sexta-feira, 2 de dezembro de 2022

Deslumbramentos, Cesário Verde

 



Deslumbramentos

 

I




II




III




IV




V




VI




VII




VIII




IX




X








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40

Milady, é perigoso contemplá-la,
Quando passa aromática e normal,
Com seu tipo tão nobre e tão de sala,
Com seus gestos de neve e de metal.

Sem que nisso a desgoste ou desenfade,
Quantas vezes, seguindo-lhes as passadas,
Eu vejo-a, com real solenidade,
Ir impondo toilettes1 complicadas!…

Em si tudo me atrai como um tesoiro:
O seu ar pensativo e senhoril,
A sua voz que tem um timbre de oiro
E o seu nevado e lúcido perfil!

Ah! Como me estonteia e me fascina…
E é, na graça distinta do seu porte,
Como a Moda supérflua e feminina,
E tão alta e serena como a Morte!…

Eu ontem encontrei-a, quando vinha,
Britânica, e fazendo-me assombrar;
Grande dama fatal, sempre sozinha,
E com firmeza e música no andar!

O seu olhar possui, num jogo ardente,
Um arcanjo e um demónio a iluminá-lo;
Como um florete2, fere agudamente,
E afaga como o pelo dum regalo3!

Pois bem. Conserve o gelo por esposo,
E mostre, se eu beijar-lhe as brancas mãos,
O modo diplomático e orgulhoso
Que Ana de Áustria4 mostrava aos cortesãos.

E enfim prossiga altiva como a Fama,
Sem sorrisos, dramática, cortante;
Que eu procuro fundir na minha chama
Seu ermo coração, como a um brilhante.

Mas cuidado, milady, não se afoite,
Que hão de acabar os bárbaros reais;
E os povos humilhados, pela noite,
Para a vingança aguçam os punhais.

E um dia, ó flor do Luxo, nas estradas,
Sob o cetim do Azul e as andorinhas,
Eu hei de ver errar, alucinadas,
E arrastando farrapos - as rainhas!

 

Cesário Verde

Coimbra, Mosaico, n.º 6, fevereiro de 1875

Edição utilizada: Obra completa de Cesário Verde, 4.ª edição organizada, prefaciada e anotada por Joel Serrão. Lisboa, Livros Horizonte, 1983

__________

1 Toilettes: vestuário em sentido amplo, que inclui, além de roupa, maquiagem, penteado e outros adereços pessoais.

2 Florete: arma branca, composta de cabo e de uma haste metálica, prismática e pontiaguda, própria para esgrima

3 Regalo: agasalho para as mãos, geralmente feito de pele.

4 Ana de Áustria: Infanta de Espanha (1601-1666), filha do rei Felipe III, depois rainha da Franca pelo casamento com Luís XIII e regente nos anos da menoridade do seu filho, o futuro Luís XIV.

 

https://archive.vogue.com/issue/19500401


 

Análise do poema “Deslumbramentos”, d’O livro do Cesário Verde – tema: mulher

Silva Pinto abriu com este poema O Livro de Cesário Verde o que não foi, segundo vários autores, um ato muito razoável, por se tratar de um dos mais complexos poemas da arte de Cesário.

O tema central deste poema é a Milady perseguida repetida e despercebidamente pelo sujeito lírico para quem, ao vê-la, representa um certo perigo. Esta dama fatal estonteia, atrai mas também fascina e assombra o sujeito lírico que lhe segue os passos e é por ela tratado com humilhante indiferença. Helder Macedo cita no seu livro Mario Praz que resumidamente diz que: “a função da chama que atrai e queima é exercida, na primeira metade do século XIX, pelo Homem Fatal (o herói byroniano), na segunda metade pela Mulher Fatal; a borboleta destinada ao sacrifício é, no primeiro caso, a mulher e, no segundo, o homem. O macho, que inicialmente tende para o sadismo, passa a tender, no fim do século, para o masoquismo.” (PRAZ, Mario: The Romantic Agony. p. 206 in: MACEDO, Helder: Nós uma leitura de Cesário Verde. Editorial Presença, Lisboa, 1999, p. 81).

Milady, é perigoso contemplá-la,

Quando passa, aromática e normal,

Com seu tipo tão nobre e tão de sala,

Com seus gestos de neve e de metal.

(estrofe 1)

A mulher retratada pode ser lida como uma alegoria a cidade moderna: uma mulher distante, frigidamente deslumbrante que caminha na multidão, e perto do sujeito lírico. “A cidade moderna, mais conhecida como a grande dama fatal, é completamente indiferente aos apelos de seus habitantes. Ela, ao mesmo tempo em que afaga e impressiona, fere como um florete; é ambígua e civilizadamente britânica.” (MAIA, Maria Claudia Gonçalves: A trama da modernidade em Cesário Verde. Dissertação de mestrado, PUC do Rio de Janeiro, p. 71).

Na primeira estrofe a Milady é caracterizada através de qualidades frigidamente desumanas, como mulher perigosa, com gestos de neve e de metal, o que entra em choque com a palavra normal. Helder Macedo explica bem porque este ser artificial é descrito como normal: “A implicação é que a Milady, como produto típico da cidade, representa a norma que é a cidade. O uso surpreendente do epíteto normal sugere assim uma atitude crítica em relação à estrutura social numa época em que a ordem urbana e industrial estava a suplantar a ordem rural e em que o artificial começava a dominar o natural.” (MACEDO, Helder: Nós uma leitura de Cesário Verde. Editorial Presença, Lisboa, 1999, p. 81).

A Milady, torna-se, portanto, um novo produto da cidade, representando uma nova norma. Podemos observar na descrição física da Milady que ela tem um vestido tão refinado que dá a sensação de toilettes complicadas, usando um perfume que deixa ao passar o seu cheiro no ar e com a sua postura pensativa e nobre, de brancura e luminosidade de pele quase transparente, atrai o eu lírico completamente.

Sem que nisso a desgoste ou desenfade,

Quantas vezes, seguindo-lhe as passadas,

Eu vejo-a, com real solenidade,

Ir impondo toilettes complicadas!...

 

Em si tudo me atrai como um tesouro:

O seu ar pensativo e senhoril,

A sua voz que tem um timbre de ouro

E o seu nevado e lúcido perfil!

(estrofes 2 - 3)

Ela é a representante da Moda feminina, é uma mulher Britânica, de aspeto, postura e comportamento inglês. Inglaterra, neste sentido, é o símbolo da potência e do progresso industrial e, tal como os portugueses se ajoelham aos seus pés, Cesário ajoelha-se aos pés da Milady. O comportamento e atuação femininos são marcados pela real solenidade, e, com seus gestos de neve e de metal, causa sensação de frio, distanciamento e até a Morte.

A Moda é outro signo que representa a ideia da cidade moderna inscrita neste poema. Ela é representada pelas toilettes complicadas, o que nos remete para a ideia de beleza artificial citadina, que produz mulheres atraentes. O aspeto da mulher transforma-se tal como o aspeto dos prédios, parques, praças e monumentos que enfeitam a cidade. Referindo-se à Moda que surge nos centros urbanos e que é seguida pelas mulheres que neles vivem, Charles Baudelaire faz a seguinte afirmação, defendendo este artifício que tempera a beleza:

“A mulher é, sem dúvida, uma luz, um olhar, um convite à felicidade, às vezes uma palavra, mas ela é sobretudo uma harmonia geral, não somente no seu porte e no movimento de seus membros, mas também nas musselinas, nas gazes, nas amplas e reverberantes nuvens de tecidos com que se envolve, que são como que os atributos e o pedestal de sua divindade; no metal e no mineral que lhe serpenteiam os braços e o pescoço, que acrescentam suas centelhas ao fogo de seus olhares ou tilintam delicadamente em suas orelhas.” (Baudelaire, Ch. (2007): Sobre a modernidade, São Paulo: Editora Paz e Terra, p. 58 - 59).

Para Baudelaire, a mulher teria mesmo o dever de servir-se da Moda. Segundo ele, a mulher tem esse direito e cumpre até uma espécie de dever ao arranjar-se. Como um ídolo terrível e incomunicável, a mulher deve “dourar-se para ser adorada” (Baudelaire). Essa mulher atraente que subjuga corações e surpreende os espíritos, também passeia nas ruas de Lisboa, neste poema, o tipo da mulher é Milady. Além disso é importante acrescentar que usando as maiúsculas, Cesário relaciona a Moda com a Morte, o que significa que essa artificial beleza citadina gera uma emoção destrutiva.

Ah! Como me estonteia e me fascina...

E é, na graça distinta do seu porte,

Como a Moda supérflua e feminina,

E tão alta e serena como a Morte!

(estrofe 4)

Ainda por cima, essa Grande dama fatal caminha sempre sozinha, com firmeza e os seus sapatos com saltos produzem música no andar. Mostra uma certa simbiose entre um arcanjo e um demónio e essa simbiose reflete-se no seu olhar, que ao mesmo tempo acaricia e queima de maneira que pode causar ferimentos.

Eu ontem encontrei-a, quando vinha,

Britânica, e fazendo-me assombrar;

Grande dama fatal, sempre sozinha,

E com firmeza e música no andar!

 

O seu olhar possui, num jogo ardente,

Um arcanjo e um demónio a iluminá-lo;

Como um florete, fere agudamente,

E afaga como o pelo dum regalo!

(estrofes 5 - 6)

O eu lírico deseja humildemente beijar-lhe as mãos como se ela fosse a rainha de França, reagindo com diplomacia e frialdade. Ela, sendo sempre sozinha e com comportamento frio, só o gelo poderia ter por esposo:

Pois bem. Conserve o gelo por esposo,

E mostre, se eu beijar-lhe as brancas mãos,

O modo diplomático e orgulhoso

Que Ana de Áustria mostrava aos cortesãos.

(estrofe 7)

O sujeito lírico incita-a prosseguir com a mesma solenidade, sem sorrisos, dramática, cortante mas também informa que tentará com o fogo que ela lhe está a atear, fundir o ermo coração dela, como um brilhante.

E enfim prossiga altiva como a Fama,

Sem sorrisos, dramática, cortante;

Que eu procuro fundir na minha chama

Seu ermo coração, como um brilhante.

(estrofe 8)

A partir da seguinte estrofe o tom humilde muda para um tom ameaçador. O eu lírico tenta advertir a Milady sobre os povos humilhados que sempre se vingam dos bárbaros reais e profetiza a essa flor do Luxo que um dia vai vê-la errar, alucinada, e arrastando farrapos. O poeta identifica-se assim com os povos humilhados. É preciso também indicar que o erotismo citadino é completamente oposto ao amor ilimitado que é possível no campo. Nesta parte podemos encontrar uma relação explícita entre a humilhação sexual do narrador e a humilhação social do povo dominado por outro país estrangeiro, que em Portugal é Inglaterra que tenta dominar o país para satisfazer os seus próprios interesses económicos. É mesmo interessante como o narrador aceita a humilhação sexual e social, mas quando a situação passa para as dimensões coletivas, surge a ideia de vingança que, contra os bárbaros reais representados pelas miladies, se prepara secretamente pela noite, pelos povos humilhados que aguçam os punhais.

Mas cuidado, milady, não se afoite,

Que hão de acabar os bárbaros reais,

E os povos humilhados, pela noite,

Para a vingança aguçam os punhais.

(estrofe 9)

Depois da vingança, essa Milady, flor do Luxo ou rainha, não vai vestir mais com real solenidade as toilettes complicadas mas os farrapos errando alucinada pelas estradas, sob o céu azul. Segundo Maria Maia: “a Moda, em sua conexão com a artificialidade, é unida à Morte e a elegância transmutada em farrapos.” (MAIA, Maria Claudia Gonçalves: A trama da modernidade em Cesário Verde. Dissertação de mestrado, PUC do Rio de Janeiro, p. 72).

E um dia, ó flor do Luxo, nas estradas,

Sob o cetim do Azul e as andorinhas,

Eu hei de ver errar, alucinadas,

E arrastando farrapos – as rainhas!

(estrofe 10)

Resumindo, em Deslumbramentos podemos observar o olhar fascinado de um homem por uma mulher estrangeira, uma inglesa, olhar que se humilha diante do esplendor e snobismo e que poderia também ser interpretado como uma alegoria da relação tensa entre Portugal e a Europa Civilizada. “No entanto, no decorrer da leitura, o tom se modifica e a inferioridade inicial transforma-se em ameaça, quase um desafio. Poderíamos dizer que o poema encena a tentativa bem sucedida de explicar, metaforicamente, o poder exercido pela Inglaterra no imaginário português, com a possibilidade de uma saída para a situação de opressão.” (ibidem, p. 56).

É interessante acrescentar como Cabral Martins trabalha com este poema desvendando as contradições semânticas: estonteia x fascina, arcanjo x demónio, fere x afaga, ermo coração x como um brilhante, toilettes complicadas x farrapos, etc., que causam euforias e sentimentos de inquietação. Segundo ele, o primeiro verso (Milady, é perigoso contemplá-la) “ganha a ressonância perfeita de um sonho, pura intensidade, onde real e desejo coincidem num afeto que se revela contraditório, ou ambivalente: ele implica deslumbramento (a projeção de um ser de luz) e inquietação (ameaça e enigma).” (MARTINS, Cabral: Cesário Verde ou a transformação do mundo. Editorial Comunicação, Lisboa, 1988, p. 60).

 

Olga Poláková, Mulher na poesia de Cesário Verde. Brno, Faculdade de Filosofia da Universidade de Masaryk - Instituto de Línguas e Literaturas Românicas, 2008

 

"Balconies in Lisbon", Vogue, 1950-04-01 
https://archive.vogue.com/article/1950/04/01/balconies-in-lisbon


 

Quando os opostos se atraem

A milady do poema passa aromática e normal. O primeiro adjetivo não causa estranhamento, mas o segundo não é, digamos, de uso normal. Não conseguimos distinguir ao certo o uso desse adjetivo nesse contexto. Pode querer se referir a certa naturalidade no caminhar da passante, ou ainda regularidade, como se essa figura feminina representasse a eterna passante do universo urbano. Esse adjetivo pode também designar um caminhar regrado, compassado, seguidor de uma norma, isto é, um caminhar premeditado, mas também sem sabermos até que ponto essa premeditação se contradiria com a hipotética designação de naturalidade, se premeditação e certa naturalidade podem conviver no universo do artifício. Por fim, se levarmos em consideração o sentido de “moda” do substantivo “norma”, podemos associar o adjetivo “normal” a esse universo, acentuando o tom de artifício e tornando a figura uma mulher elegante. “Aromática” e “normal” são dois adjetivos que estão aproximados, um sendo concreto e outro abstrato, respetivamente; havendo, assim, nessa aproximação de termos, igualmente uma aproximação, um contato entre os planos objetivo e subjetivo.

A milady tem gestos de neve e de metal. “Gestos de neve” é uma expressão que não provoca estranhamento porque a neve muitas vezes já fora utilizada para designar frieza, indiferença. Por seu turno, a expressão “gestos de metal” já é mais complexa e incomum. Podem ser gestos que provoquem magnetismo, deslumbramentos, como diz o título do poema. Gestos que brilham, que chamam a atenção tanto pela sua premeditação, pelo seu cálculo quanto pela sua naturalidade. O que torna o uso dessa expressão ainda mais inquietante é que ela pode se opor à outra – “gestos de neve” – se lembrarmos que metal designa elementos químicos que têm como característica, além do brilho e da condutibilidade elétrica, a condutibilidade calorífica. O deslumbrado estaria, então, submetido ao fascínio de gestos que, não obstante indiferentes, comovem, aquecem a sensibilidade, inflamam os sentidos. No caso do erotismo de humilhação, é precisamente a indiferença e frieza desses gestos a causa do “aquecimento” dos sentidos e do fascínio. No contexto dessa espécie de erotismo a identificação dessas expressões de sentido oposto pode ser melhor compreendida, assumindo uma situação mais virulenta e comprometedora.

A milady tem também um nevado e lúcido perfil. O adjetivo “nevado”, que pode ser associado aos gestos de neve, pode também ser entendido como palidez de pele, havendo na aproximação dos dois adjetivos novamente uma aproximação dos campos objetivo e subjetivo, se pensarmos em “lúcido” não somente com o sentido de “brilhante”, mas também com o de “penetrante”, evocando, assim, o poder magnético da figura feminina.

Por fim, a expressão “bárbaros reais” (verso 34) é complexa. A realeza, a nobreza – conotação, aqui, da classe dirigente –, logo associada, no imaginário coletivo, à civilidade, é aqui associada, contrariamente, à barbárie. À barbárie, provavelmente, da exploração na sociedade moderna. Exploração dos “povos humilhados” (verso 35). O adjetivo “reais” também pode estar, aqui, designando “realidade”. Os verdadeiros bárbaros são a classe dirigente, representada pela “flor do Luxo” (verso 37), e não os “povos humilhados” (verso 35).

 

Carlos Bonfá, A Modernidade Poética em Cesário Verde e Gomes Leal. Araraquara,  UNESP, 2009

 

Vogue, 1927-03-27 
https://archive.vogue.com/issue/19270315


 

Intertextualidade: Cesário e Baudelaire

 

XCIII

À UNE PASSANTE

 

La rue assourdissante autour de moi hurlait.

Longue, mince, en gland deuil, douleur majestueuse,

Une femme passa, d’une main fastueuse

Soulevant, balançant le feston et l’ourlet;

 

Agile et noble, avec sa jambe de statue.

Moi, je buvais, crispé comme un extravagant,

Dans son ceil, ciel livide oi germe l’ouragan,

La douceur qui fascine et le plaisir qui tue.

 

Un éclair... puis la nuit! — Fugitive beauté

Dont le regard m’a fait soudainement renaitre,

Ne te verrai-je plus que dans l’éternité?

 

Ailleurs, bien loin d’ici! trop tard! jamais peut-être!

Car j’ignore où tu fuis, tu ne sais où je vais,

Ô toi que j’eusse aimée, ô toi qui le savais!

 

 

XC III

A UMA TRANSEUNTE

 

A rua ia gritando e eu ensurdecia.

Alta, magra, de luto, dor tão majestosa,

Passou uma mulher que, com mãos sumptuosas,

Erguia e agitava a orla do vestido;

 

Nobre e ágil, com pernas iguais a uma estátua.

Crispado como um excêntrico, eu bebia, então,

Nos seus olhos, céu plúmbeo onde nasce o tufão,

A doçura que encanta e o prazer que mata.

 

Um raio... e depois noite! — Efémera beldade

Cujo olhar me fez renascer tão de súbito,

Só te verei de novo na eternidade?

 

Noutro lugar, bem longe! é tarde! talvez nunca!

Porque não sabes onde vou, nem eu onde ias,

Tu que eu teria amado, tu que bem sabias!

 

Charles Baudelaire, As Flores do Mal. Tradução de Fernando Pinto do Amaral 
Lisboa, Assírio e Alvim, 1992

 

Desde Ramalho Ortigão têm os leitores críticos aproximado Cesário de Baudelaire, insistindo nas semelhanças e, por reação, também nas diferenças. É o que fez, por exemplo, J. Prado Coelho. A seu ver, ambos os poetas inscrevem nos seus poemas a mulher fria, a cidade e a sua vida, ambos têm o mesmo gosto pelo inesperado, por vezes "arrepiante" (o frisson nouveau), a mesma audácia metafórica e atitudes por vezes exageradas, e ambos associam a poesia à pintura. No entanto, Cesário é também um poeta do campo, do prosaico, sem amplidão oratória, antirromântico, sem as preocupações metafísicas e os abismos psicológicos de Baudelaire, além de não ter quaisquer marcas de satanismo.

Também Mourão-Ferreira comparou os dois poetas e acentuou as diferenças, como, por exemplo, a que vai de um ideal de normalidade e equilíbrio, em Cesário, à doentia extravagância patente na poesia de Baudelaire, ou, numa idêntica insistência no sensório, a imaginação predominantemente sinestésica de Baudelaire ao contrário da de Cesário Verde.

Margarida Vieira Mendes, Poesias de Cesário Verde, Lisboa, Seara Nova/Comunicação, 1979, pp, 22-23 


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Deslumbramentos, Cesário Verde” in Folha de Poesia, José Carreiro. Portugal, 02-12-2022. Disponível em: https://folhadepoesia.blogspot.com/2022/12/deslumbramentos-cesario-verde.html



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