“Registo de Adolfo [Correia] Rocha, de pseudónimo Miguel Torga”
pertencente ao fundo “PIDE” do Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
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Ar livre, que não respiro!
Ou são pela asfixia?
Miséria de cobardia
Que não arromba a janela
Da sala onde a fantasia
Estiola e fica amarela!
Ar livre, digo-vos eu!
Ou estamos nalgum museu
De manequins de cartão?
Abaixo! E ninguém se importe!
Antes o caos que a morte...
De par em par, pois então?!
Ar livre! Correntes de ar
Por toda a casa empestada!
(Vendavais na terra inteira,
A própria dor arejada,
- E nós nesta borralheira
De estufa calafetada!)
Ar livre! Que ninguém canta
Com a corda na garganta,
Tolhido da inspiração!
Ar livre, como se tem
Fora do ventre da mãe
Desligado do cordão!
Ar livre, sem restrições!
Ou há pulmões,
Ou não há!
Fechem as outras riquezas,
Mas tenham fartas as mesas
Do ar que a vida nos dá!
Texto
de apoio 3: verbete sobre Cântico do Homem, de Miguel Torga
Cântico do Homem corresponde, no conjunto da obra poética de Miguel Torga, a
uma das coletâneas onde mais nítida se ouve a razão histórica que
dita a revolta de um autor que, inflexível na resistência contra tudo o que representasse
cerceamento da liberdade humana,
vinha sofrendo, sobretudo desde a segunda metade da década de 40, sucessivas
repressões à sua liberdade pessoal, profissional e literária. O conjunto de
significados levantados quer pelo "cântico", consubstanciado
lexicalmente pelo "canto" ou pelo "grito" e,
estilisticamente, por um tom predominantemente exclamativo, quer pela
qualificação como sendo "do homem", isto é, não de um eu individual,
mas de um eu que se faz voz da humanidade, convertem este volume numa das mais
pungentes reflexões do homem do pós-guerra que não se reconhece no espelho de
homem, "corpo e alma da degradação", que um contexto histórico
desproveu de qualquer humanismo e cuja imagem "flutua / Na podridão dos
charcos luarentos!". Ao mesmo tempo, o "homem" anunciado pelo
título remete para um arquetípico "Ecce
Homo", que recebeu as
dores do mundo para o redimir, e à imagem do qual o poeta também suplica uma
coroa de "espinhos", "Cilícios vegetais / sobre a fronte de quem
/ sobre a fronte de quem / Tem nojo das carícias do presente". Composições
como "Ar Livre" ou "Dies Irae" permitem uma leitura como
denúncia política, comparecendo como documento histórico da revolta contra o
cerco levantado, nesses anos, em torno do país e de cada homem -
significativamente aquela segunda composição será escolhida para figurar na
folha antológica do 5.º fascículo de Notícias do Bloqueio. Como contraponto de
um desespero tanto mais intenso quanto é plasmado em formas comedidas, resta o
apelo à fraternidade e à "temeridade", e, sobretudo, o arrimo de
"homem natural" de que se nutre para proclamar uma ilimitada
confiança na vida.
Porto Editora – Cântico do Homem na Infopédia [em
linha]. Porto: Porto Editora. [consult. 2023-04-02]. Disponível em https://www.infopedia.pt/$cantico-do-homem
***
Texto de apoio 4: Lendo Miguel Torga
Onde
Miguel Torga desembestou1 mais furiosamente foi contra a política
salazarista. Prova disso é o poema Cântico do Homem, as prisões nos aljubes2
da PIDE3 e o embargo de algumas obras. (…)
A
escalada dos grandes fascismos europeus coincidiu com a maturidade física e intelectual
de Miguel Torga. Mussolini marchava sobre Roma, bombardeara a Abissínia e, mais
tarde, atacara a França pelas costas, para comprazer ao parceiro, Adolfo
Hitler. Implantada no coração da Europa, a «pata rugosa» do nazismo hitleriano
ia atirar o mundo para os horrores da Segunda Guerra Mundial. Franco, disposto
a fuzilar meia Espanha, se tanto fosse necessário, fuzilava e decapitava
«rojos»4 em série. Em Portugal, Salazar, que, para Torga, era um
homem dotado do «conhecimento satânico do preço dos homens», transforma-se, aos
olhos do poeta do Diário, num enorme «pulmão de aço» pelo
qual obrigava todo o país a respirar.
Foi
nesta data que Torga se meteu a viajar pelo Velho Mundo. O resultado dessa
viagem foi o seu primeiro livro em prosa, O Quarto Dia da Criação do Mundo. Um alarme aos homens do seu
tempo e um violento desafio a todos os que reputava seus tiranos. Imediatamente
preso pela PIDE, foi encarcerado no Aljube5.
Ainda
em França, e antes desta prisão, fora convidado a exilar-se. Mas, se Torga diz
que «ser escritor em Portugal é como estar dentro dum túmulo a garatujar na
tampa», pensa também que «é preciso pagar a liberdade». E a liberdade estava em
Portugal! No estrangeiro, perde-se o que é nosso e não se adquire o alheio… (…)
Torga
tem consciência de que, apesar da bruteza ingénita6 do meio em que
nasceu e dos trambolhões que pela vida levou, foi privilegiado em relação aos
seus conterrâneos. «Dos meus companheiros de classe, alguns finos como corais,
poucos assinam hoje o nome. A mão moldou-se de tal maneira à enxada, foi tanta
a negrura e a fome que os rodeou, que esqueceram de todo que havia letras e
pensamento». Valeu a pena lutar!
António Freire, Lendo Miguel Torga, Porto, Edições Salesianas, 1990
____________
1
desembestou: reagiu com violência.
2 aljubes: prisões subterrâneas, cárceres.
3 PIDE: Polícia Internacional e de
Defesa do Estado.
4 «rojos»: vermelhos; nome aplicado, em
Espanha, a militantes de partidos de esquerda, nomeadamente aos comunistas.
5 Aljube: prisão, em Lisboa, onde ficavam
os presos que estavam a ser interrogados na sede da PIDE.
6 ingénita: que nasceu com o indivíduo;
inata.
Questionário sobre o texto de António
Freire
Selecione,
em cada um dos itens de 1 a 7, a única alternativa que permite obter uma
afirmação adequada ao sentido do texto.
Escreva,
na folha de respostas, o número
de
cada item, seguido da letra
que
identifica a alternativa correta.
1. A
utilização das expressões «‘conhecimento satânico do preço dos homens’» (linha
10) e «‘pulmão de aço’» (linha 11) constitui, da parte de Torga, uma
(A)
crítica
severa à atuação de Salazar.
(B)
análise
neutra da política salazarista.
(C)
censura
suave ao papel de Salazar.
(D)
reflexão
objetiva sobre a governação salazarista.
2. A
obra de Torga, «O
Quarto Dia da Criação do Mundo»
(linha 14), constitui um
(A)
elogio
aos seus compatriotas.
(B)
desabafo
dirigido ao povo.
(C)
alerta
aos seus contemporâneos.
(D)
apelo
dirigido aos governantes.
3. A
expressão «‘finos como corais’» (linha 23) significa
(A)
magros,
esguios.
(B)
inteligentes,
perspicazes.
(C)
ativos,
diligentes.
(D)
polidos,
educados.
4. Os
elementos textuais «Miguel Torga» (linha 1), «Miguel Torga» (linha 5), «Torga»
(linha 10), «poeta do Diário» (linha 11), «Torga» (linha 13),
«Torga» (linha 17) e «Torga» (linha 21) asseguram a coesão
(A)
lexical.
(B)
frásica.
(C)
temporal.
(D)
interfrásica.
5. Em
«para comprazer ao parceiro, Adolfo Hitler.» (linha 6), o constituinte «ao
parceiro» desempenha a função de
(A)
sujeito.
(B)
complemento
direto.
(C)
vocativo.
(D)
complemento
indireto.
6. Em
«homens do seu tempo» (linhas 14 e 15), o referente de «seu» é
(A)
«Torga»
(linha 13).
(B)
«Velho
Mundo» (linha 13).
(C)
«resultado»
(linha 13).
(D)
«primeiro
livro» (linha 14).
7. Em
«‘que esqueceram de todo’» (linhas 24 e 25), a conjunção «‘que’» estabelece uma
relação de
(A)
substituição.
(B)
retoma.
(C)
consequência.
(D)
comparação.
8. Faça
corresponder a cada segmento textual da coluna A um único segmento textual da
coluna B, de modo a obter uma afirmação
adequada ao sentido do texto.
Escreva, na folha de respostas, o número do item e os números que identificam os cinco segmentos textuais da coluna A, cada um destes seguido da alínea da coluna B que lhe corresponde.
A |
|
B |
1) Com a expressão «para
comprazer» (linha 6), 2) Com «se tanto fosse necessário»
(linhas 8 e 9), 3) Com a frase
«fora convidado a exilar-se.» (linha 17), 4) Com o uso de
«também» (linha 19), 5) Com «Valeu a
pena lutar!» (linha 25), |
a) o enunciador
estabelece uma conexão aditiva. b) o enunciador
expressa uma posição pessoal. c) o enunciador manifesta o seu
repúdio. d) o enunciador
expõe a consequência da informação dada anteriormente. e) o enunciador indica uma
finalidade f) o enunciador
apresenta o conteúdo da frase como uma possibilidade. g) o enunciador
refere uma ação passada que precede uma outra também passada. h) o enunciador
faz uma declaração. |
Chave de correção:
1.
(A); 2. (C); 3. (B); 4. (A); 5. (D); 6. (A); 7. (C).
8. As correspondências corretas são:
1) e); 2) f); 3) g); 4) a); 5) b).
Fonte: Exame Nacional
do Ensino Secundário n.º 639 (Decreto-Lei n.º 74/2004, de 26 de março). Prova
Escrita de Português - 12.º Ano de Escolaridade. Portugal, Ministério da
Educação/ GAVE-Gabinete de Avaliação Educacional, 2009, 1.ª Fase (Versão 1)
Oficina
de escrita: texto expositivo-argumentativo
Elabore uma reflexão sobre o significado da
liberdade, partindo da perspetiva exposta no excerto a seguir transcrito.
Fundamente o seu ponto de vista recorrendo, no
mínimo, a dois argumentos e ilustre cada um deles com, pelo menos, um exemplo
significativo.
Escreva um texto, devidamente estruturado, de
duzentas a trezentas palavras.
«A liberdade é, antes de mais nada, o respeito pelos outros e o
respeito que os outros nos devem em função dos nossos direitos. A liberdade é a
combinação entre os direitos e os deveres, sem que cada um invada o espaço que,
por direito, pertence aos outros.»
José Jorge Letria, O 25 de Abril Contado às Crianças… e aos
Outros, Lisboa, Terramar, 1999
Fonte: Exame Nacional
do Ensino Secundário n.º 639 (Decreto-Lei n.º 74/2004, de 26 de março). Prova
Escrita de Português - 12.º Ano de Escolaridade. Portugal, Ministério da
Educação/ GAVE-Gabinete de Avaliação Educacional, 2009, 1.ª Fase
Proposta
de correção:
A
liberdade é um conceito que assume grande variedade de sentidos entre os
diversos autores que se ocuparam do tema, sendo difícil atribuir um significado
consensual, mesmo nos seus elementos fundamentais³. No entanto, o excerto
transcrito parece sugerir que a liberdade é a combinação entre os direitos e os
deveres, sem que cada um invada o espaço que, por direito, pertence aos
outros¹.
Assim, a
liberdade pode ser vista como uma condição ou característica de quem é livre e
tem o direito ou a faculdade de fazer escolhas de acordo com a sua própria
vontade, sem restrições ou impedimentos¹. A liberdade deve respeitar os limites
legais e não prejudicar ninguém¹.
Um
exemplo significativo pode ser o direito à liberdade de expressão. Este direito
é fundamental para a democracia e para o desenvolvimento humano. No entanto,
este direito não é absoluto e deve ser exercido com responsabilidade e respeito
pelos outros². Outro exemplo pode ser o direito à privacidade. Este direito é
importante para proteger a dignidade humana e a intimidade pessoal. No entanto,
este direito também não é absoluto e deve ser equilibrado com outros valores
como a segurança pública e a justiça².
(1) Liberdade – Wikipédia, a enciclopédia livre.
https://pt.wikipedia.org/wiki/Liberdade Acedido 02/04/2023.
(2) Liberdade: o que é, significado e conceito.
https://www.significadofacil.com/liberdade/ Acedido 02/04/2023.
(3) Liberdade: o que é, significado e tipos - Significados. https://www.significados.com.br/liberdade/
Acedido 02/04/2023.
(4) liberdade |
Dicionário Infopédia da Língua Portuguesa.
https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/liberdade Acedido
02/04/2023.
Fonte: conversação
com o Bing, 02/04/2023
***
Outra proposta de correção:
A
liberdade é um conceito fundamental para a existência e a convivência humana.
José Jorge Letria, no seu livro O 25 de Abril Contado às Crianças... e aos
Outros, apresenta uma perspetiva interessante sobre o significado da
liberdade. Segundo o autor, a liberdade deve ser entendida como o respeito
pelos outros e pelos nossos direitos, bem como o respeito que os outros nos
devem. A liberdade é, portanto, a combinação entre os direitos e os deveres,
sem que cada um invada o espaço que, por direito, pertence aos outros.
Um
primeiro argumento que podemos apresentar em defesa desta perspetiva é que a
liberdade não pode ser entendida como um direito absoluto. É necessário que
haja limites e restrições ao exercício da liberdade, para que ela não
prejudique ou viole os direitos dos outros. Por exemplo, a liberdade de
expressão não pode ser usada para disseminar discurso de ódio ou para difamar
outras pessoas.
Outro
argumento importante é que a liberdade não deve ser vista apenas como um
direito, mas também como um dever. Isso significa que, ao exercer a nossa
liberdade, devemos ter em mente as consequências das nossas ações e agir com
responsabilidade. Por exemplo, o direito à livre circulação implica o dever de
respeitar as regras de trânsito e de não colocar em risco a vida dos outros.
Em suma,
a liberdade deve ser entendida como uma combinação entre os direitos e os
deveres, respeitando o espaço que, por direito, pertence aos outros. Para
garantir a convivência em sociedade, é fundamental que a liberdade seja
exercida com responsabilidade e com respeito pelos direitos dos outros.
Fonte: conversação
com o https://chat.openai.com/chat, 02/04/2023
***
Mais uma proposta de correção:
A
liberdade é um tema fundamental na sociedade contemporânea. Para José Jorge
Letria, a liberdade é baseada no respeito pelos outros e no respeito pelos
nossos próprios direitos. É importante ressaltar que a liberdade não pode ser
confundida com a ausência de limites e regras. Pelo contrário, a liberdade é
alcançada por meio do equilíbrio entre os nossos direitos e deveres, sem
infringir os direitos dos outros.
Um dos
argumentos que sustentam esta perspetiva é que a liberdade não pode ser
considerada um direito absoluto. Isto é, a liberdade individual não pode ser
desprovida de limites que garantam o bem-estar e os direitos dos outros. Por
exemplo, a liberdade de expressão não pode ser usada para difamar ou insultar
outras pessoas. Este tipo de comportamento é considerado abuso de liberdade,
pois viola o direito dos outros à dignidade e à honra. Assim, a liberdade não
pode ser utilizada como um pretexto para prejudicar os outros.
Outro
argumento é que a liberdade só pode ser verdadeiramente alcançada quando há
responsabilidade e respeito pelas leis. A liberdade não é sinônimo de anarquia.
As leis e os regulamentos são essenciais para garantir o bem-estar da sociedade
como um todo. Por exemplo, as leis de trânsito estabelecem regras para garantir
a segurança na estrada. Se todos os motoristas seguirem essas regras, eles
terão a liberdade de dirigir com segurança. Mas, se alguns motoristas decidirem
não respeitar as regras, a liberdade de todos os outros será comprometida.
Em suma,
a liberdade é um conceito complexo e multifacetado. Como afirmado por José
Jorge Letria, a liberdade é baseada no respeito pelos outros e pelo nosso
próprio direito. A liberdade só pode ser verdadeiramente alcançada quando há
responsabilidade e respeito pelas leis. Quando equilibrada com responsabilidade
e respeito pelos direitos dos outros, a liberdade pode ser um poderoso agente
de mudança social e progresso humano.
Fonte: conversação
com o https://chat.openai.com/chat, 02/04/2023
► A poética torguiana - Apresentação crítica,
seleção, notas e sugestões para análise literária da poesia de Miguel Torga,
por José Carreiro. In: https://folhadepoesia.blogspot.com/2018/04/a-poetica-torguiana.html,
09-08-2013
► “Poesia útil e literatura de resistência” (A literatura como arma contra a ditadura e a guerra colonial portuguesas), José Carreiro
CARREIRO, José. “AR LIVRE
(Miguel Torga)”. Portugal, Folha de Poesia, 09-08-2013 (Última atualização:
02-04-2023). Disponível em: https://folhadepoesia.blogspot.com/2013/08/ar-livre-miguel-torga.html
(Post original:
http://comunidade.sol.pt/blogs/josecarreiro/archive/2013/08/09/miguel.torga.ar.livre.aspx)
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