Herberto Helder em Vale de Figueira, Santarém, anos 1960 (José Carlos Lucas/Casa Museu Frederico de Freitas) |
Herberto Helder como nunca
viu (ou ouviu)
A mais completa exposição sobre o autor madeirense faz
casa no Funchal até meio de Setembro. Oportunidade para (re)visitar Herberto
Helder: a obra e a vida.
Márcio Berenguer PÚBLICO, 18 de Julho de 2019,
12:13
Herberto
Helder – por sobre as águas. A exposição biobibliográfica sobre o poeta madeirense, que
abre as portas esta quinta-feira no Funchal, reúne todas as primeiras edições
do conjunto de cerca de quatro dezenas de títulos em poesia e em prosa da obra
de Herberto, publicadas entre 1958 e 2018.
A mostra, que estará
patente até 18 de Setembro na Casa Museu Frederico de Freitas, revela também
fotografias inéditas de Herberto Helder (1930-2015), e
correspondência particular entre o poeta e alguns nomes maiores da cultura
nacional como Sophia de Mello Breyner, Eduardo Prado Coelho ou Eduardo Lourenço.
Pela primeira vez, destaca
ao PÚBLICO Diana Pimentel, curadora da exposição, estará acessível o conjunto
das cinco entrevistas dadas entre 1959 e 1968 e uma auto-entrevista feita em
1987. “Revelam, de certa forma, como Herberto Helder foi lido e interpelado à época,
dando a possibilidade aos seus leitores de poderem — pela sua própria voz —
compreender a lucidez, o desassombro e a ironia que Herberto Helder sempre teve
no contexto da poesia portuguesa contemporânea.”
Ao longo da exposição
sobre a vida e obra do autor de Os Passos em Volta ou Photomaton
& Vox, são documentadas factos “pouco conhecidos do público em
geral”, como a apreensão, em 1968, do livro Apresentação do
rosto.
“Autobiografia do autor,
que é de índole esquerdista, escrita em linguagem surreal e hermética que como
obra literária não mereceria qualquer reparo se não apresentasse passagens de
grandes obscenidades (…) Nestas condições entendo que é de propor a proibição
de Circular no País para este livro”, lê-se num
relatório da PIDE em Junho de 1968, que integra o acervo da exposição.
Em Herberto Helder – por sobre as águas é “visível
e legível” a forma “activa e dedicada” com que colaborou com inúmeras edições
de antologias, cadernos e revistas literárias entre os anos
50 e 70 do século passado no Funchal, em Lisboa, em Coimbra e em Paris. “É a
travessia, também por sobre as águas, da sua poesia pelas artes plásticas
(pintura, escultura, fotografia) ou pelo cinema, num diálogo tão antigo quanto
actual”, assinala Diana Pimentel, coordenadora do Núcleo de Estudos Herberto
Helder, da Universidade da Madeira, explicando que os visitantes podem aceder a
materiais multimédia: registos áudio de poemas lidos pelo próprio,
documentários, reportagens e adaptações digitais do trabalho do autor.
A exposição, a mais
completa sobre o autor, que cultivou “a ética de um rigoroso silêncio” sobre o
ofício de escrever, é promovida pela Secretaria Regional do Turismo e Cultura,
integrada nas comemorações dos 600 anos do descobrimento da Madeira e do Porto Santo,
e constituiu uma oportunidade de contactar com o projecto artístico inédito de
Filipa Cruz (Até Os Tempos Não Mais Serem
Interditos), que procura pensar a poesia de Herberto Helder
enquanto comentário à materialidade e à imaterialidade.
“O propósito maior desta
exposição talvez seja o de acompanhar os leitores (iniciais ou experientes) da
prosa e da poesia de Herberto Helder pelas inúmeras águas por e sobre as quais
a sua obra se abre, continuamente, e se expande — e expandirá”, resume Diana
Pimentel, admitindo o espanto contínuo ao montar a exposição. “Mesmo que já estudando a sua obra há algum
tempo, ainda me continua a surpreender a intensidade e a potência do seu
trabalho de escrita, o extremo rigor do seu ofício poético (e editorial) e o
modo como a obra de Herberto Helder, em interacção com os seus contemporâneos e
com gerações anteriores e posteriores à sua, se não acomodou — nem está, ainda,
acomodada — a um tempo.”
Herberto Helder e o pintor Carlos Fernandes. Corimba - Luanda, 1971 (Fotografia de Júlio de Saint-Maurice) |
Herberto Helder em Vale de Figueira, Santarém, anos 1960 (José Carlos Lucas) |
Herberto Helder, 1948 |
Herberto Helder, 1941 |
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