sexta-feira, 9 de agosto de 2013

AR LIVRE (Miguel Torga)


“Registo de Adolfo [Correia] Rocha, de pseudónimo Miguel Torga”
pertencente ao fundo “PIDE” do Arquivo Nacional da Torre do Tombo.

               

            
AR LIVRE

Ar livre, que não respiro!
Ou são pela asfixia?
Miséria de cobardia
Que não arromba a janela
Da sala onde a fantasia
Estiola e fica amarela!

Ar livre, digo-vos eu!
Ou estamos nalgum museu
De manequins de cartão?
Abaixo! E ninguém se importe!
Antes o caos que a morte...
De par em par, pois então?!

Ar livre! Correntes de ar
Por toda a casa empestada!
(Vendavais na terra inteira,
A própria dor arejada,
- E nós nesta borralheira
De estufa calafetada!)

Ar livre! Que ninguém canta
Com a corda na garganta,
Tolhido da inspiração!
Ar livre, como se tem
Fora do ventre da mãe
Desligado do cordão!

Ar livre, sem restrições!
Ou há pulmões,
Ou não há!
Fechem as outras riquezas,
Mas tenham fartas as mesas
Do ar que a vida nos dá!
            
Miguel Torga, Cântico do Homem, 1950
               

                                                       CÂNTICO DO HOMEM, Miguel Torga
               
                   
Texto de apoio 1
Ao longo de quase quarenta anos, estas referências ao poder castrador da censura faziam parte integrante das obras dos mais variados escritores que lutavam denodadamente para que a liberdade fosse, realmente, acessível a todos. Sem ela, o ser humano vive com “a corda na garganta” e, assim ameaçado, nem o poeta pode cantar, já que foi “tolhido da inspiração”, como refere Miguel Torga.
A asfixia do sujeito poético, que pode simbolizar a de todo um país, é recorrentemente enfatizada no poema devido à repetição anafórica da expressão “Ar livre”, associada às frases exclamativas. Numa espécie de diálogo virtual com o recetor plural (“Ar livre, digo-vos eu!”), explicita-se o que está na origem dessa falta de ar. Vive-se estagnado, confinado a um tempo passado e hermético, impermeável à mudança já que o sujeito tem consciência de que vive “nalgum museu”, que as janelas estão fechadas como numa “estufa calafetada” e ninguém age devido à “Miséria de cobardia”. Tolhida a fantasia, retidos num tempo-outro que os distancia do mundo por onde passam “Vendavais”, nem os construtores de palavras conseguem cantar. Assim sendo, o sujeito poético deseja vivamente o caos – dado que o encara como o oposto da morte em que vivem -, o poder usar os pulmões e respirar livremente, sentir que voltou a estar “Fora do ventre da mãe/Desligado do Cordão!”. A possibilidade de dizer o que pensa, de não ser comandado por uma força exterior a si próprio leva o sujeito poético a solicitar que todas as riquezas sejam fechadas, mas que lhe permitam ter acesso àquela que é essencial ao homem: o “ar que a vida nos dá!”.
Este poema de Torga coaduna-se com a posição defendida por Italo Calvino a propósito da função do escritor do século XXI. Se, num século onde aparentemente as ditaduras não existem – as políticas, as instituídas pelo poder político ‑, há ainda a necessidade de o escritor manifestar um empenho político, em tomar partido e comprometer-se com a divulgação de determinadas ideias; essa atitude de compromisso com um quotidiano silenciado, aprisionado, que urgia debelar, era ainda mais fulcral na época das ditaduras, como foi o caso de grande parte do século XX em Portugal.
“Nunca, como no momento actual, a realidade desafiara tão ostensivamente os artistas, e, mais do que nunca, eles sentiam a urgência de a olhar de frente e desmascarar, para que não ficassem sem denúncia e acusação os crimes do mundo.” (Miguel Torga, A Criação do Mundo ‑ 1937-1981)
                 
Portugal sob a égide da ditadura: o rosto metamorfoseado das palavrasTese de mestrado de Paula Fernanda da Silva Morais. Universidade do Minho – Instituto de Letras e Ciências Humanas, julho de 2005, pp. 50-52.
           
***
           
Texto de apoio 2 
[…] não é tão-pouco por acaso que se intitula A Criação do Mundo a autobiografia que Torga escreveu e que, ainda que transposta em termos ficcionais, logo subentende um íntimo acordo, ou o desejo de um íntimo acordo, entre a respiração do homem e a respiração do mundo. Mas, nesse desejo, igualmente se contém um esforço de correção recíproca entre aqueles dois ritmos respiratórios.
Seja como for, é principalmente no domínio da poesia torguiana que tal desejo e tal esforço aparecem mais patentes, mais nítidos ou, pelo menos, mais isoladamente "audíveis”. Assim acontece, nomeadamente, no poema “Ar Livre” do livro Cântico do Homem, publicado em 1950, poema esse que poderá ‑ ou deverá ‑ ser simultaneamente lido em duas diferentes claves ‑ uma literal e outra simbólica, uma no teclado da natureza e outra no do protesto político ‑ o que de imediato lhe confere a dobrada espessura de solilóquio e de coro, ou de «monumento» individual e de «documento» coletivo, numa aparente ambiguidade que se impõe afinal como negação da ambiguidade.
“Ou há pulmões / Ou não há”: esta clara disjuntiva, remate de algumas outras que constituem o suporte estrutural do texto, desvenda também a preocupação de que a respiração do homem terá de ser equivalente à respiração do mundo ‑ e de que este só respira bem, se, em conjunto, a Natureza e a História assim o permitirem.
           
David Mourão-Ferreira, Boletim Cultural do Serviço de Bibliotecas Itinerantes e Fixas da Fundação Calouste Gulbenkian, n.º 10, dedicado a Miguel Torga, maio de 1988, pp. 10-12
           
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Texto de apoio 3: verbete sobre Cântico do Homem, de Miguel Torga

Cântico do Homem corresponde, no conjunto da obra poética de Miguel Torga, a uma das coletâneas onde mais nítida se ouve a razão histórica que dita a revolta de um autor que, inflexível na resistência contra tudo o que representasse cerceamento da liberdade humana, vinha sofrendo, sobretudo desde a segunda metade da década de 40, sucessivas repressões à sua liberdade pessoal, profissional e literária. O conjunto de significados levantados quer pelo "cântico", consubstanciado lexicalmente pelo "canto" ou pelo "grito" e, estilisticamente, por um tom predominantemente exclamativo, quer pela qualificação como sendo "do homem", isto é, não de um eu individual, mas de um eu que se faz voz da humanidade, convertem este volume numa das mais pungentes reflexões do homem do pós-guerra que não se reconhece no espelho de homem, "corpo e alma da degradação", que um contexto histórico desproveu de qualquer humanismo e cuja imagem "flutua / Na podridão dos charcos luarentos!". Ao mesmo tempo, o "homem" anunciado pelo título remete para um arquetípico "Ecce Homo", que recebeu as dores do mundo para o redimir, e à imagem do qual o poeta também suplica uma coroa de "espinhos", "Cilícios vegetais / sobre a fronte de quem / sobre a fronte de quem / Tem nojo das carícias do presente". Composições como "Ar Livre" ou "Dies Irae" permitem uma leitura como denúncia política, comparecendo como documento histórico da revolta contra o cerco levantado, nesses anos, em torno do país e de cada homem - significativamente aquela segunda composição será escolhida para figurar na folha antológica do 5.º fascículo de Notícias do Bloqueio. Como contraponto de um desespero tanto mais intenso quanto é plasmado em formas comedidas, resta o apelo à fraternidade e à "temeridade", e, sobretudo, o arrimo de "homem natural" de que se nutre para proclamar uma ilimitada confiança na vida.

Porto Editora – Cântico do Homem na Infopédia [em linha]. Porto: Porto Editora. [consult. 2023-04-02]. Disponível em https://www.infopedia.pt/$cantico-do-homem

 

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Texto de apoio 4: Lendo Miguel Torga 

Onde Miguel Torga desembestou1 mais furiosamente foi contra a política salazarista. Prova disso é o poema Cântico do Homem, as prisões nos aljubes2 da PIDE3 e o embargo de algumas obras. (…)

A escalada dos grandes fascismos europeus coincidiu com a maturidade física e intelectual de Miguel Torga. Mussolini marchava sobre Roma, bombardeara a Abissínia e, mais tarde, atacara a França pelas costas, para comprazer ao parceiro, Adolfo Hitler. Implantada no coração da Europa, a «pata rugosa» do nazismo hitleriano ia atirar o mundo para os horrores da Segunda Guerra Mundial. Franco, disposto a fuzilar meia Espanha, se tanto fosse necessário, fuzilava e decapitava «rojos»4 em série. Em Portugal, Salazar, que, para Torga, era um homem dotado do «conhecimento satânico do preço dos homens», transforma-se, aos olhos do poeta do Diário, num enorme «pulmão de aço» pelo qual obrigava todo o país a respirar.

Foi nesta data que Torga se meteu a viajar pelo Velho Mundo. O resultado dessa viagem foi o seu primeiro livro em prosa, O Quarto Dia da Criação do Mundo. Um alarme aos homens do seu tempo e um violento desafio a todos os que reputava seus tiranos. Imediatamente preso pela PIDE, foi encarcerado no Aljube5.

Ainda em França, e antes desta prisão, fora convidado a exilar-se. Mas, se Torga diz que «ser escritor em Portugal é como estar dentro dum túmulo a garatujar na tampa», pensa também que «é preciso pagar a liberdade». E a liberdade estava em Portugal! No estrangeiro, perde-se o que é nosso e não se adquire o alheio… (…)

Torga tem consciência de que, apesar da bruteza ingénita6 do meio em que nasceu e dos trambolhões que pela vida levou, foi privilegiado em relação aos seus conterrâneos. «Dos meus companheiros de classe, alguns finos como corais, poucos assinam hoje o nome. A mão moldou-se de tal maneira à enxada, foi tanta a negrura e a fome que os rodeou, que esqueceram de todo que havia letras e pensamento». Valeu a pena lutar!

António Freire, Lendo Miguel Torga, Porto, Edições Salesianas, 1990

 

____________
1 desembestou: reagiu com violência.
2
aljubes: prisões subterrâneas, cárceres.
3
PIDE: Polícia Internacional e de Defesa do Estado.
4
«rojos»: vermelhos; nome aplicado, em Espanha, a militantes de partidos de esquerda, nomeadamente aos comunistas.
5
Aljube: prisão, em Lisboa, onde ficavam os presos que estavam a ser interrogados na sede da PIDE.
6
ingénita: que nasceu com o indivíduo; inata.

 


Questionário sobre o texto de António Freire

Selecione, em cada um dos itens de 1 a 7, a única alternativa que permite obter uma afirmação adequada ao sentido do texto.

Escreva, na folha de respostas, o número de cada item, seguido da letra que identifica a alternativa correta.

1. A utilização das expressões «‘conhecimento satânico do preço dos homens’» (linha 10) e «‘pulmão de aço’» (linha 11) constitui, da parte de Torga, uma

(A) crítica severa à atuação de Salazar.

(B) análise neutra da política salazarista.

(C) censura suave ao papel de Salazar.

(D) reflexão objetiva sobre a governação salazarista.

2. A obra de Torga, «O Quarto Dia da Criação do Mundo» (linha 14), constitui um

(A) elogio aos seus compatriotas.

(B) desabafo dirigido ao povo.

(C) alerta aos seus contemporâneos.

(D) apelo dirigido aos governantes.

3. A expressão «‘finos como corais’» (linha 23) significa

(A) magros, esguios.

(B) inteligentes, perspicazes.

(C) ativos, diligentes.

(D) polidos, educados.

4. Os elementos textuais «Miguel Torga» (linha 1), «Miguel Torga» (linha 5), «Torga» (linha 10), «poeta do Diário» (linha 11), «Torga» (linha 13), «Torga» (linha 17) e «Torga» (linha 21) asseguram a coesão

(A) lexical.

(B) frásica.

(C) temporal.

(D) interfrásica.

5. Em «para comprazer ao parceiro, Adolfo Hitler.» (linha 6), o constituinte «ao parceiro» desempenha a função de

(A) sujeito.

(B) complemento direto.

(C) vocativo.

(D) complemento indireto.

6. Em «homens do seu tempo» (linhas 14 e 15), o referente de «seu» é

(A) «Torga» (linha 13).

(B) «Velho Mundo» (linha 13).

(C) «resultado» (linha 13).

(D) «primeiro livro» (linha 14).

7. Em «‘que esqueceram de todo’» (linhas 24 e 25), a conjunção «‘que’» estabelece uma relação de

(A) substituição.

(B) retoma.

(C) consequência.

(D) comparação.

8. Faça corresponder a cada segmento textual da coluna A um único segmento textual da coluna B, de modo a obter uma afirmação adequada ao sentido do texto.

Escreva, na folha de respostas, o número do item e os números que identificam os cinco segmentos textuais da coluna A, cada um destes seguido da alínea da coluna B que lhe corresponde.

 

A

 

B

1) Com a expressão «para comprazer» (linha 6),

2) Com «se tanto fosse necessário» (linhas 8 e 9),

3) Com a frase «fora convidado a exilar-se.» (linha 17),

4) Com o uso de «também» (linha 19),

5) Com «Valeu a pena lutar!» (linha 25),

a) o enunciador estabelece uma conexão

aditiva.

b) o enunciador expressa uma posição

pessoal.

c) o enunciador manifesta o seu repúdio.

d) o enunciador expõe a consequência da informação dada anteriormente.

e) o enunciador indica uma finalidade

f) o enunciador apresenta o conteúdo da frase como uma possibilidade.

g) o enunciador refere uma ação passada que precede uma outra também passada.

h) o enunciador faz uma declaração.

 

Chave de correção:

1. (A); 2. (C); 3. (B); 4. (A); 5. (D); 6. (A); 7. (C).

8. As correspondências corretas são: 1) e); 2) f); 3) g); 4) a); 5) b).

Fonte: Exame Nacional do Ensino Secundário n.º 639 (Decreto-Lei n.º 74/2004, de 26 de março). Prova Escrita de Português - 12.º Ano de Escolaridade. Portugal, Ministério da Educação/ GAVE-Gabinete de Avaliação Educacional, 2009, 1.ª Fase (Versão 1)

 

Oficina de escrita: texto expositivo-argumentativo

Elabore uma reflexão sobre o significado da liberdade, partindo da perspetiva exposta no excerto a seguir transcrito.

Fundamente o seu ponto de vista recorrendo, no mínimo, a dois argumentos e ilustre cada um deles com, pelo menos, um exemplo significativo.

Escreva um texto, devidamente estruturado, de duzentas a trezentas palavras.

«A liberdade é, antes de mais nada, o respeito pelos outros e o respeito que os outros nos devem em função dos nossos direitos. A liberdade é a combinação entre os direitos e os deveres, sem que cada um invada o espaço que, por direito, pertence aos outros.»

José Jorge Letria, O 25 de Abril Contado às Crianças… e aos Outros, Lisboa, Terramar, 1999

Fonte: Exame Nacional do Ensino Secundário n.º 639 (Decreto-Lei n.º 74/2004, de 26 de março). Prova Escrita de Português - 12.º Ano de Escolaridade. Portugal, Ministério da Educação/ GAVE-Gabinete de Avaliação Educacional, 2009, 1.ª Fase


Proposta de correção:

A liberdade é um conceito que assume grande variedade de sentidos entre os diversos autores que se ocuparam do tema, sendo difícil atribuir um significado consensual, mesmo nos seus elementos fundamentais³. No entanto, o excerto transcrito parece sugerir que a liberdade é a combinação entre os direitos e os deveres, sem que cada um invada o espaço que, por direito, pertence aos outros¹.

Assim, a liberdade pode ser vista como uma condição ou característica de quem é livre e tem o direito ou a faculdade de fazer escolhas de acordo com a sua própria vontade, sem restrições ou impedimentos¹. A liberdade deve respeitar os limites legais e não prejudicar ninguém¹.

Um exemplo significativo pode ser o direito à liberdade de expressão. Este direito é fundamental para a democracia e para o desenvolvimento humano. No entanto, este direito não é absoluto e deve ser exercido com responsabilidade e respeito pelos outros². Outro exemplo pode ser o direito à privacidade. Este direito é importante para proteger a dignidade humana e a intimidade pessoal. No entanto, este direito também não é absoluto e deve ser equilibrado com outros valores como a segurança pública e a justiça².

(1) Liberdade – Wikipédia, a enciclopédia livre. https://pt.wikipedia.org/wiki/Liberdade Acedido 02/04/2023.

(2) Liberdade: o que é, significado e conceito. https://www.significadofacil.com/liberdade/ Acedido 02/04/2023.

(3) Liberdade: o que é, significado e tipos - Significados. https://www.significados.com.br/liberdade/ Acedido 02/04/2023.

(4) liberdade | Dicionário Infopédia da Língua Portuguesa. https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/liberdade Acedido 02/04/2023.

Fonte: conversação com o Bing, 02/04/2023

 

***

Outra proposta de correção:

A liberdade é um conceito fundamental para a existência e a convivência humana. José Jorge Letria, no seu livro O 25 de Abril Contado às Crianças... e aos Outros, apresenta uma perspetiva interessante sobre o significado da liberdade. Segundo o autor, a liberdade deve ser entendida como o respeito pelos outros e pelos nossos direitos, bem como o respeito que os outros nos devem. A liberdade é, portanto, a combinação entre os direitos e os deveres, sem que cada um invada o espaço que, por direito, pertence aos outros.

Um primeiro argumento que podemos apresentar em defesa desta perspetiva é que a liberdade não pode ser entendida como um direito absoluto. É necessário que haja limites e restrições ao exercício da liberdade, para que ela não prejudique ou viole os direitos dos outros. Por exemplo, a liberdade de expressão não pode ser usada para disseminar discurso de ódio ou para difamar outras pessoas.

Outro argumento importante é que a liberdade não deve ser vista apenas como um direito, mas também como um dever. Isso significa que, ao exercer a nossa liberdade, devemos ter em mente as consequências das nossas ações e agir com responsabilidade. Por exemplo, o direito à livre circulação implica o dever de respeitar as regras de trânsito e de não colocar em risco a vida dos outros.

Em suma, a liberdade deve ser entendida como uma combinação entre os direitos e os deveres, respeitando o espaço que, por direito, pertence aos outros. Para garantir a convivência em sociedade, é fundamental que a liberdade seja exercida com responsabilidade e com respeito pelos direitos dos outros.

Fonte: conversação com o https://chat.openai.com/chat, 02/04/2023

***

Mais uma proposta de correção:

A liberdade é um tema fundamental na sociedade contemporânea. Para José Jorge Letria, a liberdade é baseada no respeito pelos outros e no respeito pelos nossos próprios direitos. É importante ressaltar que a liberdade não pode ser confundida com a ausência de limites e regras. Pelo contrário, a liberdade é alcançada por meio do equilíbrio entre os nossos direitos e deveres, sem infringir os direitos dos outros.

Um dos argumentos que sustentam esta perspetiva é que a liberdade não pode ser considerada um direito absoluto. Isto é, a liberdade individual não pode ser desprovida de limites que garantam o bem-estar e os direitos dos outros. Por exemplo, a liberdade de expressão não pode ser usada para difamar ou insultar outras pessoas. Este tipo de comportamento é considerado abuso de liberdade, pois viola o direito dos outros à dignidade e à honra. Assim, a liberdade não pode ser utilizada como um pretexto para prejudicar os outros.

Outro argumento é que a liberdade só pode ser verdadeiramente alcançada quando há responsabilidade e respeito pelas leis. A liberdade não é sinônimo de anarquia. As leis e os regulamentos são essenciais para garantir o bem-estar da sociedade como um todo. Por exemplo, as leis de trânsito estabelecem regras para garantir a segurança na estrada. Se todos os motoristas seguirem essas regras, eles terão a liberdade de dirigir com segurança. Mas, se alguns motoristas decidirem não respeitar as regras, a liberdade de todos os outros será comprometida.

Em suma, a liberdade é um conceito complexo e multifacetado. Como afirmado por José Jorge Letria, a liberdade é baseada no respeito pelos outros e pelo nosso próprio direito. A liberdade só pode ser verdadeiramente alcançada quando há responsabilidade e respeito pelas leis. Quando equilibrada com responsabilidade e respeito pelos direitos dos outros, a liberdade pode ser um poderoso agente de mudança social e progresso humano.

Fonte: conversação com o https://chat.openai.com/chat, 02/04/2023

 

           
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► A poética torguiana - Apresentação crítica, seleção, notas e sugestões para análise literária da poesia de Miguel Torga, por José Carreiro. In: https://folhadepoesia.blogspot.com/2018/04/a-poetica-torguiana.html, 09-08-2013


 Poesia útil e literatura de resistência” (A literatura como arma contra a ditadura e a guerra colonial portuguesas), José Carreiro

   
                 

 


CARREIRO, José. “AR LIVRE (Miguel Torga)”. Portugal, Folha de Poesia, 09-08-2013 (Última atualização: 02-04-2023). Disponível em: https://folhadepoesia.blogspot.com/2013/08/ar-livre-miguel-torga.html (Post original: http://comunidade.sol.pt/blogs/josecarreiro/archive/2013/08/09/miguel.torga.ar.livre.aspx)


quinta-feira, 8 de agosto de 2013

POETA CASTRADO, NÃO! (Ary dos Santos)


 


                 
POETA CASTRADO, NÃO!

Serei tudo o que disserem
por inveja ou negação:
cabeçudo dromedário
fogueira de exibição
teorema corolário
poema de mão em mão
lãzudo publicitário
malabarista cabrão.
Serei tudo o que disserem:
Poeta castrado      não!

Os que entendem como eu
as linhas com que me escrevo
reconhecem o que é seu
em tudo quanto lhes devo:
ternura como já disse
sempre que faço um poema;
saudade que se partisse
me alagaria de pena;
e também uma alegria
uma coragem serena
em renegar a poesia
quando ela nos envenena.

Os que entendem como eu
a força que tem um verso
reconhecem o que é seu
quando lhes mostro o reverso:

Da fome já se não fala
‑ é tão vulgar que nos cansa
mas que dizer de uma bala
num esqueleto de criança?

Do frio não reza a história
‑ a morte é branda e letal –
mas que dizer da memória
de uma bomba de napalm?
E o resto que pode ser
o poema dia a dia?
‑ Um bisturi a crescer
nas coxas de uma judia;
um filho que vai nascer
parido por asfixia?!
‑ Ah não me venham dizer
que é fonética a poesia!

Serei tudo o que disserem
por temor ou negação:
demagogo       mau profeta
falso médico       ladrão
prostituta       proxeneta
espoleta       televisão.
Serei tudo o que disserem:
Poeta castrado não!
               
José Carlos Ary dos Santos, Resumo, 1972



             
A consciência de que ao poeta compete ser a voz da recusa, a que não é silenciada, a que incentiva à luta pela liberdade, a que se nega a compactuar com o sistema ou a esquecer o ambiente envolvente, vivendo num mundo ficcional porque não-real, perpassa também o poema “Poeta Castrado, Não” de Ary dos Santos.
Nele o poeta assume claramente que poderá ser tudo o que os outros, neste caso o Estado, quiserem dele; só não admite que o silenciem, daí a repetição constante dessa espécie de grito de repúdio: “Poeta castrado não!”.
Ao longo do poema, faz-se referência a todo o tipo de situações impostas que o poeta parece disposto a assumir, numa ampla enumeração aparentemente caótica dada a falta de pontuação que permite ir associando os vários termos para a construção de um todo: ele não se importa de ser “cabeçudo”, “malabarista”, “publicitário”, “falso médico”, “prostituta”, só não abdica da sua voz para revelar todas as atrocidades cometidas pelo regime e pelos homens. Por isso mesmo, salienta que o que escreve tem de ser entendido, no entanto sabe que nem todos estão aptos a descodificar as suas palavras: só “Os que entendem como eu”.
Será esse círculo de eleitos que detetará a “ternura”, a “saudade”, a “alegria”, a “coragem serena”, a renúncia da poesia feita em prol do regime e que “nos envenena”. Ao pretender distanciar-se daqueles que omitem a realidade, o poeta enumera as situações que merecem que ele não se cale, recorrendo a uma sucessão de perguntas retóricas que enfatizam a indiferença com que a população encara esses acontecimentos: as crianças mortas na guerra, o uso das bombas atómicas, a discriminação, entre muitas outras situações. Decorrente dessa posição, conclui que a poesia não é algo meramente fonético; a sua função não é ser apenas uma sucessão de sons sem sentido, é através de cada verso e da sua força que o poeta mostra “o reverso” das situações idealizadas pelo poder instituído com o intuito de camuflar as vicissitudes de um qualquer regime político, é através das palavras que ele torna audível a sua repugnância pelas circunstâncias que o envolvem e são o instrumento deixado à sua disposição para denunciar, desmascarar a hipocrisia generalizada incentivada pelo aparelho de Estado.
O poeta constata, assim, que toda a palavra escrita tem que ser interpretada. Para que esse processo ocorra é necessário que o leitor seja capaz de estabelecer um diálogo com o texto e descobrir, realmente, o que essa sucessão de sons pretende significar […].
Se autores como Sidónio Muralha, Manuel Alegre e Ary dos Santos optaram por incluir nos seus textos as críticas a uma situação adversa à criação poética, outros autores procuraram veicular essa repulsa pelos valores e situações instituídas pelo sistema de forma implícita, exigindo uma maior colaboração do leitor nessa interpretação dos textos.
                 
Portugal sob a égide da ditadura: o rosto metamorfoseado das palavrasTese de mestrado de Paula Fernanda da Silva Morais. Universidade do Minho – Instituto de Letras e Ciências Humanas, julho de 2005.
           
           
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 Poesia útil e literatura de resistência” (A literatura como arma contra a ditadura e a guerra colonial portuguesas), José Carreiro

   
                

[Post original: http://comunidade.sol.pt/blogs/josecarreiro/archive/2013/08/08/poeta.castrado.nao.aspx]