quinta-feira, 21 de julho de 2022

O vagabundo do mar, Manuel da Fonseca

Ilustração de "O vagabundo do mar", por Sónia Oliveira (in Contos & Recontos 7, 2011)

 

O VAGABUNDO DO MAR

 

Sou barco de vela e remo

sou vagabundo1 do mar.

Não tenho escala2 marcada

nem hora para chegar:

é tudo conforme o vento,

tudo conforme a maré...

Muitas vezes acontece

largar o rumo tomado

da praia para onde ia...

Foi o vento que virou?

foi o mar que enraiveceu

e não há porto de abrigo?

ou foi a minha vontade

de vagabundo do mar?

Sei lá.

Fosse o que fosse

não tenho rota marcada

ando ao sabor da maré.

É por isso, meus amigos,

que a tempestade da Vida

me apanhou no alto mar.

E agora

queira ou não queira,

cara alegre e braço forte:

estou no meu posto a lutar!

Se for ao fundo acabou-se.

Estas coisas acontecem

aos vagabundos do mar.

 

Manuel da Fonseca, Rosa dos Ventos. Lisboa, ed. do autor, 1940

 



 

Vocabulário:

1. vagabundo: nómada, que está em permanente deslocação.

2. escala: porto de embarque e desembarque.

 

Texto de apoio:

O poema “O vagabundo do mar”, de Manuel da Fonseca, mostra o barco de vela e remo, no papel de protagonista, sem rumo delineado, navegando ao sabor das marés, sujeito aos ventos e aos perigos. Apanhado pela “tempestade” da vida, resiste estoicamente, sem abandonar o seu posto. Neste caso, a embarcação é sinónima de evasão, de fuga, de encontro de um destino superior, no entanto, o texto de Manuel da Fonseca mostra a luta e a resistência como fatores determinantes da vida de um “vagabundo do mar”, que não obedece às leis dos homens, prevalecendo as leis da natureza, (o vento, a maré) numa atitude de algum desprendimento e cumplicidade com um destinatário, visível na apóstrofe “Meus amigos”, de acento popular. Este chamamento acentua a relação de fraternidade numa jornada de luta e incerteza, manifestando uma possível ligação entre a estética neorrealista e a tónica numa escrita comprometida socialmente, a que não parece alheia a necessidade de resistir às adversidades. Este motivo volta a surgir noutros poemas do autor: “Amigo / tu que choras uma angústia qualquer / e falas de coisas mansas como o luar / e paradas / como as águas de um lago adormecido / acorda!”. (1984: 152) 

A poesia e alguns dos seus caminhos: uma perspetiva comparatista para a formação de leitores na aula de português língua materna, Maria Mestre. Lisboa: Universidade Aberta, 2015.



I - Para responder a cada item, seleciona a opção que melhor completa o sentido do poema "O vagabundo do mar", de Manuel da Fonseca.

1. A identificação do sujeito poético com um «barco de vela e remo» sugere a sua

(A) condição de marinheiro aventureiro.

(B) consciência das fragilidades da vida humana.

(C) caraterização como vagabundo, indivíduo ocioso.

 

2. O interlocutor do «eu» surge no poema identificado na expressão

(A) «o vento» (linha 10).

(B) «o mar» (linha 11).

(C) «meus amigos» (linha 19).

 

3. As interrogações presentes no poema realçam

(A) a necessidade de o sujeito poético interpelar alguém.

(B) as dúvidas de caráter existencialista do sujeito poético.

(C) os perigos da vida marítima.

 

4. O verso «estou no meu posto a lutar!» (linha 25) sugere um sujeito poético

(A) persistente.

(B) desistente.

(C) desiludido.

 

5. A figura de estilo que está na base da construção do poema é

(A) a comparação.

(B) a metáfora.

(C) a imagem.

 

6. No verso «É por isso, meus amigos» (linha 19), a expressão «meus amigos» exerce a função sintática de

(A) sujeito.

(B) complemento direto.

(C) vocativo.

 

Chave de correção: 1. (B) 2. (C) 3. (B) 4. (A) 5. (C) 6. (C)

Fonte: Olimpíadas da Língua Portuguesa. Ensino Secundário. 1.ª Fase. Portugal, Direção-Geral da Educação, 2013-05-09 <https://www.dge.mec.pt/olimpiadas-da-lingua-portuguesa>

 

 

II – Ainda sobre a leitura do poema "O vagabundo do mar", responde, agora, às perguntas que se seguem.

1. Transcreve do poema expressões que comprovem o abandono do sujeito poético às circunstâncias envolventes.

 

2. Caracteriza o sujeito poético tendo em conta a forma como encara a vida e as dificuldades que vão surgindo.

 

Fonte: lição n.º 61 de Português – 7.º e 8.º anos (Projeto #EstudoEmCasa), sobre "O sol é grande, caem co´a calmas as aves", de Sá de Miranda. "O vagabundo do mar", de Manuel da Fonseca, 2021-06-22.

 







 

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Apresentação crítica, seleção, notas e sugestões para análise literária de textos de Manuel da Fonseca, por José Carreiro. In: Folha de Poesia, 2018-05-04, disponível em https://folhadepoesia.blogspot.com/2018/05/manuel-da-fonseca.html

 



CARREIRO, José. “O vagabundo do mar, Manuel da Fonseca”. Portugal, Folha de Poesia, 21-07-2022. Disponível em: https://folhadepoesia.blogspot.com/2022/07/o-vagabundo-do-mar-manuel-da-fonseca.html



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