José
Pedro Serra, Professor e pesquisador português que se dedica aos estudos
clássicos, destaca dois aspetos do mito de Édipo que o tornam relevante para a
reflexão filosófica: a oposição entre a fatalidade e a liberdade, e o equívoco
ou o erro de juízo.
Édipo e a Esfinge (480-470 a.C.) Museu Gregoriano Etrusco |
Sobre a oposição
entre a fatalidade (o constrangimento) e a liberdade, José Pedro Serra, afirma
o seguinte: «Sei bem que hoje somos todos muito orgulhosos e muito imprudentemente confiantes na nossa liberdade.
O século
XIX, ao dizer ‘quando se abre uma escola, fecha-se uma prisão’,
manifestava, inocentemente e ingenuamente também, toda a importância do meio
social.
A
psicanálise, ao contrário, descentrou o Homem de si próprio, isto é, fez com
que a sua consciência seja já o resultado de pulsões inconscientes que a
determinam.
E sabemos
lá hoje quantas determinações genéticas, hereditárias, ainda modulam a nossa
liberdade.
Por mim,
não proclamo tão orgulhosamente essa via da liberdade, quanto muito a ela prefiro
a via progressiva da libertação, o que é bem diferente.
O segundo
aspeto tem a ver já não tanto com este aspeto da liberdade, mas com uma outra
coisa que é o equívoco, isto é, o erro de juízo.
Foi ao
errar no juízo que Édipo determinou a sua própria sorte.
Ora, o
erro de juízo é a fatalidade do nosso ser finito, uma vez que é a nossa
finitude que, em última análise, nos faz sempre ter um conhecimento precário de
qualquer coisa que nos rodeia. Na verdade, nós sabemos sempre muito pouco
acerca de tudo (para não dizer que, em última análise, não sabemos nada).
E é essa
tragédia do vagabundear como fantasmas, decidindo coisas que, em última análise,
se mostram exatamente contrárias a tudo o que nós pensámos e nós deliberámos, é
isso mesmo que se ergue também na tragédia de Édipo (O rei Édipo, de
Sófocles).»
(Texto transcrito a partir
do episódio “O Mito de Édipo”, in MYTHOS, temporada 1, episódio 22,
RTP2, 24-04-2023. Disponível em https://www.rtp.pt/play/p10954/e687125/mythos).
José Pedro Serra, MYTHOS |
Na exposição acima transcrita, o Professor José Pedro Serra questiona a confiança
excessiva na liberdade humana, que pode ser limitada e condicionada por fatores
sociais, pulsões inconscientes e determinações genéticas.
Este
pesquisador também propõe uma distinção entre liberdade e libertação. Segundo
ele, a liberdade seria um estado absoluto e ideal, que não leva em conta as
circunstâncias históricas e individuais de cada pessoa. Já a libertação seria
um processo gradual e relativo, que implica a superaração das opressões e dos
constrangimentos que impedem o desenvolvimento humano.
Assim, a
afirmação de que a "via progressiva da libertação" é preferível à
"via da liberdade" deve ser entendida como um apelo para que a luta
pela liberdade esteja sempre conectada à luta pela libertação, e que a
liberdade individual só será significativa se estiver enraizada num
compromisso mais amplo com a justiça social.
Nesse
sentido, a ideia de "via progressiva da libertação" pode ser uma
abordagem mais realista e útil para lidar com as questões de liberdade e opressão.
Essa abordagem enfatiza a importância de lutar contra as limitações que
restringem a liberdade humana, em vez de simplesmente afirmar a existência de uma
liberdade total e incondicional.
Ele
também aponta para a tragédia da finitude humana, que nos impede de ter um
conhecimento pleno da realidade e nos faz agir muitas vezes contra os nossos
próprios interesses.
Neste
sentido, Serra discute a questão do equívoco ou erro de juízo, que é uma forma
de fatalidade que nos pode levar a determinar o nosso próprio destino. Por isso,
o Professor faz referência ao mito de Édipo, que é uma história clássica sobre
a tragédia que pode ocorrer quando tomamos decisões com base em informações
limitadas ou equivocadas.
Em última
análise, o texto explora a tensão entre a nossa capacidade de escolha e as
limitações impostas pela nossa condição humana.
https://www.parlamento.pt/Paginas/2023/abril/25-de-Abril-2023.aspx |
CARREIRO, José. “fatalidade, liberdade e libertação”. Portugal, Folha de Poesia: artes, ideias e o sentimento de si, 25-04-2023. Disponível em: https://folhadepoesia.blogspot.com/2023/04/fatalidade-liberdade-e-libertacao.html
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