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sábado, 17 de fevereiro de 2024

Mar Me Quer


 

Mar Me Quer

 

O Mar me quer, eu sou feliz só por preguiça
deixei escapar a maré, adormecido
Zeca Perpétuo, sou reformado do mar
tenho juízo de mamba pelo seu olhar

Mar me quer, bem me quer 
Canto chão de luarmina
o coração é uma praia
diz Celestiano à menina

Mar me quer, bem me quer 
com olhos de tubarão
meu avô falava certo
quem demora tem razão

Todas as noites despetalou flores a mulata 
Dona Luarmina, minha vizinha 
logo de manhã passa sonhos pelo rosto 
atrasa a ruga, impede o tempo

 

Letra e música de João Afonso

 

João Afonso Lima (Beira, 1965) é um cantor português. Viveu em Moçambique até 1978, com seus pais e irmãos. Colheu influências da música urbana africana e da música popular portuguesa, esta última pela influência de Zeca Afonso, seu tio materno. A sua colaboração em Maio Maduro Maio (1994), em parceria com José Mário Branco e Amélia Muge, valeu-lhe a atribuição do Prémio José Afonso.

Cristina Mielczarski Santos, A ponte entre a palavra da alma e a palavra do papel: epistolário ficcional miacoutiano. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Instituto de Letras. Programa de Pós-Graduação em Letras, 2013. http://hdl.handle.net/10183/77153

 

***

 

O poema "Mar Me Quer" de João Afonso é uma adaptação musical da novela Mar Me Quer, do escritor moçambicano Mia Couto, cuja leitura se encontra orientada na nossa página da Lusofonia.

Na novela Mar Me Quer, «Mulata Luarmina e Zeca Perpétuo partilham território de vizinhança, chão de terra tão mais velho que eles, olhando o mar que é sempre quem mais viaja.

Luarmina ensombreada de um qualquer silêncio, que de tão longo parece segredo, entardece todos os dias na companhia de Zeca, ouvindo as histórias que vão povoando a paisagem.

Zeca Perpétuo sonha sempre o mesmo: se embrulhar com ela, arrastá-la numa grande onda que os faça inexistir.

Luarmina foi aprendendo mil defesas para as insistências namoradeiras de Zeca, mas um dia resolve negociar falas e outras proximidades, não em troca de aventuras sonhiscadas de Zeca, mas de suas exatas memórias.

E como diz o avô Celestiano "o coração é uma praia", em que o mar, porque nos quer, acaricia memórias e apazigua ausências.

Avô Celestiano é a sabedoria do tempo. Mas também é o fabricador de sonhos. Por via dos sonhos, ele visita os vivos e conduz, na sombra dos aléns, os destinos e os amores de Zeca e Luarmina.

"O que faz andar a estrada? … o sonho. Enquanto a gente sonhar a estrada permanecerá viva. … para isso que servem os caminhos. Para nos fazerem parentes do futuro." (Mia Couto, Mar Me Quer

 

Natália Luiza, Mar me quer, Coimbra, Cena Lusófona, 2002(Adaptação dramatúrgica da novela homónima de Mia Couto, encomendada pela Cena Lusófona, e colocada em palco pela companhia Teatro Meridional, num espetáculo estreado em maio de 2001, no Teatro Taborda em Lisboa.)

 



 

LER MAIS EM:

 

Mar me quer (1998) -  leitura orientada

Apresentação da obra

Resumo da obra

Desfiar memórias como quem vai desfolhando flores (sobre Mar me quer, de Mia Couto)

Mar me quer: a outra face da lua

O mundo ficcional de Mia Couto – Mar me quer ou o coração é uma praia

Mar me quer: carta como elemento de primeiro contacto.

Imaginância rima com infância: os livros de receção infanto-juvenil de Mia Couto - Mar me quer

Mar me quer, de Mia Couto, entre as literaturas do insólito e juvenil

Mar me quer - propostas de trabalho

 


quarta-feira, 6 de dezembro de 2023

Problema de expressão (Clã)


Problema de expressão

Só pra dizer que te Amo,
Nem sempre encontro o melhor termo,
Nem sempre escolho o melhor modo.

Devia ser como no cinema,
A língua inglesa fica sempre bem
E nunca atraiçoa ninguém.

O teu mundo está tão perto do meu
E o que digo está tão longe,
Como o mar está do céu.

Só pra dizer que te Amo
Não sei porquê este embaraço
Que mais parece que só te estimo.

E até nos momentos em que digo que não quero
E o que sinto por ti são coisas confusas
E até parece que estou a mentir,
As palavras custam a sair,
Não digo o que estou a sentir,
Digo o contrário do que estou a sentir.

O teu mundo está tão perto do meu
E o que digo está tão longe,
Como o mar está do céu.

E é tão difícil dizer amor,
É bem melhor dizê-lo a cantar.
Por isso esta noite, fiz esta canção,
Para resolver o meu problema de expressão,
Pra ficar mais perto, bem mais de perto.
Ficar mais perto, bem mais de perto.

 

Clã, Kazoo, 1997

Composição: Hélder Gonçalves / Carlos Tê

 

Clã na foto da capa do álbum Kazoo, de 1997

 

Problema de expressão

Os Clã não escreveram só canções. Escreveram-nos canções. Para cantarmos de olhos fechados uma letra (de Carlos Tê) que revolvia a nossa timidez na hora de dizer ‘Amo-te’. Na língua inglesa, qualquer patetice fica mesmo sempre bem; em português, qualquer exteriorização de intimidade assume-se como extravagante (afinal, todas as cartas de amor são mesmo ridículas). A Carlos Tê reconhece-se o dom para simplificar conceitos complexos e para complexificar conceitos simples. Mas a Carlos Tê reconhece-se sobretudo o mérito de as suas letras nos fazerem vibrar como cordas. E foi ‘O Problema de Expressão’, do álbum “Kazoo”, que nos fez começar a vibrar como cordas com os Clã. É uma canção intimista, envolvente, delicada e viciante, fazendo-nos sentir parte do elenco em que foi composta. Há vizinhança entre a letra de ‘Problema de Expressão’ e a nossa sensibilidade.

“101 canções que marcaram Portugal #83: ‘O Problema de Expressão’, pelos Clã (1997)”. Ler mais: https://expresso.pt/blitz/2022-03-06-101-cancoes-que-marcaram-portugal-83-o-problema-de-expressao-pelos-cla--1997-

***

Depois de se descobrir o amor, nem sempre é fácil dizer ao outro que o amamos.

O sujeito de enunciação afirma ter um problema de expressão para dizer que ama alguém, porque não encontra o melhor termo ou modo.

Não entende o embaraço que o leva a achar que só tem estima por ele. Em muitos momentos, sente coisas confusas, não dizendo o que sente, mas sim o contrário.

Como é muito difícil dizer “amor”, e, uma vez que é bem melhor dizê-lo a cantar, o sujeito poético fez uma canção. Desta forma, resolveu o problema de expressão e conseguiu ficar mais perto, bem mais perto…

Contos & Recontos 7, Carla Marques e Inês Silva. Lisboa, ASA2013, p. 152

 


sexta-feira, 17 de março de 2023

A saia da Carolina, Carolina Deslandes


 

 

A saia da Carolina
Foi d’alguém que a ofereceu
Que é por ela ser menina
Que é pra estar perto de Deus
Foi assim de pequenina
Que a quiseram ensinar
Que o seu lugar é na cozinha
E em casa a costurar

E tem cuidado Carolina
Que o lagarto da ao rabo
Tu até te vês rainha
Queima-te o patriarcado
Tem cuidado Carolina
Quem tem sonhos tem pecados
Ser menina é tua sina
Ser mulher é teu legado

Cuidado com a Carolina
Que vem de punho cerrado
A saia da Carolina ardeu no meio do mato
A história da Carolina é que ela agora veste fato

Sou Maria Carolina, Deslandes pra vocês
Nasci do amor antigo do Kiko e da Inês
Tu querias julgar com riso toda a minha insensatez
É por ter crias comigo, e agora conto com três
A saia da Carolina nunca aqui teve um cabide
E eu ando bem calçada vai perguntar ao David
Debaixo do meu hoodie não gosto de dar nas vistas
Por isso cancela as minhas entrevistas
Tenho sardas espalhadas como grãos de areia
Pedem-me uma canção eu tenho uma mão cheia
Por isso avisa o lagarto que o esmago com o pé
Não há tempo pra rastejos em terra de jacaré
Não há tempo pra bocejos quando o dia me chama
Eu vivo de fé, há que viva de fama
A saia não é de ninguém
Carolina oioai Carolina o aí meu bem

Cuidado com a Carolina
Que vem de punho cerrado
A saia da Carolina ardeu no meio do mato
A história da Carolina é que ela agora veste fato

Sim Carolina oioai sim Carolina oai meu bem (x4)

 

Carolina Deslandes, “Saia da Carolina” (08.03.2023)

Letra: Carolina Deslandes

Música: Carolina Deslandes & Diogo Clemente (Adaptação de Canção Popular)

Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=-04QKx5rc5o

 

Esta canção é uma reinvenção da canção popular com o mesmo nome, que terá nascido entre a Galiza e o Norte de Portugal. A letra foi adaptada pela própria cantora, que contou com o apoio de Diogo Clemente na melodia. O single foi lançado no Dia da Mulher (8 de março de 2023) e é considerado um hino das mulheres.

A canção original fala sobre uma menina que recebe uma saia de alguém que a quer ensinar a ser submissa e obediente. A saia é um símbolo do papel tradicional da mulher na sociedade patriarcal, que se espera que fique em casa a cuidar dos filhos e do marido.

A canção de Carolina Deslandes subverte essa mensagem e transforma a saia num símbolo de resistência e emancipação. A cantora conta a sua própria história de vida, como mãe solteira e artista bem-sucedida, que não se conforma com os estereótipos e as expectativas impostas às mulheres. Ela afirma que a saia não é de ninguém e que ela veste o que quiser. Ela também desafia o machismo e o sexismo da sociedade, dizendo que esmaga o lagarto (uma expressão popular para designar um homem sem escrúpulos) com o pé e queima o patriarcado.

A canção é um manifesto de empoderamento feminino, que incentiva as mulheres a lutar pelos seus direitos e a libertar-se dos estereótipos que as prendem. A música sugere que ser mulher não é uma sina, mas sim um legado a ser celebrado e valorizado.

Origem: conversação com o https://www.bing.com/ e o https://chat.openai.com/chat, 14/03/2023 (adaptado).



 

 


A saia da Carolina, Carolina Deslandes” in Folha de Poesia, José Carreiro. Portugal, 17-03-2023. Disponível em: https://folhadepoesia.blogspot.com/2023/03/a-saia-da-carolina-carolina-deslandes.html


Ai Coração, Mimicat


 

Ai Coração

 

Ai Coração
Que não me deixas em paz
Não me dás sossego
Não me deixas capaz
Tenho a cabeça e a garganta num nó
Que não se desfaz e nem assim tu tens dó

Sinto-me
Tonta
Cada dia pior
Já não sei de coisas que sabia de cor
As pulsações subiram quase pra mil
Estou louca, completamente senil

O peito a arder
A boca seca eu sei lá
O que te fazer
Amor pra mim assim não dá
Porque parece que nem sou mais eu

Ai Coração
Ai Coração
Diz-me lá se és meu

As horas passam e o sono não vem
Ouço as corujas e os vizinhos também
O meu juízo foi-se e por lá ficou
Alguém me tire deste estado em que estou
O doutor diz que não há nada a fazer
Caso perdido vi-o eu a escrever
Ando perdida numa outra dimensão
Toda eu sou uma grande confusão

O peito a arder
A boca seca eu sei lá
O que te fazer
Amor pra mim assim não dá
Porque parece que nem sou mais eu

Ai Coração
Ai Coração
Ai Coração
Diz-me lá se és meu

O peito a arder
A boca seca eu sei lá
O que te fazer
Amor pra mim assim não dá
Porque parece que nem sou mais eu

Ai Coração
Ai Coração
Ai Coração
Ai Corаção
Diz-me lá se éѕ meu

 

Canção: “Ai Coração”

Intérprete: Mimicat

Música: Marisa Mena, Luís Pereira

Letra: Marisa Mena

Portugal, Festival da Canção 2023

 

 

Esta letra da canção intitulada “Ai Coração”, escrita e interpretada por Mimicat, venceu, em Portugal, o Festival da Canção 2023.

"Ai Coração" é uma expressão poética da angústia e da confusão emocional que pode ser experimentada por alguém que está apaixonado e que não sabe o que fazer para encontrar paz, por estar perdido nos seus próprios sentimentos.

A linguagem utilizada é simples e direta, com versos curtos e repetições que reforçam a intensidade emocional da voz poética. A linguagem coloquial e popular reforça a ideia de que a poesia reflete a voz de um indivíduo comum, que está lidando com sentimentos intensos e que não consegue encontrar uma solução para suas aflições.

A imagem do coração como uma entidade separada da pessoa, que causa sofrimento e desespero, é um tema recorrente na literatura e na cultura popular. O uso repetitivo da expressão "Ai Coração" é uma forma de personificar o órgão responsável pelas emoções e torná-lo um protagonista do poema.

A voz poética sente-se à mercê do coração, sem controle sobre seus sentimentos e emoções, e busca desesperadamente por uma solução para sua angústia.

Os sintomas físicos como boca seca (“A boca seca eu sei lá”), o calor (“O peito a arder”) e o coração acelerado ("pulsações subiram quase pra mil") contribuem para a atmosfera de desespero e ansiedade que permeia o poema. A sensação de perda de controle e confusão é reforçada no verso "Ando perdida numa outra dimensão / Toda eu sou uma grande confusão". A referência ao médico que declara o caso como perdido sugere que a voz poética se sente desamparada e sem esperança (“O doutor diz que não há nada a fazer”).

O último verso do poema, "Diz-me lá se és meu", é uma pergunta direta ao coração, que revela a insegurança e a falta de controle do sujeito sobre seus próprios sentimentos.

Em síntese, o sujeito poético sente que o seu coração não lhe pertence mais e que está a perder a razão e a identidade por causa do amor. Assim, o texto parece apresentar a mensagem de que esse tipo de amor é insustentável e está a causar um grande sofrimento, deixando o sujeito poético completamente vulnerável.

 

Origem: conversação com o https://chat.openai.com/chat e o https://www.bing.com/, 13/03/2023 (adaptado).

 




Oh, Heart

Oh, heart
You who don't leave me in peace
You don't give me any rest
You don't let me be able
I have my head and my throat in a knot
That won't come apart and even then you don't pity me

I feel
Dizzy
Every day it gets worse
I don't know things I used to know by heart
The heartbeats have gone up almost to a thousand
I'm crazy, completely senile

My chest is burning
My mouth's dry, I don't know
What to do with you
Darling, this isn't working for me
Because it seems like I'm not even myself anymore

Oh, heart
Oh, heart
Tell me if you're mine

The hours go by and sleep doesn't come
I hear the owls and the neighbours as well
My judgement's gone away and stayed there
Someone take me out of the state I'm in
The doctor tells me there's nothing to be done
Lost cause I saw him write
I've been lost in another dimension
All of me is a big mess

My chest is burning
My mouth's dry, I don't know
What to do with you
Darling, this isn't working for me
Because it seems like I'm not even myself anymore

Oh, heart
Oh, heart
Oh, heart
Tell me if you're mine

My chest is burning
My mouth's dry, I don't know
What to do with you
Darling, this isn't working for me
Because it seems like I'm not even myѕelf anymore

Oh, heart
Oh, heart
Oh, heart
Oh, heаrt
Tell me if you're mine

 

Disponível em: https://eurovisionworld.com/eurovision/2023/portugal

 

 


Ai Coração, Mimicat” in Folha de Poesia, José Carreiro. Portugal, 17-03-2023. Disponível em: https://folhadepoesia.blogspot.com/2023/03/ai-coracao-mimicat.html


 

sábado, 19 de novembro de 2022

O Amor – poema de Vladimir Mayakovsky adaptado por Caetano Veloso


 

A canção de Caetano Veloso

 

O Amor

 

Talvez quem sabe, um dia
por uma alameda do zoológico
ela também chegará
ela que também amava os animais
entrará sorridente assim como está
na foto sobre a mesa
ela é tão bonita
ela é tão bonita que na certa eles a ressuscitarão
o século trinta vencerá
o coração destroçado já
pelas mesquinharias
agora vamos alcançar tudo o que não podemos amar na vida
com o estrelar das noites inumeráveis
ressuscita-me
ainda que mais não seja
porque sou poeta
e ansiava o futuro
ressuscita-me
lutando contra as misérias do quotidiano
ressuscita-me por isso
ressuscita-me
quero acabar de viver o que me cabe
minha vida para que não mais existam amores servis
ressuscita-me
para que a partir de hoje a partir de hoje
a família se transforme e o pai seja pelo menos o universo
e a mãe seja
No mínimo a terra
a terra
a terra

 

“O Amor” - Letra e música: Caetano Veloso, Ney Costa Santos, Vladimir Mayakovsky.

Intérprete: Gal Costa. LP Fantasia. Brasil, Polygram/Philips, 15-11-1981

 

 

Fantasia - álbum de estúdio de Gal Costa. Brasil, Polygram/Philips, 15-11-1981

 

O poema de Vladmir Mayakovsky

 

O Amor

 

Um dia, quem sabe,
ela, que também gostava de bichos,
apareça
         numa alameda do zoo,
sorridente,
                   tal como agora está
                       no retrato sobre a mesa.
Ela é tão bela,
         que, por certo, hão de ressuscitá-la.
Vosso Trigésimo Século
                                ultrapassará o enxame
de mil nadas,
                         que dilaceravam o coração.
Então,
          de todo amor não terminado
seremos pagos
                          em inumeráveis noites de estrelas.
Ressuscita-me,
                         nem que seja só porque te esperava como um poeta,
repelindo o absurdo quotidiano!
Ressuscita-me,
                           nem que seja só por isso!
Ressuscita-me!
                           Quero viver até o fim o que me cabe!
Para que o amor não seja mais escravo
de casamentos,
         concupiscência,
                                   salários.
Para que, maldizendo os leitos,
                                        saltando dos coxins,
o amor se vá pelo universo inteiro.
Para que o dia,
                             que o sofrimento degrada,
não vos seja chorado, mendigado.
E que, ao primeiro apelo:
                                             - Camaradas!
atenta se volte a terra inteira.
Para viver
                  livre dos nichos das casas.
Para que
                  doravante
                               a família
                                            seja
o pai,
        pelo menos o Universo;
a mãe,
        pelo menos a Terra.

 

Vladimir Mayacovski, A Propósito Disto, 1923

Traduzido por Emílio C. Guerra, in Antologia poética, Mayacovsky. São Paulo, Editora Max Limonad Ltda., 1987 (1.ª edição: Editora Leitura S.A., 1963)

 

Lilya Brik no jardim zoológico de Berlim


[LILYA BRIK]

No período de 1914 a 1916, registam-se decisivos acontecimentos na vida de Mayacovsky. Desde a expulsão da Escola de Belas-Artes, entrega-se às andanças e turbulências da pregação futurista, sem um vintém no bolso, faminto, sem teto, dormindo muitas vezes na rua. Sobrevinda a guerra, é mobilizado, pouco depois de ter conhecido Lilya Brik e por ela, irremediavelmente, se apaixonar. Se ao front consegue furtar-se, passando graças à interferência de amigos, entre os quais Gorki, a trabalhar na oficina de um engenheiro; se à guerra dá combate, escrevendo toda uma série de poemas, tais como: A Tarde grita sem pernas nem braços, ó fechai os olhos dos jornais, Ó como choravam os olhos dourados das fogueiras! e, principalmente, o longo poema Guerra e Paz; se contra a fome inventara o engenhoso "sistema dos sete dias", assim:

... procuro seis conhecidos com quem almoçar. A os domingos comia com os Iucovski. Às segundas-feiras com os Efréimov, etc. Às quintas, quase não comia. Para um futurista de quase dois metros de altura, não era coisa fácil…

Contra a paixão de Lilya Brik nada pode o poeta, outra coisa não lhe restou senão render-se. O acontecimento tem a "data radiante" de julho·de 1915. A Flauta Vertebrada, Guerra e Paz, obras-primas daquele ano, lhe são dedicadas e, daí por diante, praticamente tudo que o poeta escreveria.

Tomaste
arrancaste-me o coração
e simplesmente foste com ele jogar
como uma menina com sua bola.
………………………………….
E eu de júbilo
esqueci o jugo.
Louco de alegria
saltava
como em casamento de índio
tão leve
tão bem me sentia.

Lilya era casada com o editor Oto Brik, quem primeiro comprou as produções do poeta, a 50 copeques por linha. Era formosa, corpo diminuto, frágil e sensual, olhos escuros e profundos. Mulher de personalidade múltipla e cambiante; de grande intuição e versatilidade artística, capaz de escrever, pintar, modelar, dançar e representar. Era "triste, alegre, feminina, caprichosa, vazia, inconsciente, inteligente, trabalhadora quando trabalhava, enamorada sempre. Mas era pequeno-burguesa; queria só mimos, comodidades. E o poeta não tinha senão seu génio" (Chklóvski). Disso tinha consciência o apaixonado poeta:

Sei. Todos pagam pela mulher.
Não importa
se por ora
em vez do luxo de um vestido parisiense
visto-te apenas com a fumaça de meu cigarro.

Elsa Triolet traça o seguinte retrato da irmã:

... a cabeça ruiva jogada para trás, mostrava todos os dentes esplêndidos, sólidos, na boca grande, pintada, os olhos castanhos muito redondos, iluminados, num rosto com esse excesso de expressão quase indecente de intensidade, que faz com que, jovem ou velha., com sua tez miraculosa, ou toda enrugada, os transeuntes sempre se voltem à sua passagem.

É um instantâneo de julho de 1918, flagrante do momento em que se despediam, no cais de Leningrado, Elsa e a mãe exilando-se voluntariamente, fugindo da guerra e da peste, Lilya ficando.

Naquele então, Lilya e Mayacovsky moravam juntos nos arredores da cidade assolada pela cólera. Juntos ainda haviam de passar outros períodos, tal como, em Sokolniki, subúrbio de Mascovo, por volta de 1925, numa datcha da qual Elsa Triolet nos conta:

Na peça principal havia um bilhar. Não sei como esse bilhar fora parar ali, não fora feito para aquela sala de dimensão ordinária e onde já havia um piano de cauda, um grande divã, etc. No verão comia-se no terraço e havia o jardim. Os jogadores podiam rodar em torno do bilhar sem grande incómodo. Mas, no inverno, e no domingo, quando chegava uma verdadeira multidão de amigos, não sobrava estritamente espaço entre a sopeira e o jogador dobrado em dois, sobretudo quando esse jogador era Mayacovsky!... Todos os bichos tinham um lugar de honra na casa de Lili e Mayacovsky.

Entretanto, a "casa de Lilya e Mayacovsky" não se consolidaria. Fatores diversos o impediriam: a vida duríssima daqueles tempos, a guerra, a peste, ou a NEP, a falta de dinheiro, as viagens ou as batalhas políticas, mas, sobretudo, o temperamento de ambos, o do poeta, especialmente, que sabia em consciência não ser "um, homem cómodo".

Quando este corpanzil se punha a uivar
as donas

disparando
pelo pó, pelo barro ou pela neve,
como um foguete fugiam de mim.
- Para nós, algo um tanto menor,
algo assim como um tango
...

A desmedida sensibilidade de Mayacovskiy - tão bem espelhada nas hipérboles que lhe recheiam os versos - o estado de tensão criadora em que permanentemente vivia, fazendo-o taciturno, sombrio, excessivamente concentrado, a alternância de profundas depressões com alegrias ruidosas, produziam não poucas dificuldades ao seu convívio social. Por contraste, a força que singularizava esse temperamento íngreme e arrebentado, manifestava-se numa fome de amor de igual intensidade. Com o ardor que punha em tudo, buscava ser feliz e desejava que todos o fossem. Em meio às tremendas lutas que travava, não abria mão do ideal de um amor novo, de conceção mais elevada, entre o homem e a mulher. E então, ao lado da poesia política, de combate duro, ou mesmo dentro dela, confessava-se, desabafava, sonhava ou penitenciava-se, em poemas de amor. Mas, na vida quotidiana, ainda praticava a "desgraçada infidelidade":

Não temas
que em meu pescoço de touro
tenham subido mulheres húmidas
de ventre suarento.
É que, através da vida,
arrasto milhares de enormes e puros amores
e milhares de milhares
de amorzinhos pequeninos e sujos.
Não temas
que de novo na desgraçada infidelidade
me aproxime de mil caras bonitas
amantes de Mayacovsky.

Em 1923, escrevia o poema A Propósito Disto, que é, ao mesmo tempo, o seu mais dilacerante grito de amor e um hino de esperança num futuro mais feliz, no qual se imagina ressuscitado para reaver o seu quinhão de afeto.

Não vivi até o fim o meu bocado terrestre.
Sobre a terra
não vivi o meu bocado de amor.

Apesar do fracasso das tentativas de vida em comum, Lilya continuaria a ser, até o fim, a bem-amada, a amiga, a confidente, a musa do poeta.

É verdade que houve também Polonskaia, - por sinal que também com outro casada - mas parece que em segundo lugar na hierarquia do coração do poeta. Lilya Brik era seu melhor ancoradouro, seu verdadeiro porto-seguro. Com um só gesto, ela apaziguava qualquer de suas tempestades.

 

Emílio C. Guerra, in Antologia poética, Mayacovsky. São Paulo, Editora Max Limonad Ltda., 1987 (1.ª edição: Editora Leitura S.A., 1963)

 

A 19 de fevereiro, Mayakovsky enviou a Lilya uma carta com o endereço do remetente "Moscovo". Reading Gaol" - uma referência direta ao poema de Oscar Wilde. A carta foi assinada: "O teu Shen, aliás Oscar wilde, aliás o prisioneiro de Chillon" - uma alusão ao poema de Lord Byron "O Prisioneiro de Chillon”, de 1816. No balão de fala do desenho lê-se: "Eu amo!" (Bengt Jangfeldt, Mayakovsk: a biography, 2007)

 


A PROPÓSITO DISTO

A ideia de um poema sobre o amor estava na mente de Mayakovsky desde pelo menos o verão de 1922, quando ele escreveu na sua breve autobiografia Eu próprio ("I Myself") (pretendida como um prefácio para uma edição de quatro volumes das suas obras que nunca apareceu): "Planeado: sobre o amor. Um poema enorme. Será concluído no ano que vem." Não sabemos o "plano" deste poema, mas que deve ter sido diferente daquele que resultou da separação de Lilya é óbvio, pois a base temática de A propósito disto (About This) é precisamente essa separação. Dada a homogeneidade das imagens e do simbolismo de Mayakovsky, não podemos excluir a possibilidade de que algumas de suas ideias e imagens possam estar presentes em rascunhos anteriores; no entanto, foi a separação de Lilya que desencadeou sua criatividade e o fez colocar a caneta no papel. […]

A referência a Raskolnikov não é coincidência – A propósito disto está repleto de referências a Dostoiévski, que era o autor favorito de Mayakovsky. Isso vale também para o próprio título, A propósito disto (Pro eto), que é emprestado de Crime e Castigo. Raskolnikov usa consistentemente as palavras a propósito disto (em itálico) para descrever o que ele fez - o assassinato do agiota e sua irmã. Mayakovsky reconheceu-se em Raskolnikov: a paixão superaquecida por uma ideia, a obsessão por realizar atos que mudarão o mundo, a recusa de ser arrastado para a miséria e a rotina da vida quotidiana. […]

A última secção do poema está na forma de uma petição a um químico desconhecido no século trinta. Ele olha para a Terra da perspetiva do Grande Carro, a Ursa Maior! O seu manifesto contra "a tirania do quotidiano" é uma obra-prima retórica. […]

Mayakovsky quer outra vida e pondera diferentes alternativas. Se ele acreditasse em uma vida após esta, não haveria problema, mas os seus adversários não devem ter o prazer de ver "como, silenciado por seus tiros, eu caio". O ataque a ele foi um fracasso, embora apenas alguns "esfarrapados de poeta" tenham permanecido. Ele também rejeita o suicídio […]. Assim, quando, sob o título "Fé", ele pede ao químico para reanimá-lo, é uma questão de ressurreição em carne e osso. Influenciado pelas ideias do filósofo russo Nikolay Fyodorov sobre "ressuscitar os mortos" e pela teoria da relatividade de Einstein - que ele discutiu entusiasticamente com Roman Jakobson na primavera de 1920 - Mayakovsky acreditava num mundo futuro onde todos os mortos seriam ressuscitados na forma física.

Ele desenvolve o conceito sob o título "A Esperança", onde pede ao químico que implante um novo coração nele, que lhe dê transfusões de sangue e martele ideias em seu crânio: " Não vivi até o fim o meu bocado terrestre,/ sobre a terra/ não vivi o meu bocado de amor." Se for difícil encontrar trabalho para ele, ele sempre pode trabalhar num jardim zoológico, pois gosta muito de animais.

Com isso, chegamos à secção final, "Amor", que é um resumo de todo o poema. Numa visão de poder extraordinariamente lírico, Mayakovsky vê-se reunido com Lilya numa nova vida, livre do "lixo quotidiano", em um amor que não é mais eros, mas ágape, onde a estreita solidariedade familiar foi substituída pela comunhão entre toda a humanidade.

 

Mayakovsky: a biography, Bengt Jangfeldt; translated in English from Swedish by Harry D. Watson. Chicago and London, The University of Chicago Press, 2014, pp. 242-252


Quando A propósito disto foi publicado como livro no verão de 1923, incluiu "foto montagens" de Alexander Rodchenko. Aqui está a ilustração a secção sobre "o Homem na Ponte". 
(Bengt Jangfeldt, Mayakovsk: a biography, 2007)



[O BARCO DO AMOR QUEBROU-SE NA VIDA DO DIA A DIA]

Se Eliot foi atormentado pelo retorno do passado, pela presença do passado no presente e pela tradição, Mayakovsky foi devorado pela revolução e pelo futuro ("Arruinado pelo futuro", diz Pasternak). Para Eliot, o presente não pode existir sem o passado. Para Mayakovsky o presente não tem sentido e não se sustenta sem o futuro. O futuro era tudo para Mayakovsky: nova humanidade, integração de todas as esferas da vida que a opressão secular e a hipocrisia burguesa separaram. O bolchevismo e o Cubo-Futurismo tinham de ser uma coisa única, forma substancial e substância formal da nova cultura soviética.

A obra e a vida de Mayakovsky são um ciclone no qual nada pode entrar se não for em virtude de um dinamismo excecional, o da sua personalidade e dos anos revolucionários em que viveu: desde quando, adolescente, deixou a escola para se tornar revolucionário, até o dia de seu suicídio, aos trinta e seis anos, em 1930 (um tiro de pistola no coração, após uma briga com a jovem atriz Veronika Polonskaia). Mayakovsky trabalha para a sua arte revolucionária como um titã incansável, como uma criança que não aprendeu a controlar a medida dos seus próprios gestos e que se move imaginando que ao seu redor existe um espaço sem limites. Excessivo, grotesco, terno, impiedosamente satírico, escreve e desenha poemas, vinhetas, slogans, manifestos, peças de teatro. O que sempre teve diante dos olhos, vivendo e escrevendo, era uma visão excessiva, um jogo pirotécnico de dimensões cósmicas. Ou era a espera pela ressurreição, uma ressurreição terrestre, física, que os omnipotentes cientistas do futuro lhe dariam. Fá-lo-ão calar a agonia da revolução, a agonia do amor e um espaço social e político que para ele e para os artistas momentaneamente parecia enorme, mas que foi reduzido, no decorrer dos anos 1920, a uma prisão burocrática.

No poema A propósito disto (que conclui com a secção "Amor", aqui transcrita), escrito em 1922-1923, Mayakovsky dirige-se ao cientista do futuro que finalmente terá o poder de trazer os mortos de volta à vida. Ele implora para ela não o esquecer, não o esquecer quando encontrar o seu nome: "Faz-me ressuscitar!". É uma oração apaixonada, infantil, cheia de amor por ela (Lilya Brik), cheia de amor por si mesmo (Volodya Mayakovsky). O futuro devorou o presente e o presente tornou-se cada vez mais estreito. O último ano da sua vida será um ano de deceções, de fracassos, de cansaço. Amores infelizes, dificuldades com a cultura oficial e o eterno refrão, cada vez mais insistente: "As massas não te entendem". Numa manhã de segunda-feira de março de 1930, Mayakovsky queria que Veronika Polonskaia ficasse com ele, mas ela teve de correr para o teatro: “Quando se consegue um emprego interessante como o do Teatro da Arte, não se pode tornar-se esposa de um marido, mesmo que seja um grande homem como Mayakovsky […]. Saí. Eu estava a alguns passos do portão. Ouvi um tiro. As minhas pernas cederam, comecei a gritar”. Dois dias antes, o homem a quem Estaline chamaria "o maior poeta da nossa época soviética" tinha escrito na sua última carta: "Se eu morrer, não culpe ninguém. E, por favor, nada de mexericos. O falecido não poderia suportar [...] O barco do amor quebrou-se na vida do dia a dia [...] Vocês que ainda estão vivos, sejam felizes". A conclusão que ele queria era esta.

Alfonso Berardinelli, Cento poeti. Milano, Mondadori 1991


As fotografias para as colagens em A propósito disto não foram tiradas por Rodchenko mas por Avraam Sterenberg, caldo do pai David Sterenberg, com cuja família Mayakovsky e os Briks partilharam o apartamento em Poluektov Lane em 1919-1920. Esta fotografia foi utilizada na colagem onde Mayakovsky está à espera do telefonema de Lilya. 
(Bengt Jangfeldt, Mayakovsk: a biography, 2007)



Outras traduções do poema "O Amor", de Mayakovsky 

 

Tal vez,
                quizá,
                             alguna vez,
por el camino de una alameda del zoológico,
entrará también ella.
Ella,
           ella también amaba a los animales,
y sonriendo llegará,
                                          así como está,
                                                                       en la foto de la mesa.
Ella es tan hermosa,
a ella con seguridad la resucitarán.
Vuestro siglo XXX
                                     vencerá,
al corazón destrozado por las pequeñeces.
Ahora,
               trataremos de terminar,
todo lo que no hemos podido amar en la vida,
en innumerables noches estrelladas.

¡Resucitádme,
                              aunque más no sea,
                                                                      porque soy poeta,
y esperaba el futuro,
luchando contra las mezquindades de la vida cotidiana!
¡Resucitádme,
                            aunque más no sea por eso!
¡Resucitádme!
                              Quiero acabar de vivir lo mío,
                                                                                            mi vida
para que no exista un amor sirviente,
ni matrimonios, sucios,
                                                concuspiscentes,
Maldiciendo la cama,
                                            dejando el sofá,
alzaré por el mundo,
                                          un amor universal.
Para que un día,
                                 que el dolor degrada,
cambie,
y no implorar más,
                                       mendigando,
y al primer llamado de:
                                                ¡Camarada!
se dé vuelta toda la tierra.
Para no vivir,
sacrificándose por una casa, por un agujero.
Para que la familia,
                                       desde hoy,
                                                              cambie,
el padre,
                 sea por lo menos el Universo,
y la madre
                      sea por lo menos la Tierra.

 

Lila Guerrero, http://amediavoz.com/maiacovski.htm#AMOR%203


Lilya Brik com um exemplar de A propósito disto
Fotografia de Alexander Rodchenko, 1924 
(Bengt Jangfeldt, Mayakovsk: a biography, 2007)

 


Un jour, peut-être,
elle qui aussi aimait les bêtes,
elle réapparaîtra dans une allée du zoo,
souriante,
tout à fait comme sur la photo là, sur la table.
Elle est si jolie.
C’est sûr qu'on la ressuscitera !

Votre trentième siècle devancera
le lot des mesquineries
qui déchiraient nos cœurs.
Nous retrouverons
notre part d'amour inachevé
dans d'innombrables nuits étoilées.

Ressuscite-moi,
ne fût-ce que parce que je t'attendais,
en repoussant les mirages quotidiens.
Ressuscite-moi,
ne fût-ce que pour cela !
Ressuscite-moi !
Je veux vivre pleinement ce qui me revient !

Pour que l’amour ne soit plus esclave
d’un mariage,
de la luxure ou d’un salaire.
Pour que l’amour,
ayant maudit les lits et déserté enfin les couches,
s’élève partout dans le monde !
Pour ne plus avoir à supplier en mendiant,
quelques jours de plus à vieillir.
Pour que la terre entière se lève
au premier cri de « Camarade ! ».

Pour ne plus avoir à sacrifier sa vie
au nom d’une maison, d'un trou !
Pour qu’à partir de maintenant la famille se transforme,
et le père devienne pour le moins l’univers,
la mère, simplement la Terre...

Vladimir Maïakovski, “Requête”, in Anthologie de la Poésie Russe du XVIIème siècle à nos jours. Traduction: E. RAIS et J. ROBERT. Adaptation par Eduardo REIS. <https://www.babelio.com/auteur/Vladimir-Maiakovski/15517/citations/2229835>, 23-12-2020

 

 

A propósito disto, capa de Alexander Rodchenko


Perhaps,
      one day
             perhaps, along the walkways of the zoo,
she will come
-
       for she loved animals too
-
             wandering through the park,
like in the photo
            in my drawer,
                        smiling.
They will certainly resurrect her
-
            She is so pretty.
     …
Resurrect me
            at least
                       because I
                              as a poet,
waited for you,
freed myself from all the everyday muck.
Resurrect me
             at least for that!
Resurrect me
-
             I want to live out the rest of my life!
So that love is not changed into a lackey
      to marriage,
           bread
                      and lechery.
So that love with a curse
            climbs up out of its bed
to wander through the universe's infinity.
So that the day
           doesn't have to go begging for food,
grizzled and ragged in the highway's dust.
So that
      with the first cry:
           
-Comrade! -
the earth turns round and is changed.
So that we avoid living
      fettered to the household hearth.
So that
from now on
           we are like brother and sister,
so that
      our father at least
          might be the world
and the earth our mother.

 

Mayakovsky: a biography, Bengt Jangfeldt; translated in English from Swedish by Harry D. Watson. Chicago and London, The University of Chicago Press, 2014


Mayakovsky: a biography, Bengt Jangfeldt, 2007

 

Maiakowski, Autobiografia e poemas. Ed. Presença, 1974.
Coleção Forma #2. Tradução: Carlos Grifo



“O Amor – poema de Vladimir Mayakovsky adaptado por Caetano Veloso”, José Carreiro. Folha de Poesia, 2022-11-19. Disponível em https://folhadepoesia.blogspot.com/2022/11/o-amor-poema-de-vladimir-mayakovsky.html