Picasso |
(VERSOS A UMA CABRINHA QUE EU TIVE)
Com seu focinho húmido
Esta cabrinha colhe
Qualquer sinal de noite
De que a erva se molhe.
Daquela flor pendente
Pra que seu passo apela
Parece que a semente
É o badalinho dela.
Sua pelerina escura
Vela-a da noite sentida;
Tem cada pêlo uma gota,
Com passos, poeira, vida.
De silêncio, silvas, fome,
Compõe nos úberos cheios
Toda a razão do seu nome
E fruto de seus passeios.
Assim já marcha grave
Como os navios entrando,
Pesada dos pensamentos
Da sua vida suave.
E enfim, no puro penedo
De seus casquinhos tocado,
Está como O ovo e a ave:
Grande segredo
Equilibrado.
Com seu focinho húmido
Esta cabrinha colhe
Qualquer sinal de noite
De que a erva se molhe.
Daquela flor pendente
Pra que seu passo apela
Parece que a semente
É o badalinho dela.
Sua pelerina escura
Vela-a da noite sentida;
Tem cada pêlo uma gota,
Com passos, poeira, vida.
De silêncio, silvas, fome,
Compõe nos úberos cheios
Toda a razão do seu nome
E fruto de seus passeios.
Assim já marcha grave
Como os navios entrando,
Pesada dos pensamentos
Da sua vida suave.
E enfim, no puro penedo
De seus casquinhos tocado,
Está como O ovo e a ave:
Grande segredo
Equilibrado.
Vitorino Nemésio, Eu Comovido a Oeste, 1940
ORIENTAÇÃO DE LEITURA
Faça a análise interpretativa do poema, considerando os seguintes aspetos:
• a memória da infância de raiz rural;
• a presentificação do passado;
• o elemento evocado: o animal que estabelece a cadeia com o vegetal e o mineral;
• o equilíbrio e a totalidade do ovo;
• a promessa do voo da ave;
• os diminutivos que sugerem a linguagem infantil;
• as metáforas, as comparações, as aliterações;
• a estrutura poética quase regular.
(Plural 12, E. Costa, V. Baptista, A. Gomes, Lisboa Editora, 1999)
SUGESTÕES DE LEITURA
[Post original: http://comunidade.sol.pt/blogs/josecarreiro/archive/2012/08/08/NEMESIO.cabrinha.aspx]
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