1 Quem fala de partir, de despedidas...
2 Quantas vezes parti na minha vida,
3 me despedi de vez de gente e de lugares
4 a que voltei para encontrá-los outros...
5 Nem
contar posso. E às vezes despedir
6 foi
só pisar com vã melancolia
7 as
ruas de cidades onde não deixava
8 ninguém
que me lembrasse. Às vezes foi
9 apenas receber por um relance vago
10 a
imagem de um recanto ou de uma luz
11 iluminando
nevoentos muros...
12 Não
muitos terão tido a vida inteira
13 esta
febre de andar por vários mundos
14 buscando ansioso o nada nosso e deles
15 que ao menos nada finge em gente e coisas...
16 E não terão, portanto, na memória
17 o tanto haver partido para longe,
18 para saberem que se parte sempre,
19 e não se volta nunca. O mesmo amor
20 que fiel aguarda o regressarmos não
21 é o mesmo já, mesmo se mais ardente
22 sob os cabelos que lhe são mais brancos.
Londres, 15/3/1973
Jorge de Sena, Poesia 2, edição de
Jorge Fazenda Lourenço, Lisboa, Guimarães, 2015, pp. 726-727.
QUESTIONÁRIO:
1. Refira
dois dos traços que caracterizam a figura de viajante representada no poema.
2. Indique
o sentido da expressão «vã melancolia» (verso 6).
3. Neste
texto, o sujeito poético realça a diferença entre a sua experiência e a
experiência de outros.
Justifique
esta afirmação, tendo em conta os versos 12 a 19.
4. Explicite
dois aspetos do tema do regresso, tal como é tratado neste poema.
CENÁRIOS DE
RESPOSTA:
1. Na
resposta, referem-se, adequadamente, dois dos traços que caracterizam a figura
de viajante representada no poema, pelo que devem ser desenvolvidos dois dos
tópicos seguintes, ou outros igualmente relevantes.
A
figura de viajante representada no poema:
−
sente uma atração irresistível pela descoberta de «vários mundos» (v.
13);
−
conhece bem, por experiência própria, o que é partir e regressar;
− considera
que o facto de muito viajar marca a sua personalidade.
2. Na resposta, indica-se
o sentido da expressão, desenvolvendo, adequadamente, dois dos tópicos seguintes,
ou outros igualmente relevantes:
A
expressão «vã melancolia» (v. 6) remete para:
−
a tristeza absurda de uma despedida em que não se diz adeus a ninguém;
−
a inutilidade de se despedir de um lugar a que se é por completo
estranho;
−
o sentimento de partir de uma cidade onde ninguém lembrará aquele que
parte.
3. Na
resposta, justifica-se a afirmação, desenvolvendo, adequadamente, dois dos tópicos
seguintes, ou outros igualmente relevantes:
O
sujeito poético realça a diferença entre a sua experiência e a experiência de
outros:
−
sugerindo que faz parte de um grupo restrito («Não muitos» – v. 12), com
características próprias;
−
considerando que quem não integra o grupo restrito a que ele pertence
não poderá entender a experiência de «tanto haver partido para longe» (v. 17) e
de regressar, pois não o faz com a mesma frequência nem o sente com a mesma
intensidade;
− supondo
que a sua propensão para a viagem não será partilhada por muitos.
4. Na
resposta, explicitam-se dois aspetos do tema do regresso, desenvolvendo,
adequadamente, dois dos tópicos seguintes, ou outros igualmente relevantes:
Tal
como é tratado neste poema, o tema do regresso convoca os seguintes aspetos:
−
o regresso revela toda a mudança que ocorreu durante a ausência;
−
o pleno regresso é impossível, pois, ao voltar, o lugar que se deixou
encontra-se sempre diferente;
− mesmo
os que aguardam fielmente o regresso de quem partiu já não são os mesmos.
Fonte:
Exame Final Nacional de Literatura Portuguesa, 11.º Ano de
Escolaridade. Prova 734 (Decreto-Lei n.º 139/2012, de 5 de julho; Decreto-Lei
n.º 55/2018, de 6 de julho). Instituto de
Avaliação Educativa, I.P. (IAVE), 2019, 2ª fase.
Ligações externas:
- Ler Jorge de Sena (® 2010 Universidade Federal do Rio de Janeiro)
“Quem fala de partir,
de despedidas, Jorge de Sena” in Folha de Poesia, José Carreiro.
Portugal, 20-07-2019. Disponível em: https://folhadepoesia.blogspot.com/2019/07/quem-fala-de-partir-de-despedidas-jorge.html
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