Virginia — por T. S. Eliot
Rio barrento, rio barrento,
o seu curso lento e quente é o silêncio.
Não há desejo mais calmo do que a calma
de um rio. Mover-se-á o calor
apenas no canto do mimo
uma vez ouvido? Os montes ainda
aguardam. Os portões aguardam. As árvores púrpura,
as árvores brancas, aguardam, aguardam,
a demora, o declínio. Vivendo, vivendo
sem se moverem. Pensamentos firmes
sempre em movimento comigo chegaram
e comigo partirão:
rio, rio, rio barrento.
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Virginia — by T. S. Eliot
Red river, red river,
Slow flow heat is silence
No will is still as a river
Still. Will heat move
Only through the mocking-bird
Heard once? Still hills
Wait. Gates wait. Purple trees,
White trees, wait, wait,
Delay, decay. Living, living,
Never moving. Ever moving
Iron thoughts came with me
And go with me:
Red river, river, river.
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Depoimento do poeta britânico Ted Hughes sobre este poema de T. S. Eliot. O poema chama-se “Virginia”, um dos Estados do sul profundo norte-americano.
Se sentem este poema como eu, certamente terão ficado impressionados com a forma viva e intensa como nos refere um lugar. Ocorre-nos até pensar que podemos pintar esse lugar. E contudo, que há de descrição no poema? As árvores púrpura estarão perto das árvores brancas? Os portões serão de jardim ou existirão no campo? E haverá casas? As árvores estão junto ao rio? Nos montes? O poema não o diz. Como pode, então, criar uma imagem tão forte? Fá-lo por conseguir transmitir um sentir vivo e intenso. O que o poema, de facto, descreve é a lentidão dominada pela calma, o tempo em suspensão, o calor, a aridez, a exaustão, num tom que sugere a iminência de um perigo opressivo, como uma tarde muito quente antes dos trovões e dos relâmpagos, um dia indolente no sul profundo. Tudo está contido no lento desenrolar progressivo das frases. Talvez a melhor maneira de captar o sentido seja pensar nele como se as palavras fossem enunciadas pelo próprio rio, descrevendo o seu avanço por entre as terras entorpecidas de calor. Os montes, os portões, as árvores brancas, as árvores púrpura, passam sobre o rio, movendo-se mas continuando no seu sítio, como se fossem reflexos à superfície da qual ele vai avançando lentamente.
… Vivendo, vivendo
sem se moverem. Pensamentos firmes
sempre em movimento comigo chegaram
e comigo partirão: ...
Ted Hughes, O FAZER DA POESIA
traduções de Helder Moura Pereira
Lisboa, Assírio & Alvim, 2002, pp. 106-108
“T. S. Eliot lido por Ted
Hughes” in Folha de Poesia, José Carreiro. Portugal, 26-08-2008. Disponível em: https://folhadepoesia.blogspot.com/2008/08/t-s-eliot-lido-por-ted-hughes.html
(2.ª edição). (1.ª edição: http://comunidade.sol.pt/blogs/josecarreiro/archive/2008/08/26/eliot.aspx)
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