"Invisível/Visível", por Vhils. Mural sobre Camilo Pessanha, no Jardim do Consulado de Portugal em Macau, 2016-12-09.
Além de homenagear a obra do poeta português que viveu mais de 30 anos em Macau, a peça visa também fazer uma reflexão sobre a presença de Portugal nesta parte do mundo e o próprio contributo de Pessanha enquanto poeta, escritor e até juiz. Mas também sobre a natureza única deste longo relacionamento entre Portugal e a China e aquilo que continua a fazer deste território um lugar tão especial.
Besides paying tribute to the oeuvre of the Portuguese poet who lived over 30 years in Macau, the piece also aims to reflect on Portugal's presence in this corner of the world and Pessanha's own contribution as poet, writer and even as judge, but also on the unique nature of this long relationship between Portugal and China and what remains so special about this territory.
O artista Alexandre Farto, mais conhecido como Vhils, inaugurou esta sexta-feira, 09-12-2016, um mural com uma imagem do poeta Camilo Pessanha, no jardim do Consulado de Portugal em Macau, cidade onde o poeta viveu e morreu.
“Conheço parte da obra dele e foi uma pessoa relevante para a história de Macau, mas a ideia aqui não é fazer julgamentos de história, nem de nada. O nome da peça é ‘Invisível, Visível’ e a ideia destas obras, que fazem sempre uma ligação com a história local, é tornar essa história que muitas vezes está invisível, visível, sem julgamentos. É basicamente expor a história e gerar a discussão em relação à pessoa e à obra”, disse Vhils à agência Lusa.
O artista disse que “o trabalho de pesquisa”, para fazer um mural em Macau, “foi intenso e levou algum tempo”, mas a conclusão foi que, “com a obra e a relevância que ele [Pessanha] tinha para a história de Macau, era a pessoa certa”, agradecendo o apoio da Casa de Portugal e do Consulado-geral de Portugal em Macau, neste projeto.
Vhils explicou que, para fazer o mural, “a imagem é trabalhada, é feito um desenho, é feita uma divisão de cores desse desenho e, depois, são pintados na parede esses diferentes tons e, dependendo do tom e da própria parede, dos diferentes tons que vai tendo, cada tom vai a uma profundidade mais funda e a outra mais superficial, e é jogar com estas camadas que o muro tem que, no final, revelam e fazem um rosto”. “É quase uma escultura no final, mas a partir de uma imagem”, afirmou.
No mês passado, Vhils fez um mural com José Saramago, em Madrid, e disse agora à agência Lusa que “é possível” que surjam outros trabalhos seus com escritores portugueses: “Depende dos projetos e depende muito das situações. Este é um projeto específico que tenho estado a trabalhar, que tem muito a ver com a literatura, também com a relevância de alguns poetas e escritores portugueses, mas sim, é possível”.
O mural de Macau resultou de uma parceria entre a Casa de Portugal em Macau e o Consulado-geral de Portugal, em Macau e Hong Kong.
Na inauguração, a presidente da Casa de Portugal, Amélia António, disse que este é “um marco no trabalho de divulgação da cultura portuguesa e dos artistas portugueses” da Casa de Portugal em Macau, que este ano comemora 15 anos, e manifestou especial satisfação por poder, neste aniversário, “entregar à cidade, aos residentes, aos turistas” uma obra de Vhils, que “tem tudo a ver” com Macau.
O cônsul-geral, Vítor Sereno, destacou que esta é a primeira obra em Macau e, numa representação diplomática portuguesa de Vhils, “um dos nomes mais aclamados do panorama da arte urbana mundial”.
“Devemos e podemos ficar felizes sabendo que a República Popular da China é presentemente um dos grandes investidores em Portugal em termos económicos, mas não nos podemos esquecer de outras valências como é o caso da cultura, em que a diplomacia tem um papel fundamental a desempenhar (…), e de outras vertentes que nos permitem construir as chamadas pontes reais de afeto”, afirmou.
“Através do génio de Vhils e da imortalidade de Pessanha, estamos a celebrar Portugal a dez mil quilómetros de distância e a cimentar os laços seculares portugueses com os nossos amigos da Região Administrativa Especial de Macau e da República Popular da China”, acrescentou.
Na inauguração estiveram também dois trinetos de Pessanha, Vítor e Filomeno Jorge, que se disseram “apanhados de surpresa” com a homenagem ao poeta, que morreu há 90 anos.
“Fiquei até bastante comovido”, disse Vítor Jorge à Lusa, enquanto Filomeno falou “num dia de alegrias”. Os dois consideraram que o mural é “uma obra magnífica” e que a imagem é “igualzinha” à de uma fotografia do trisavô.
Vítor Jorge acrescentou que esta foi a primeira homenagem ao trisavô a que assistiu na vida, e considerou-a “justa”, lembrando que um grupo de personalidades em Portugal queria levar os restos mortais de Pessanha para o Panteão Nacional, em Lisboa.
No entanto, a mãe, Ana Jorge, bisneta de Camilo Pessanha que hoje tem 84 anos, opôs-se. “Para mim, era uma honra, mas a minha mãe recusou. Tentei convencê-la muitas vezes, mas não consegui, paciência. Ela é muito oriental, muito supersticiosa e não quer que ninguém mexa na campa”, explicou.
O Simbolismo fez aliança com a música, passou à exploração do inconsciente por meio de símbolos e sugestões, preferindo o mundo subjetivo ao objetivo, o invisível ao visível, buscando a compreensão da vida por meio da intuição e do irracional, explorando a realidade situada além do real e da razão.
A leitura da poesia simbolista exige esforço de penetração, dada à opacidade dos seus significados. Em lugar da expressão direta, incapaz de captar as essências internas e os sentimentos mais intimamente pessoais, o Simbolismo usava processos indiretos, associações de idéias, representadas por metáforas e símbolos, além de buscar efeitos sonoros nos elementos musicais, tonais e rítmicos, aos quais se somavam os efeitos das cores.
Autógrafo pertencente a Carlos Amaro, atualmente perdido.
Publicações anteriores à segunda edição de Clepsidra:
Seara Nova, (de 24 de Agosto de 1940), com a indicação "Um inédito de Camilo Pessanha".
Cimetière du Père-Lachaise (foto de José Carreiro, 07-06-2014)
Em «Porque o melhor, enfim, / É não ouvir nem ver... / Passarem sobre mim / E nada me doer! / ‑ Sorrindo interiormente, / Co'as pálpebras cerradas, / As águas da torrente / Já tão longe passadas.» ‑ é bem evidente o seu desencanto e até desespero face à vida que ama e que lhe foge, que o reduzirá ao nada, traduzido com despeito, realçando o negativismo dessa mesma vida que já o não atinge «Debaixo de uma pedra», mas que, mesmo assim, lhe dói o tê-la perdido e por isso o sentir-se morto antes de o ser, por um lado é o grito do inconformismo com o seu destino de mortal, por outro, um prenúncio de esperança no otimismo mais ou menos verdadeiro, nessa etapa desconhecida.
Lilás Carriço, Literatura Prática 11º Ano. Porto, Porto Editora, 1986 (4ª ed.) (1ª ed. 1977), p. 348
Cimetière du Père-Lachaise (foto de José Carreiro, 07-06-2014)
Se há tensão entre a transitoriedade do mundo e o desejo de fixação, a morte despontará também, nos versos de Pessanha, como o único modo de manter-se fora da ação corrosiva do tempo, uma vez que ela é a própria anulação do tempo. Mas a morte não poderá jamais ser um lugar de chegada efetiva, ela é uma promessa que não se cumpre, um horizonte imaginado e almejado, mas não verdadeiramente atingido. A famosa (e impossível) síntese que Pessoa tão bem expressou nos versos da Ceifeira – “ter a tua alegre inconsciência / e a consciência disso” (PESSOA, 1986, p. 144) – é como um sonho de morte também revelado por Pessanha:
Porque o melhor, enfim, É não ouvir nem ver... Passarem sobre mim E nada me doer! [...]
Roubos, assassinatos! Horas jamais tranqüilas, Em brutos pugilatos Fracturam-se as maxilas...
E eu sob a terra firme, Compacta, recalcada, Muito quietinho. A rir-me De não me doer nada.”
O que causa estranheza nesses versos é que o espaço da morte é por demais familiar, e não uma pura ausência de sensações; donde se conclui que não é possível dizer a morte, já que ela vem contaminada com algo da vida. Por isso a morte não pode libertar-se de seu estatuto de promessa; ela é, paradoxalmente (ao menos nos versos de Pessanha), o lugar da própria eternidade, mas de uma eternidade impossível de atingir. A poesia de Pessanha inscreve-se, portanto, nessa tensão entre um desejo de apagamento e a constatação de sua impossibilidade, o que evidencia que a linguagem é incapaz de uma auto-anulação, ela sempre fala demais, fala além do desejado. Ou melhor, a linguagem fala sempre demais ou de menos; por um lado é excessiva, por outro, insuficiente.
É esse caráter sempre falhado que remete a uma compreensão da linguagem enquanto alegoria que procuro assinalar aqui, isto é, uma forma de significação sempre marcada pela arbitrariedade, incapaz de alcançar um sentido último e verdadeiro, ao contrário do símbolo, que revelaria um ideal de plenitude e totalidade.
In: O MARRARE - Periódico do Setor de Literatura Portuguesa da UERJ, Número 7 (2006) - ISSN 1981-870X
Cimetière du Père-Lachaise (foto de José Carreiro, 07-06-2014)
[Em] “Porque o melhor, enfim,/ É não ouvir nem ver…”, […] o anseio maior do poeta é por estar morto e enterrado, sem sentir nada, indiferente ao que se passa do lado de fora da tumba. O ideal de felicidade é […] negativo: "
E eu sob a terra firme, [...] Muito quietinho. A rir-me De não me doer nada.
Como podemos perceber, […] a felicidade provém da supressão dos motivos da dor, da eliminação da vulnerabilidade do sujeito. Não é algo positivo, que se obtenha pelo esforço ou pela sorte. Não é satisfação. Pelo contrário, é uma condição negativa.