CRIAÇÃO VELHAIMovem-se quilhas pelas ribanceirasos putos elevam areias, brincam com os forcadose por guloseimas trocam as fisgas.No caminho vertem, sacodem as ancas as raparigas.Colhem olhares, ditos e manguitos que se fazem entre os rapazes.Soletram-se as carnes com gestos desajeitados.Nos quintais há o odor a rosmaninho,uma emanação volátil dos corpos.Passo os dias sem mais nadaapenas um ligeiro cuspir nas mãos antes de pegar na enxada.Aguardo que o boi tresmalhado se erga e desfigure em gente.Pareço estar separado dos ritos dos mitose das estações.O que eu sei.Perla ou imago pode o limo parecer.Por vezes repelidos do chão em ardênciarevivemos os lastros diasimensos desejos.Por vezes sonhamose não fazendo disso um árduo sentidolevamos horas infindas a lavar a escoroarlevamos e trazemos e desculpamos as vociferias.Aqui faz sentido agora a toda a horana nossa pressa e genteso bafio dos sótãosa palha quente nas arribanas.II– É aqui que a gente passa o tempocordialmente e sem muito o que fazeré aqui que a gente ri muito muito desmesuradamenteah a gente ri, faz festas, tudo é assimmuito cordialmenteé assim que a gente gostaleva o nosso homem para casa efaz muito amor muitoé assim que a gente gosta.Virgínia deu seu seioVirgínia sofre por sumaaquela boca imaculada impoluta.Ó ribeiro manso.Ali, mesmo junto às pedras,aquecidas as mãos pousadas sob o dorso, o campo rigoroso.Na metalurgia antiga, a liga, a obra fundida interminadacobre sem que se possam separar o metal e o fel.No lugar da Criação Velhaa mulher do ferreiro não diz as antigas lendas.Se a mulher terminar na montanha a liga, o lugar no casalé porque se deu a união no forno no cadinho do ferreiro e dela.
In Arraianos nºVII. A vida nas aldeasSantiago de Compostela, Alvarellos Editora, Janeiro 2008, p. 123.
CARREIRO, José. “Criação Velha”.
Portugal, Folha de Poesia: artes, ideias e o sentimento de si, 11-10-2007. Disponível em: https://folhadepoesia.blogspot.com/2007/10/criacao-velha.html
(2.ª edição) (1.ª edição: http://comunidade.sol.pt/blogs/josecarreiro/archive/2007/10/11/lugares1.aspx)
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