quarta-feira, 9 de março de 2011

CORPUS CHRISTI




[Jesus] trabalhou com mãos humanas, pensou com inteligência humana, agiu com vontade humana, amou com coração humano.
             
Gaudium et spes
(excerto citado no Catecismo da Igreja Católica, 2010, 10ª ed.)
         


              
                            
             
O que a seguir se apresenta são representações artísticas do corpo de Cristo.
          
Esta estilização dos traços da humanidade de Jesus são, obviamente, uma forma de protesto à apropriação monolítica daquela figura extraordinária.
         
Nós, ocidentais, enformados pela cultura judaico-cristã, somos, como se pode observar, os primeiros a repensar essa mesma tradição.
          
Que tudo se apresente num espírito de tolerância.
             
           
                
              

         
        


               
    
     He's a man, he's just a man
          
             
              




                   

«Soudtrack»: Jesus Christ Super Star, álbum duplo, disco 1, track 11,
Música: Andrew Lloyd Letra: Tim Rice, Intérprete: Ivonne Elliman, 1970;
        
    
    
         
I DON'T KNOW HOW TO LOVE HIM  

(Mary Magdalene’s song)
    

I don't know how to love him
What to do how to move him
I've been changed yes really changed
In these past few days when I've seen myself
I seem like someone else
     
I don't know how to take this
I don't see why he moves me
He's a man, he's just a man
And I've had so many men before
in very many ways
He's just one more
       
Should I bring him down
Should I scream and shout
Should I speak of love
Let my feelings out
I never thought I'd come to this
What's it all about ?
          
Don't you think it's rather funny
I should be in this position ?
I'm the one who's always been
so calm, so cool, no lover's fool
running every show
He scares me so
           
Yet, if he said he loved me
I'd be lost, I'd be frightened
I couldn't cope, just couldn't cope
I'd turn my head I'd back away I
wouldn't want to know
He scares me so
I want him so.
         
          
        
      
          
          
A Edição de Julho de 2010 faz uma homenagem a José Saramago.
     
A capa exibe a imagem de Jesus Cristo velando sobre a cama uma mulher de feições eróticas. Na cabeceira da cama vem escrito "O Evangelho Segundo Jesus Cristo", referência ao romance de José Saramago, escrito em 1991, onde é representado um Jesus Cristo humanizado e ligado aos prazeres da carne.
         
A edição de julho da Playboy ainda traz uma das últimas entrevistas concedidas pelo escritor.
          
        
         

     
He's a man, he's just a man
    
     
        
  
     


        
He's a man, he's just a man


       
        
    
   
Stephan Melzl, Kopf, 2003
(Pinakothek der Moderne, München)
                                                               
       
Quadro exposto na Pinacoteca Moderna, em Munique.
    
Descrição: no centro da composição está apenas um homem seminu, vestindo uma camisa estampada com o ícone de Cristo. No lugar da cabeça estão representados três balões de cor alaranjada para onde está focalizada a iluminação, formando uma auréola oval vertical.
    
O quadro divide-se horizontalmente em três partes: na parte aérea estão os três balões; no centro ‑ o tronco do homem e os braços cruzados sob a representação da cabeça de Cristo; na parte baixa ‑ a zona genital e os membros inferiores até aos joelhos. O fio que prende os balões desce verticalmente o quadro parecendo estar preso ao pénis.
          
Do conjunto representado resulta uma obscuridade relativa, pois que os vários elementos concorrem para uma significação simbólica, com eventual incursão no mistério.
    
Apresentada a a descrição, convido-vos a fazer a respectiva interpretação.
    
José Carreiro

   
[Post original: http://comunidade.sol.pt/blogs/josecarreiro/archive/2011/03/09/Jesus.aspx]

domingo, 27 de fevereiro de 2011

MULHERES DE ABRIL | A REPÚBLICA DAS MULHERES


A República das Mulheres I 
        
         
COMUNICAÇÃO
         
Tudo chegava pelo lado da sombra, do terror, da pegajosa ignomínia. Os esbirros amordaçavam a luz. Com as mãos mergulhadas nas estrelas que escondia nos bolsos o poeta assobiava uma pátria de brancura e paz. E deu flor: um poema para ensinar risadas de camélias aos animais do medo. O poema foi arrastado para a treva onde os estranguladores das palavras constroem o silêncio da sala de espelhos onde o tirano se masturba. O poema atravessou o inferno e alguns dos seus sons ficaram queimados.
     
Uma vez exalado o grito de libertação que fez entrar a Cidade no exercício dos seus timbales o poema pediu ao poeta que lhe arrancasse as folhas mais ressequidas e em seu lugar pusesse as gotas de água do canto que quer correr para a vida. E o poeta fez a vontade ao poema que queria cantar. E aqui e além o corrigiu dotando-o da actualidade que as máquinas do inferno lhe roubaram.
          
Natália Correia, 1959
in O Sol nas Noites e o Luar dos Dias Is/l, Círculo de Leitores, 1993, p. 229.
         
              
A República das Mulheres I (ciclo de conferências, 2011) 
                  
        
          
BASTA
        
Basta.
– digo –
que se faça
do corpo da mulher:
      
a praça – a casa
a taça
         
A ÁGUA
           
Com que se mata
a sede
do vício e da desgraça
             
Maria Teresa Horta, Mulheres de Abril
Lisboa, Ed. Caminho, 1977.
         
***

PRANTO PELO DIA DE HOJE
        
Nunca choraremos bastante quando vemos
O gesto criador ser impedido
Nunca choraremos bastante quando vemos
Que quem ousa lutar é destruído
Por trocas por insídias por venenos
E por outras maneiras que sabemos
Tão sábias tão subtis e tão peritas
Que nem podem sequer ser bem descritas.
         
Sophia de Mello Breyner Andresen
Livro Sexto, 1962

O poema [“Pranto pelo dia de hoje”, de Sophia de Mello Breyner Andresen,] apresenta-se em uma forma simples, um bloco de oito versos maioritariamente decassílabos que trazem a angústia daqueles que ousam lutar e criar em um ambiente marcado pela coerção e cerceamento ideológico. Nos dois versos dodecassílabos que se repetem, “Nunca choraremos bastante quando vemos”, observamos a voz poética afirmar que nenhum pesar é suficiente para um gesto criador que é cerceado e nenhuma lamentação soluciona a luta daqueles que foram destruídos por sua ação. A referência à censura pode ser lida por meio dos verbos “impedir”, que se associa à limitação da liberdade de expressão praticada pelo governo do Estado Novo, e “destruir”, que sugere a violência com que é executada a ação de controle político.

Há, novamente, o aspeto de falsidade, perversão moral e traição, que aparecem nas imagens de “insídia” e “venenos”. O termo “insídia” significa “espera às escondidas do inimigo, para investir sobre ele; tocaia, emboscada, cilada; falta de lealdade; traição, cilada; ardil, estratagema, intriga” (Dicionário Eletrônico Houaiss). Assim, temos uma espécie de antítese na aproximação do verbo “lutar”, com aspeto positivo – aquele que resiste e que busca romper o cenário da coerção e da ameaça –, e dos termos “destruído”, “insídia” e “venenos”. Esse contraste revela a tentativa de resistência diante de um contexto que ameaça e cerceia aqueles que se expressam de forma contrária ao governo e que, muitas vezes, não conseguem vencer a força dos que detêm o poder.

Os últimos três versos do poema reforçam o tom de denúncia na medida em que a voz poética afirma que há outras maneiras “tão sábias tão subtis e tão peritas” de destruir quem luta “que nem podem sequer ser bem descritas”. O verbo descrever oferece ao poema uma perspetiva mais objetiva, distanciando a voz poética de um relato subjetivo, o que garante aos versos um forte viés de denúncia e de relato de alguém(*) que sofreu com a censura e com a tortura. O título, que insere o pesar no dia de hoje, fortalece essa ideia de denúncia das ações arbitrárias e opressoras da censura em Portugal […].

 

Nathália Macri Nahas, Grades: uma leitura do projeto po-ético de Sophia de Mello Breyner Andresen. São Paulo, USP-FFLCH, 2015

 

___________

(*) Nas cartas trocadas com o autor Jorge de Sena, Sophia Andresen revela algumas situações em que sofreu com a censura e a ação da PIDE. Em 11 de outubro de 1962, a polícia esteve em sua residência e confiscou toda a correspondência enviada por Sena. (ANDRESEN, S.; SENA, J., 2010, p.65). Em 10 de junho de 1963, a autora relata que deixou a direção da revista Távola Redonda, por problemas com a censura. (Ibidem, p. 76). Em 14 de maio de 1966, ela relata ter recebido da União Nacional dois comunicados de insultos, ameaças e acusações de ligação aos comunistas e glorificação de terroristas. (Ibidem, p.93). A autora também relata, em entrevista dada a Eduardo Prado Coelho, que chegou a escrever dois atos de uma peça teatral sobre os irmãos Graco, mas, em uma busca da PIDE entre 1969 e 70, ela escondeu os escritos e nunca mais os achou. (ANDRESEN, S., 1986, p. 68).

 



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[Post original: http://comunidade.sol.pt/blogs/josecarreiro/archive/2011/02/27/republica.das.mulheres.aspx]

domingo, 6 de fevereiro de 2011

ANDEI POR MONTES E VALES

José Carreiro, “vale encantado” in Olhares
          
          
          
          
«Andei por montes e vales,
Sem dormir, nem descansar;
O comer, da carne crua,
No sangue a sede matar.
Sangue vertiam meus pés
Cansados de tanto andar;
E os sete anos cumpridos
Sem a poder encontrar.»

         
«Dom Gaifeiros», Romanceiro,
recolha de Almeida Garrett publicada entre 1843 e 1851.
             
         [Post original: http://comunidade.sol.pt/blogs/josecarreiro/archive/2011/02/06/vale.encantado.aspx]

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

LILAC WINE (James Shelton/Nina Simone)



   
    
I lost myself on a cool damp night
I gave myself in that misty light
Was hypnotized by a strange delight
Under a lilac tree
I made wine from the lilac tree
Put my heart in its recipe
It makes me see what I want to see
be what I want to be
When I think more than I want to think
I do things I never should do
I drink much more than I ought to drink
Because it brings me back you...
               
Lilac wine is sweet and heady, like my love
Lilac wine, I feel unsteady, like my love
Listen to me... I cannot see clearly
Isn't that he* coming to me nearly here?
Lilac wine is sweet and heady, where's my love?
Lilac wine, I feel unsteady, where's my love?
Listen to me, why is everything so hazy?
Isn't that he, or am I going crazy, dear?
Lilac Wine, I feel unready for my love,
feel unready for my love.
           
"Lilac Wine" (1950), letra de James Shelton,
* na versão de Nina Simone para o album Wild Is The Wind (1966).
    
    
    


[Post original: http://comunidade.sol.pt/blogs/josecarreiro/archive/2011/02/04/LilacWine.aspx]