Sofro,
Lídia, do medo do destino.
A
leve pedra que um momento ergue
As
lisas rodas do meu carro, aterra
Meu coração.
Tudo
quanto me ameace de mudar-me
Para
melhor que seja, odeio e fujo.
Deixem-me
os deuses minha vida sempre
Sem renovar
Meus
dias, mas que um passe e outro passe
Ficando
eu sempre quási o mesmo, indo
Para
a velhice como um dia entra
No anoitecer.
Ricardo Reis, Poesia,
edição de Manuela Parreira da Silva,
Lisboa, Assírio &
Alvim, 2000, p. 181.
Apesar da referência a
«Meu coração» (v. 4), que remete para o campo das emoções, Ricardo Reis assume
uma atitude racional.
Tendo
em conta os seis primeiros versos do poema, explicite em que consiste essa
atitude racional, bem como o motivo que leva o sujeito poético a assumi-la.
Na resposta deve explicitar,
adequadamente, quer em que consiste a atitude racional do sujeito poético, quer
o motivo que o leva a assumi-la.
Devem ser abordados os tópicos seguintes, ou outros igualmente
relevantes:
‒ o sujeito poético evidencia uma atitude racional ao
intelectualizar as suas emoções/ao recusar (voluntariamente) a mudança/ao
procurar a serenidade;
‒ o sujeito poético assume essa atitude racional devido ao
sentimento de terror face à mudança/ao destino, que lhe provoca sofrimento.
Transcreva a comparação presente no final do poema e interprete o seu sentido.
Na resposta transcreve a comparação presente no final do poema,
delimitando-a de forma rigorosa, e interpreta, adequadamente, o seu sentido.
Devem ser abordados os tópicos seguintes, ou outros igualmente
relevantes:
‒ transcrição da comparação – «indo / Para a velhice como um dia
entra / No anoitecer»; ‒ interpretação da comparação – tal como o dia termina lenta e
gradualmente, também o sujeito poético deseja que o tempo passe por ele de forma
impercetível, encaminhando-o tranquilamente para a «velhice» (sem que isso lhe
provoque sofrimento).
Fonte: itens 4 e 5 do grupo I do Exame Final Nacional de Português, Prova 639, 1.ª Fase, Ensino Secundário, 2020, 12.º Ano de Escolaridade (Decreto-Lei n.º 139/2012, de 5 de julho | Decreto-Lei n.º 55/2018, de 6 de julho)
Ricardo
Reis é o poeta da razão, o poeta que, segundo Jacinto Prado Coelho (Diversidade e Unidade em Fernando Pessoa), “é um
homem de ressentimento e cálculo, um homem que se faz como faz laboriosamente o
estilo”, e que, como “experimenta a dor da nossa miséria estrutural, sofre com
as ameaças inelutáveis e permanentes do Fatum, da Velhice e da Morte”, pelo que
“o seu fito é iludir (melhor: eludir) a dor construindo virilmente o próprio
destino no restrito âmbito de liberdade que lhe é dado”.
Onde está
a atitude racional do sujeito poético neste poema? Precisamente na lúcida
análise do que sente e do motivo da atitude que assume: tem consciência do
desagrado (ódio) em relação à mudança e do que faz para a evitar (foge),
tentando não ser afetado por ela.
A
comparação objeto de questionamento no item 5 do Grupo I não oferece nenhuma
dúvida, estando este assunto em consonância com o indicado no programa de
Português como tópico de estudo da poesia deste autor ("Ricardo Reis: a
consciência e a encenação da mortalidade"). Com efeito, o sujeito poético
exprime o desejo de que o tempo passe por ele de forma impercetível, encaminhando-o
tranquilamente para a velhice como a lei natural do passar do tempo, que faz
com que ao dia se siga a noite.
Fonte: Maria Regina Rocha, “A qualidade do exame de
Português do 12.º ano”, https://www.publico.pt/2020/07/13/sociedade/opiniao/qualidade-exame-portugues-12-ano-1924161
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Poesia, 17-05-2018. Disponível em: https://folhadepoesia.blogspot.com/2018/05/fernando-pessoa-13061888-30111935.html
CARREIRO, José. “Sofro,
Lídia, do medo do destino, Ricardo Reis”. Portugal, Folha de Poesia,
07-07-2020. Disponível em: https://folhadepoesia.blogspot.com/2020/07/sofro-lidia-do-medo-do-destino-ricardo.html
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