o Poeta a escrevê-los; debruçados sobre as suas estâncias, compenetremo-nos bem do nosso glorioso passado e sentiremos pulsar em nós uma alma nova, um desejo ardente de vermos respeitado e engrandecido o nome português, de vermos novamente esboçar-se um Portugal maior.»

Lidas no ano em que celebramos o 5.º centenário de Camões, as palavras deste professor e padre católico deixam-nos uma sensação estranha. O que é isso, «um Portugal maior?» A terminologia faz-nos pensar hoje no horrível Donald Trump e no seu slogan «Make America Great Again».

Poucos anos depois da lição inaugural de José Maria Rodrigues, Portugal passaria a ser dominado (e sê-lo-ia durante 48 anos) pela ditadura salazarista. Na vizinha Espanha, surgiu Franco; em Itália, já surgira Mussolini. A União Soviética e a China estavam mergulhadas nas trevas de regimes totalitários. Quanto ao nazismo, nascia por volta desta altura: a lição de José Maria Rodrigues foi proferida na Faculdade de Letras de Lisboa em 1924, mas foi publicada (em Coimbra, curiosamente) em 1925, o ano da publicação de «Mein Kampf» de Adolf Hitler.

Deu-se a 2.ª Guerra Mundial, seguida pela Guerra Fria. E, em Fevereiro de 1961, começou a Guerra Colonial Portuguesa, que durou até ao 25 de Abril de 1974. O povo português que, em séculos anteriores, investira na escravização de africanos no comércio negreiro tinha passado agora a assumir a missão de matar africanos. Em nome de «um Portugal maior».

A liberdade que o 25 de Abril nos trouxe há 50 anos permite-nos afirmar sem medo que o maior argumento contra esse «Portugal maior» são os crimes contra a humanidade que foram necessários para o conseguir: o comércio negreiro, a exploração desumana do Brasil e de outras colónias, o terror religioso da Inquisição. E, como se esse passado deprimente não bastasse, a ditadura fascista de Salazar ainda obrigou a geração do meu pai a envolver-se, contra os ditames da sua consciência de católico progressista, numa guerra colonial. O serviço militar que o meu pai cumpriu na guerra em Angola foi um trauma que o marcou para toda a vida. Participar, obrigado, na matança de angolanos deixou sequelas de que ele nunca se curou. Vale a pena, esse «Portugal maior»?

Dir-se-á que essa é, justamente, a ideia de Portugal que Camões defende n'«Os Lusíadas». Mas há muito que foram identificados (por António José Saraiva, Helder Macedo e outros) os elementos deste poema complexo e subtil, os quais nos levam a perceber que Camões nos apresenta, n' «Os Lusíadas», duas faces da mesma moeda: uma face é a «glória» do império português; a outra face é o custo humano que ele implica.

Não podemos esperar de Camões, como é óbvio, que ele escrevesse no século XVI como um professor de Estudos Pós-Coloniais numa universidade contemporânea. Camões foi um homem do seu tempo, que trabalhou com os conceitos vigentes na época em que viveu. Mas se lermos «Os Lusíadas» tomando como guia os estudos de António José Saraiva e de Helder Macedo (há também o livro um pouco simplista, embora bem intencionado, de José Madeira, «Camões contra a Expansão e o Império», 2000), veremos que, afinal, a epopeia camoniana não é aquilo que o Portugal de Salazar quis ver nela.

Camões compôs uma epopeia polifónica, em que várias vozes têm lugar de fala. Temos de ouvir todas as vozes, porque é a sua soma que nos traz a voz do próprio Luís de Camões. Quando o Velho do Restelo chama os bois pelos nomes e recusa a resignificação como «esforço e valentia» da «bruta crueza e feridade» das conquistas portuguesas (Lusíadas 4.99), temos de perceber - como António José Saraiva percebeu tão bem - que o Velho do Restelo também é Camões.

Camões coloca o contraditório da mensagem imperialista na boca de várias personagens, mas acima de tudo temos de ler com atenção os muitos desabafos n'«Os Lusíadas» escritos na voz do próprio cantor épico: é nesses desabafos que intuímos quanto Camões estava lúcido no tocante à realidade do imperialismo português.

Cada vez mais me convenço disto: se lermos «Os Lusíadas» com olhos para as atitudes diferenciadas que Camões adopta na abordagem ao fenómeno «Portugal», veremos que a sua intenção não foi de propor um «Portugal maior» (como disse José Maria Rodrigues), mas sim um Portugal MELHOR.

Viva o 25 de Abril! Y

 

25 de Abril: 50 anos | Camões: 500 anos”, Frederico Lourenço, Coimbra, 24-04-2024

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quinta-feira, 27 de abril de 2023

A vida em Portugal sob a ditadura de Salazar: pobreza, censura, emigração e guerra colonial


http://www.eduardogageiro.com/

Foi por causa desta foto que fui preso pela PIDE: “Temos paisagens tão bonitas em Portugal, porque é que não as fotografa, em vez de andar a retratar pessoas humildes?” Diziam que as minhas fotografias davam má imagem do País. Esta correu mundo. Ganhou 22 medalhas de ouro.

Eduardo Gageiro

***


Tempo de solidão e de incerteza
Tempo de medo e tempo de traição
Tempo de injustiça e de vileza
Tempo de negação

Tempo de covardia e tempo de ira
Tempo de mascarada e de mentira
Tempo que mata quem o denuncia
Tempo de escravidão

Tempo dos coniventes sem cadastro
Tempo de silêncio e de mordaça
Tempo onde o sangue não tem rastro
Tempo de ameaça

 

Sophia de Mello Breyner Andresen, “Data” in Livro Sexto, 1.ª ed., 1962, Lisboa, Livraria Morais Editora


***


A vida dos portugueses em Portugal no tempo de Salazar (1932-1968) foi marcada pela ditadura, pela pobreza, pela censura e pela guerra colonial.

Salazar era o líder do Estado Novo, um regime autoritário que reprimia qualquer oposição política, controlava a imprensa, a educação e a cultura, e defendia um ideal de Portugal tradicional e imperial.

Muitos portugueses emigraram para outros países em busca de melhores condições de vida, mas Salazar dificultava a saída de quem não tivesse uma carta de chamada, que era uma garantia de trabalho no exterior.

Os que ficaram tinham que enfrentar a miséria, a falta de liberdade e o risco de serem convocados para combater nas colónias africanas, onde os povos nativos lutavam pela independência.

A ditadura de Salazar só terminou com a Revolução dos Cravos em 1974, que derrubou o regime e abriu caminho para a democracia em Portugal.

 


No tempo do Salazar é que era!

Por causa da “crise“, um quinto dos portugueses, mais coisa menos coisa dois milhões de pessoas, pensa que o melhor é desenterrar o Salazar lá de Comba Dão mais os “Pides“ todos e pôr tudo em ordem!

Mais uma vez os portugueses estão de parabéns. Isto se tivermos em conta um  estudo recente, o qual demonstra como a  crise leva um quinto dos portugueses a terem  saudade dos tempos antes do 25 de Abril até porque "no tempo do Salazar é que era! "  

Lá para os meus lados habituei-me a crescer com tais impropérios, tantas vezes cuspidos da boca de quem, no meio de um autocarro atulhado e de uma vida atulhada e de um futuro atulhado a caminho de lado nenhum, procurava assim encontrar justificação para a sua própria desgraça a qual, de maneira alguma, descendia diretamente da liberdade e da democracia. Antes pelo contrário, porque dependendo da ditadura, o mais provável era tais vernáculos nem sequer encontrarem o caminho do estômago para a boca sob pena de verem os dentes estilhaçados na força bruta de uma boa coronhada.  

Portanto, nem que seja para se poder dizer mal da democracia, já valeu a pena fazer a revolução! Infelizmente, e por causa da 'crise", um quinto dos portugueses, mais coisa menos coisa dois milhões de pessoas, parece pensar de forma contrária, pelo que o melhor é desenterrar o Salazar lá de Comba Dão mais os "Pides" todos e pôr tudo em ordem! Assim, quando as ossadas do "Tó"  estiverem de novo na cadeira (desta feita  pregada ao chão, não vá a maldita cair), mal  posso esperar pelas perseguições, prisões, torturas, assassinatos, condenações sem  direito a defesa ou julgamento, 13 anos de guerra colonial e 10000 mortos, um milhão de portugueses emigrados (para não dizer refugiados, como hoje são os  sírios, mas na altura sem mochilas, essa invenção moderna, apenas malas de cartão  e, como hoje, apenas os pés para andar), a livre discriminação das mulheres, forçadas  a ficar em casa, sem direito a voto ou  opinião, apenas direito à porrada (e não  metas a colher), subnutrição generalizada, o analfabetismo a assinar de cruz, o  trabalho de sol a sol pago ao dia sem direito  a descanso, férias, reforma ou contrato, o  domínio da Igreja sobre os corações e as  almas de todo um povo feito refém de medos e castigos divinos que não existem senão nas  mentes pérfidas de um clero que pouco ou  nada fez em nome de um Jesus, mas muito  em proveito próprio, enfim, entre tantas  outras aberrações inenarráveis, a lista é por  demais infindável quando se fala não apenas  de uma ditadura, mas da nossa ditadura em particular, aquela de quem um quinto dos  portugueses tem hoje tanta saudade...  

Não foi há muito tempo que um programa de televisão intitulado "Grandes Portugueses" elegeu, por voto dos telespectadores, António de Oliveira Salazar como o maior português de todos os tempos, isto em 2007, 33 anos após o fim da ditadura, e ainda nem sequer se ouvia a palavra "crise". Portanto, amigos e amigas, senhores e senhoras, isto da saudade salazarista não é de agora, já anda connosco de há algum tempo para cá. Preocupante é não recrudescer, antes pelo contrário, contando já com cerca de dois milhões de adeptos num país onde o embrutecimento ganha terreno a olhos vistos perante a passividade de um povo adormecido entre a televisão e as redes sociais, mais perto do Norte de África do que da América e onde o sonho é mesmo isso, um sonho, do qual é urgente acordar.

João André Costa, Público, 2016-05-02


 


Tão felizes que nós éramos

Anda por aí gente com saudades da velha portugalidade. Saudades do nacionalismo, da fronteira, da ditadura, da guerra, da PIDE, de Caxias e do Tarrafal, das cheias do Tejo e do Douro, da tuberculose infantil, das mulheres mortas no parto, dos soldados com madrinhas de guerra, da guerra com padrinhos políticos, dos caramelos espanhóis, do telefone e da televisão como privilégio, do serviço militar obrigatório, do queres fiado toma, dos denunciantes e informadores e, claro, dessa relíquia estimada que é um aparelho de segurança.

Eu não ponho flores neste cemitério.

Nesse Portugal toda a gente era pobre com exceção de uma ínfima parte da população, os ricos. No meio havia meia dúzia de burgueses esclarecidos, exilados ou educados no estrangeiro, alguns com apelidos que os protegiam, e havia uma classe indistinta constituída por remediados. Uma pequena burguesia sem poder aquisitivo nem filiação ideológica a rasar o que hoje chamamos linha de pobreza. Neste filme a preto e branco, pintado de cinzento para dar cor, podia observar-se o mundo português continental a partir de uma rua. O resto do mundo não existia, estávamos orgulhosamente sós. Numa rua de cidade havia uma mercearia e uma taberna. Às vezes, uma carvoaria ou uma capelista. A mercearia vendia açúcar e farinha fiados. E o bacalhau. Os clientes pagavam os géneros a prestações e quando recebiam o ordenado. Bifes, peixe fino e fruta eram um luxo.

A fruta vinha da província, onde camponeses de pouca terra praticavam uma agricultura de subsistência e matavam um porco uma vez por ano. Batatas, peras, maçãs, figos na estação, uvas na vindima, ameixas e de vez em quando uns preciosos pêssegos.

As frutas tropicais só existiam nas mercearias de luxo da Baixa. O ananás vinha dos Açores no Natal e era partido em fatias fininhas, para render e encharcado em açúcar e vinho do Porto para render mais. Como não havia educação alimentar e a maioria do povo era analfabeta ou semianalfabeta, comia-se açúcar por tudo e por nada e, nas aldeias, para sossegar as crianças que choravam, dava-se uma chucha embebida em açúcar e vinho. A criança crescia com uma bola de trapos por brinquedo, e com dentes cariados e meia anã por falta de proteínas e de vitaminas. Tinha grande probabilidade de morrer na infância, de uma doença sem vacina ou de um acidente por ignorância e falta de vigilância, como beber lixívia. As mães contavam os filhos vivos e os mortos era normal. Tive dez e morreram-me cinco. A altura média do homem lusitano andava pelo metro e sessenta nos dias bons. Havia raquitismo e poliomielite e o povo morria cedo e sem assistência médica. Na aldeia, um João Semana fazia o favor de ver os doentes pobres sem cobrar, por bom coração.

Amortalhado a negro, o povo era bruto e brutal.

Os homens embebedavam-se com facilidade e batiam nas mulheres, as mulheres não tinham direitos e vingavam-se com crimes que apareciam nos jornais com o título ‘Mulher Mata Marido com Veneno de Ratos’. A violação era comum, dentro e fora do casamento, o patrão tinha direito de pernada, e no campo, tão idealizado, pais e tios ou irmãos mais velhos violavam as filhas, sobrinhas e irmãs. Era assim como um direito constitucional. Havia filhos bastardos com pais anónimos e mães abandonadas que se convertiam em putas. As filhas excedentárias eram mandadas servir nas cidades. Os filhos estudiosos eram mandados para o seminário. Este sistema de escravatura implicava o apartheid. Os criados nunca dirigiam a palavra aos senhores e viviam pelas traseiras.

O trabalho infantil era quase obrigatório porque não havia escolaridade obrigatória. As mulheres não frequentavam a universidade e eram entregues pelos pais aos novos proprietários, os maridos. Não podiam ter passaporte nem sair do país sem autorização do homem. A grande viagem do mancebo era para África, nos paquetes da guerra colonial. Aí combatiam por um império desconhecido. A grande viagem da família remediada ao estrangeiro era a Badajoz, a comprar caramelos e castanholas.

A fronteira demorava horas a ser cruzada, era preciso desdobrar um milhão de autorizações, era-se maltratado pelos guardas e o suborno era prática comum.

De vez em quando, um grande carro passava, de um potentado veloz que não parecia sujeitar se à burocracia do regime que instituíra uma teoria da exceção para os seus acólitos. O suborno e a cunha dominavam o mercado laborai, onde não vigorava a concorrência e onde o corporativismo e o capitalismo rentista imperavam. Salazar dispensava favores a quem o servia. Não havia liberdade de expressão e o lápis da censura aplicava-se a riscar escritores, jornalistas, artistas e afins. Os devaneios políticos eram punidos com perseguição e prisão. Havia presos políticos, exilados e clandestinos. O serviço militar era obrigatório para todos os rapazes e se saíssem de Portugal depois dos quinze anos aqui teriam de voltar para apanhar o barco da soldadesca. A fé era a única coisa que o povo tinha e se lhe tirassem a religião tinha nada. Deus era a esperança numa vida melhor. Depois da morte, evidentemente.

Clara Ferreira Alves, Expresso, 2017-03-18



"Antigamente é que era bom!..." é falso!

Fascina-me ver pessoas a debitarem a ladainha do "antigamente é que era bom!", mas só podem estar a referir-se a algum hipotético antigamente saído do Stranger Things, porque eu vivi esses tempos, e era tão, mas tão pior do que hoje! Não sou velho, mas cresci numa terriola perdida no meio do Portugal profundo, e o desenvolvimento lá demorou a chegar. Nesses tempos não era difícil uma localidade ficar para trás no desenvolvimento, bastava que tivesse o azar de não passar por lá uma autoestrada, ou uma linha de comboio, ou algum grande eixo logístico.

A minha mãe passava fome para que eu não passasse, as ruas tornavam-se em rios quando chovia, os transportes públicos eram inexistentes, a eletricidade estava constantemente a ir abaixo, as casas eram geladas e no Inverno impossíveis de habitar. Eu tinha um único par de calçado para durar o ano inteiro, grassavam as superstições, a falta de cultura, a educação era dada com modelos altamente preconceituosos. Era considerado muito inteligente só porque gostava de ler, e a palavra do padre, porque a igreja era o ponto central de tudo, era divina. Olhando para trás, juntando as memórias, é possível que naquela altura pudesse haver abuso de crianças, mas absolutamente impensável sequer pensar nisso, quanto mais falar. Daqui também se depreende que qualquer pessoa com um cargo mais elevado (padre, médico, engenheiro) era intocável, uma mania que ainda hoje persegue o país, como tão bem explica o José Sócrates. Não é que hoje em dia haja mais corrupção, porque nesses outros "bons tempos" era completamente disseminada e normal, mas só hoje em dia é que se aponta, acusa e condena por isso. Até para mim foi um choque a prisão do Sócrates, na minha cabeça era impossível. Ele era engenheiro, tinha sido primeiro-ministro, como é que podia ser?

Eu não era dos piores. Conhecia gente que não tinha casa de banho em casa, famílias que não tinham eletricidade, quanto mais televisão, quanto mais essa bizarra coisa de um com-pu-ta-dor. Pessoas havia que não sabiam nada de doenças sexualmente transmissíveis, e para quem de qualquer maneira não se ia ao médico tratar do que fosse, isso era coisa de maricas. Colegas meus para quem a refeição da escola era a refeição do dia, ou iam para as aulas a cheirar a merda porque os pais não lhes davam banho, pais esses que acreditavam nas sopas de cavalo cansado como pequeno almoço (pão em taças de vinho, daquele vinho mesmo rasca, de garrafão de cinco litros). Ou que iam com marcas de espancamento para as aulas e, atenção ao toque precioso, eram acusados pelos professores desse espancamento ser culpa delas próprias.

Se querias uma consulta, pagavas um favorzinho ao "senhor doutor", não havia nenhuma ideia de pedir faturas, e qualquer coisa fora da norma era considerado de muito mau tom. Coisas fora do normal como, por exemplo, rir alto, porque dizia-se que rir muito era falta de juízo. "Muito riso, pouco siso", era uma daquelas sabedorias infalíveis dos velhotes. Falar com mulheres era outra, porque existiam para desencaminhar os homens (isto foi-me dito pela minha avó). Pessoas com deficiências mentais eram ignoradas porque havia sempre um tolo da aldeia, alcoólicos eram motivo de galhofa porque faziam figuras muito engraçadas, e nenhum deles era ajudado. Coisas tão corriqueiras como bancos e pastelarias? LOL

O Portugal de há muitos anos era ignorante, atrasado, e a falta de cultura e de educação eram o normal. Não era culpa das pessoas, isso eu sei, mas não elimina o facto. Eu vivi esse atraso, e portanto deixa-me maluco quem a) suspira pelos "bons velhos tempos", porque eram velhos, mas bons é que não, b) considera que as atuais gerações têm demasiado liberdade, ou não querem saber de nada, porque eu tenho contacto com os meus primos, e surpreendem-me a preocupação que têm com o estado do Mundo, da Sociedade, e do Futuro. São muito mais bem-educados, cultos e formados do que as gerações antigas eram, e c) ainda acham que "ai, isto o que era preciso era outro Salazar", porque não me resta dúvida que esse foi, de longe, o pior culpado de Portugal ter estado nesse estado miserável.

Por: NuncaAqui, julho de 2022. Disponível em: https://www.reddit.com/r/portugal/comments/wf6hex/antigamente_%C3%A9_que_era_bom_%C3%A9_falso/

  


terça-feira, 25 de abril de 2023

49.º Aniversário do 25 de Abril de 1974

O 25 de Abril não deve ser exclusivo de ninguém, mas também ninguém se deve excluir do 25 de Abril. Ele deve ser o ponto de encontro de todos os portugueses e já hoje, fundamentalmente, é esse ponto de encontro.

Marques Júnior, 25 de abril de 1990.

 

https://www.parlamento.pt/Paginas/2023/abril/25-de-Abril-2023.aspx

 

Comemoração do 49.º Aniversário do 25 de Abril de 1974

 

Intervenção do Presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva, na Sessão Solene Comemorativa do 25 de Abril

O 25 de Abril libertou-nos o tempo. O futuro deixou de reduzir-se à repetição do presente, mudar cessou de ser um verbo malquisto. O porvir passou a estar em aberto, declinável em várias possibilidades de evolução e transformação. E as pessoas descobriram-se sujeitos do futuro, cidadãs e cidadãos responsáveis pelas escolhas que o determinariam.

A natureza revolucionária do processo político que se seguiu ao 25 de Abril implicou uma radical aceleração do tempo. Como Sérgio Godinho tão bem cantou, "a sede de uma espera só se estanca na torrente". Descongelada a história, vencido o medo, era como se cinquenta anos de retrocessos tivessem de ser resolvidos num instante e as circunstâncias nada pudessem contra a vontade de agir no imediato, em todos os aspetos da vida coletiva. Desmantelados os aparelhos repressivos, a conflitualidade política e social exprimiu-se abertamente, numa vertigem que sucessivas crises foram alimentando, mas que também foi contida e regulada por avanços decisivos rumo à institucionalização democrática, das eleições para a Assembleia Constituinte ao 25 de Novembro e ao II Pacto MFA-Partidos, e da aprovação da Constituição à conclusão do primeiro grande ciclo eleitoral, com os sufrágios para a Assembleia da República, o Presidente da República, as Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas e as Autarquias Locais.

Assim estabilizada a ordem democrática – que a revisão constitucional de 1982 e a adesão às Comunidades Europeias haveriam ainda de aperfeiçoar – o tempo, parâmetro central da transição, pôde representar-se como o que realmente é: um feixe de múltiplos eventos, ritmos, escalas e durações, que deixa em aberto o porvir e nos convida a pensar e fazer. Também por isso, por terdes sacudido o imobilismo e reposto em movimento a roda da história, vos agradecemos, Capitães de Abril!

O tempo tem sido um marcador essencial da vida coletiva democrática. Como tudo o resto, sujeito à pluralidade e diversidade das representações a seu propósito. Mas não será difícil entender-nos sobre alguns aspetos cruciais.

A transitoriedade é o elemento básico. Nada é eterno, nada escapa à usura, cada contexto tem o momento próprio. A lógica republicana impõe limites ao exercício continuado de funções públicas, obrigando à renovação. As escolhas não são, por definição, definitivas. A composição dos parlamentos varia com as circunstâncias: os que hoje são maioria amanhã serão minoria, as oposições de hoje serão amanhã governo. Programas, políticas, equipas, lideranças, tudo isso é breve.

Em democracia, o tempo é, portanto, uma passagem. É também de uma grande plasticidade. Umas vezes acelera, outras abranda. Aqui predomina a urgência, ali o que faz sentido é parar um pouco para refletir. Esta hora é de estudar e preparar, aquela de agir sem delongas; e o agir pode ser para continuar ou para mudar, para consolidar ou para romper um certo estado de coisas.

Outra característica estrutural do tempo democrático é a ciclicidade. A escolha política fundacional, que é o sufrágio, determinando quem representa e quem governa, com que programa, obedece a critérios de periodicidade e duração.

A eleição é periódica porque nenhum poder é eterno, devendo ser regularmente aferida a vontade das pessoas. Por exemplo: as eleições legislativas ocorrem em cada quatro anos, determinam a composição do Parlamento e é a partir dessa composição – e só dela - que se formam os Governos e as Oposições.

Mas este intervalo que a renovação pendular delimita é também uma duração. O tempo dura, e isso é essencial numa democracia. Para que os programas sejam executados, as políticas aplicadas e os resultados avaliados. Para que a fiscalização se exerça e diferentes propostas sejam apresentadas e discutidas. Para que novos programas, protagonistas e coligações se preparem e maturem. Para que, assim informadas, as pessoas possam, no momento próprio, comparar e escolher.

Os tempos políticos são diferenciados; e pautarem-se os vários órgãos de soberania e demais instituições por diversas temporalidades é um dos ingredientes da estrutura de poderes e equilíbrios em que repousa a democracia. Depois, o ritmo da política não pode confundir-se com a cadência própria de outros atores relevantes do espaço público, como os atores sociais, os média ou os interesses económicos, nem a eles pode ser subordinado. O tempo político não é indiferente ao pulsar complexo e contraditório da sociedade; mas é a institucionalidade democrática que pauta o seu andamento, e a sua base principal é a escolha periódica, livre e soberana dos cidadãos.  

Nada disto é novidade, mas talvez seja oportuno lembrá-lo. Aqui e agora. Aqui no Parlamento que, nos termos da Constituição saída de Abril, é o coração da representação pluralista e do debate livre, e o centro da dialética entre Governo e Oposições. Agora que uma certa sofreguidão ameaça propagar-se, como vírus, no espaço público, pondo em causa vantagens preciosas da sólida democracia que somos, como tal reconhecida internacionalmente. As vantagens da estabilidade política, da previsibilidade dos comportamentos institucionais, da resiliência face à volubilidade das opiniões, da maturação das medidas em resultados, do sentido de responsabilidade nas palavras proferidas.

Claro que, em democracia, tudo pode ser questionado. Como já assinalei e faço questão de repetir, o tempo democrático é, por natureza, passageiro, plástico, diferenciado; e o regime tem mecanismos para evitar a perpetuação de situações que se tornem insustentáveis. Mas o tempo democrático é também cíclico, tem um certo ritmo e duração. E, se a Assembleia funciona, debatendo, fiscalizando, inquirindo, legislando; se o Governo desenvolve e aplica as suas políticas, com variável acerto, e goza de confiança parlamentar; se as Oposições vão fazendo caminho de formação e afirmação de alternativas; se os órgãos de soberania cooperam, no respeito pelas competências uns dos outros; se inúmeros são os problemas das pessoas e do país, sendo responsabilidade primacial dos diferentes decisores enfrentá-los – então devemos respeitar o tempo de cada instituição, sem atropelos nem precipitações. Devemos preferir a respiração pausada própria de uma democracia madura à respiração ofegante típica das excitações populistas.

Para benefício de todos. Porque, se todos perderemos no dia em que aceitarmos que a dinâmica política deve ser insensível às necessidades e ao ambiente social e pautar-se exclusivamente por procedimentos administrativos e formais; também todos perderemos no dia em que renunciarmos a distinguir entre erros localizados,  ainda que graves, e crises prolongadas e sistémicas, e  no dia em que aceitarmos que a vida de um Parlamento ou de um Governo – sejam eles quais  forem - está dependente do nível de protesto deste ou daquele setor, do favor da opinião publicada, da perceção dos média, do ruído nas redes sociais ou da evolução das sondagens.

Como o conjunto do mundo terreno para o Eclesiastes, a democracia compreende vários tempos. Há um tempo para analisar e há um tempo para escolher. Há um tempo para decidir e outro para executar. Há um tempo para realizar e outro para avaliar. Não se sucedem uns aos outros; a sua copresença é que define a nossa circunstância. Permanentemente sujeita à contradição e ao debate, mas também com os graus de liberdade que permitem, aos atores políticos, referirem a sua ação ao interesse geral, sabendo-se protegidos pela duração, face à exigência demagógica do império do instante.

As palavras, as palavras que dizemos e as palavras que não dizemos, contam muito. Deixo, pois, aqui uma defesa convicta do tempo democrático, que é o ciclo da conjuntura e não a fugacidade dos eventos. Só assim podemos continuar – todos - o trabalho que temos feito como país: prosseguindo os interesses permanentes, consolidar, modernizar, mudar o que for preciso e  para evoluir e progredir. Construindo o futuro que o 25 de Abril nos abriu.   

 

Augusto Santos Silva, https://www.parlamento.pt/sites/PARXVL/Intervencoes/Paginas/Intervencoes/Sessao-Solene-Comemorativa-do-XLIX-Aniversario-25-Abril-1974.aspx, 25-04-2023

 

Lisboa, Avenida da Liberdade, Desfile comemorativo da Revolução dos Cravos



Discurso do Presidente da República na Sessão Solene Comemorativa do 48.º aniversário do 25 de Abril

Há um ano falei-vos do Portugal na sua caminhada do Império até ao 25 de Abril, à Descolonização e à Democracia.

E nunca é demais evocar e agradecer o gesto refundador dos Capitães de Abril.

Pense-se o que se pensar sobre o que foram antes e depois desse gesto, ele foi único, singular e decisivo. Sem ele não haveria hoje uma Assembleia República livre com vozes livres. Não há como esquecê-lo na escrita ou na reescrita da História.

Hoje, falo do que vem de muito antes de Abril. Vem do começo de Portugal. Mesmo se só tem 700 anos no mar, 400 anos dos quais como corpo permanente e organizado, muitos séculos em terra e um século no ar.

São as nossas Forças Armadas, garantes da independência, da soberania, da integridade e da unidade da nossa Pátria.

E, nestes tempos em que a guerra na Europa reentra nas nossas casas, toca as nossas vidas, muda o nosso dia a dia, falar em Forças Armadas é falar daquilo que, sendo passado, é muito presente e, mais ainda, futuro.

Esta guerra não é a única, neste instante, no mundo. Mas é talvez a mais global de todas.

Esta guerra não foi a única que conhecemos na Europa, já depois de Abril de 1974. Mas pode vir a ser a mais brutal em refugiados forçados a terem de cortar as suas raízes, e, também, a mais universal nos seus efeitos em quase meio século.

Mas não é da guerra que vos quero falar hoje.

Hoje, o que importa é falar das nossas Forças Armadas no Portugal que Abril permitiu que fosse Democrático. Das Forças Armadas em Democracia.

Há uma semana agradeci aos nossos militares – e eram duzentos – que partiam para a Roménia – o seu serviço à Pátria.

Iam em missão de Paz, não em missão de guerra. Para defender a Paz, não para fazer a guerra. Para prevenir contra mais guerra e contribuir para criar mais Paz.

Paz para a Europa, e, desde logo, para aquela Europa em conflito e as vítimas diretas imediatas, e mais trágicas da guerra.

Paz para a Pátria, a nossa Pátria, do mesmo modo.

Paz e Segurança.

Aquela Paz e Segurança que é a missão primeira das Forças Armadas.

Pela Pátria! E o que é a Pátria que elas existem para servir?

É um Estado, independente há quase novecentos anos? É, mas é mais do que isso.

É uma comunidade de vida, de cultura, de língua, de identidades forjadas na diversidade, a que muitos chamam Nação, mesmo se o nosso Estado é, há muito, plurinacional? É, mas é mais do que isso.

É uma História, feita de glórias e fracassos, e mais glórias do que fracassos, senão, porventura, aqui não estaríamos agora? É, mas é mais do que isso.

É uma ideia, um projeto, um desígnio que nos une para além daquilo que separa, como o sermos universais, espalhados pelos mundos e servindo como plataformas de encontro entre eles? É, mas é mais do que isso.

É tudo o que disse. Mas mais, muito mais.

Uma Pátria são pessoas de carne e osso, todas somadas, e, cada uma delas de per si, vivam cá dentro das fronteiras físicas, vivam fora delas, no território espiritual. Que é onde estiver cada um de nós.

Portugal são os portugueses, mais os que se acolheram ou por eles foram acolhidos. E, cada qual, diferente, diverso, irrepetível.

Servir a Pátria, como existem para servir as Forças Armadas, é servir esses portugueses – cá dentro e lá fora – mais aqueles que se integram nessa nossa família comum.

Servir a Pátria desde sempre.

Foi traçar o nosso território Continental. E partir para as Ilhas. E atravessar Oceanos e contactar Continentes. E quase perder, ou perder mesmo, a independência. E reconquistá-la, tempo após tempo, geração após geração. E perder batalhas. E guerras. Mas ganhar umas e outras. Nas armas, na diplomacia, na economia, no tecido social. Mas também na língua, na cultura, nas pessoas. Sim, porque as batalhas como as guerras se perdem e ganham nas pessoas, com elas e para elas.

Servir a Pátria, neste tempo, por exemplo, é ir para a Roménia. Como estar na Lituânia. Na Républica Centro Africana. No Mali. No Mediterrâneo. No Golfo da Guiné. Em Moçambique. É nessas, como noutras paragens, servir a Paz e a Segurança de todos nós.

Mas como? Como é que na Roménia, ou nos céus da Europa Báltica, ou noutras Europas, Áfricas, Américas, ou Ásias, se luta pela Paz e a Segurança?

Luta-se, porque as nossas fronteiras já não são as que foram. Porque no Báltico, como no Leste Europeu, as fronteiras da União Europeia são as nossas fronteiras. Tal como noutros Continentes, as fronteiras da CPLP são as nossas fronteiras. Tal como, nalguns deles, as fronteiras da NATO, ou do mundo ibero-americano, são as nossas fronteiras. Tal como, cada vez mais por esse mundo fora – que são as Nações Unidas – as fronteiras da Paz, da Segurança, da Liberdade, da Igualdade, da luta contra a miséria e a pobreza e pela ação climática, são as nossas fronteiras.

Se a Paz não existir, a insegurança atingirá também as nossas vidas, a começar na dos compatriotas espalhados pelo universo, a nossa economia, os preços da nossa energia, dos nossos alimentos, dos nossos bens básicos, e tantos dos nossos projetos de vida.

A Paz e a Segurança não são, pois, apenas – e já seria muitíssimo, mesmo o mais pungente – a vida e a morte de quem está a dois ou três dias de viagem das nossas casas.

Não. É o nosso viver de todos os dias.

São as Forças Armadas, não os únicos, mas dos principais garantes dessa Paz. Mais visivelmente ainda em tempo de guerra. Mesmo se não entram nessa guerra. Previnem, ajudam a construir e preservam, mesmo ali ao lado, a Paz possível e desejável.

Mas fazem mais. Muito mais. Cá dentro. Desinfetam lares e escolas, organizam vacinação nacional em pandemia. Apoiam em incêndios florestais, cheias, catástrofes naturais.

Não são os únicos. Mas são sempre dos fundamentais.

E ainda dão, e querem dar mais, formação profissional para reinserção no emprego e na sociedade.

Senhoras e Senhores Deputados, Portugueses,

Por que razão, neste 25 de Abril, falo das nossas Forças Armadas, na Democracia que temos de recriar jornada após jornada?

Porque sem as Forças Armadas, e Forças Armadas fortes, unidas e motivadas, a nossa Paz, a nossa Segurança, a nossa Liberdade, a nossa Democracia – sonhos do 25 de Abril –, ficarão mais fracas.

Porque reconhecer como são importantes as Forças Armadas, na nossa vida como Pátria, exige mais do que recordarmos, por palavras, essa sua importância.

Porque, se queremos Forças Armadas fortes, unidas, motivadas, temos de querer que tenham condições para serem ainda mais fortes, unidas, motivadas.

Porque, se não quisermos criar essas condições, não nos poderemos queixar de que, um dia, descubramos de que estamos a exigir às nossas Forças Armadas missões difíceis de cumprir por falta de recursos.

Porque se o não fizermos a tempo, outros o exigirão por nós, e, depois, não nos queixemos de frustrações, desilusões, contestações ou afastamentos.

Porque pode ser tão simples mobilizar com pequenos grandes gestos.

Estimular a que quem é indispensável para servir nessas missões fundamentais o possa fazer com horizontes de esperança.

Juntar ao reconhecimento pelas qualidades excecionais que, cá dentro e lá fora, é unânime quanto às nossas Forças Armadas, mais meios imprescindíveis para poderem sê-lo também mais e melhor.

E fazer isto não é ser-se de direita ou de esquerda, conservador ou progressista, moderado ou radical. É ser-se pura e simplesmente patriota. Em Liberdade e Democracia.

E fazer isto não é só tarefa de um Presidente, de um Parlamento, de um Governo. Requer um consenso nacional, continuado e efetivo, acerca das Forças Armadas como pilar crucial da nossa vida coletiva.

Não podemos aplaudir ou clamar mesmo por maior envolvimento em ações externas, ou querê-las ainda mais presentes nos apoios internos, nomeadamente em situações extremas, e pensarmos que longe vão as guerras, que há muito mais onde gastar dinheiro, que nós podemos dispensar de nelas investir em benefício de todos nós.

Nós sabemos que, mesmo quando lhes faltam esses meios, são das melhores das melhores.

Mas não nos habituemos ao simplismo de converter milagres em quotidiano modo de vida.

Ajudemos a esses milagres. Sobretudo quando eles respeitam à Paz e à Segurança de todos nós.

Neste tempo em que a guerra surge como mais real ainda.

Em que a pandemia impôs necessidades mais evidentes.

Neste dia em que celebramos Democracia e Liberdade.

E em que percebemos como a Paz e a Segurança tocam nas nossas vidas.

Não é demais pensar, como Pátria que somos, nas Forças Armadas que temos, nas que queremos ter e nas que precisamos de ter.

Como desafio de todos, dos poderes públicos, da sociedade, de cada Portuguesa, de cada Português. Porque se os Portugueses não perceberem e não aderirem e não apoiarem, não há poder público – mesmo o mais corajoso ou voluntarista – que vingue sem a vontade popular.

É urgente essa vontade popular constante e firme.

Para que a Liberdade e a Democracia, para as quais o 25 de Abril abriu pistas fundamentais que prosseguimos até hoje, vivam sempre.

Para que esse sonho do 25 de Abril viva sempre.

Mas, sobretudo, para que Portugal viva sempre.

Vivam a Liberdade e a Democracia!

Viva o 25 de Abril!

Viva, não menos do que isso, Portugal!

 

Marcelo Rebelo de Sousa, https://www.presidencia.pt/atualidade/toda-a-atualidade/2022/04/discurso-do-presidente-da-republica-na-sessao-solene-comemorativa-do-48-o-aniversario-do-25-de-abril/, 25-04-2023

 

 Desfile comemorativo da Revolução dos Cravos | Lisboa, Avenida da Liberdade