Mensagem, de Fernando Pessoa
Primeira Parte – Brasão
II - Os Castelos
Quarto
D. TAREJA
As
nações todas são mistérios.
Cada uma é todo o mundo a sós.
Ó mãe de reis e avó de impérios.
Vela por nós!
Teu seio augusto amamentou
Com bruta e natural certeza
O que, imprevisto, Deus fadou.
Por ele reza!
Dê tua prece outro destino
A quem fadou o instinto teu!
O homem que foi o teu menino
Envelheceu.
Mas todo vivo é eterno infante
Onde estás e não há o dia.
No antigo seio, vigilante,
De novo o cria!
24-9-1928
Fernando Pessoa, Mensagem.
Lisboa: Parceria António Maria Pereira, 1934 (Lisboa: Ática, 10ª ed.
1972). – 28. Disponível em: http://arquivopessoa.net/textos/1286
Linhas
de leitura do poema D. Tareja, de Fernando Pessoa:
- D. Tareja - versão arcaica do nome de D. Teresa, mãe de Afonso Henriques.
- "cada nação é todo o mundo a sós"- cada nação constitui um todo que, enquanto tal, é diferente de todas as outras;
- D. Tareja representa, simbolicamente, o começo e a origem de Portugal: "mãe de reis e avó de impérios vela por nós" - chama a D. Teresa mãe de Portugal e a partir daqui passa a considerar simbolicamente o País como transfiguração do seu primeiro rei.
- "...com bruta e natural certeza"- "bruta" significa aqui "de acordo com a natureza” e, portanto, "bruta e natural" constitui um pleonasmo.
- "o que, imprevisto, Deus fadou."- O país improvável que é Portugal, tal como Afonso Henriques, que enfrentou o poderoso reino de Leão e os potentados islâmicos e cujas probabilidades de sucesso pareciam, à partida, muito remotas.
- "dê tua prece outro destino a quem fadou o instinto teu! O homem que foi o teu menino envelheceu."- que a tua prece mude o rumo de Portugal que hoje (na década de 1930) é um país sem vitalidade.
- "Mas todo vivo é eterno infante/ Onde estás e não há o dia. No antigo seio vigilante de novo o cria!"- D. Teresa está morta (no reino dos mortos = "onde estás e não há o dia") e Portugal ainda está vivo e enquanto existir tem em si o potencial de se renovar ("é eterno infante" = é sempre jovem). No último verso pede que o País seja recriado = reinventado = ganhe novo vigor.
João
Mimoso, Mensagem, de Fernando Pessoa. Lisboa, 31-08-2003 (última revisão:
01-08-2014). Disponível em: https://www.inverso.pt/Mensagem/Brazao/Dhenrique.htm#tareja
***
Sugestão:
visiona o Módulo de Português do 12.º Ano respeitante à análise e interpretação
do poema “D. Tareja”, de Fernando Pessoa:
In: Projeto #ESTUDOEMCASA.
Mensagem, de Fernando Pessoa: os poemas "D. Tareja" e "D.
Dinis".| Aula 20| 29 min| 27 Jan. 2021. Inicia no minuto 10’15’’.
Disponível em: https://www.rtp.pt/play/estudoemcasa/p7907/e520354/portugues-12-ano
Mensagem, de Fernando Pessoa
Primeira Parte – Brasão
II - Os Castelos
Sétimo (II)
D. FILIPA DE LENCASTRE
Que
enigma havia em teu seio
Que só génios concebia?
Que arcanjo teus sonhos veio
Velar, maternos, um dia?
Volve a nós teu rosto sério,
Princesa do Santo Gral,
Humano ventre do Império,
Madrinha de Portugal!
26-9-1928
Fernando Pessoa, Mensagem. Lisboa: Parceria António Maria Pereira, 1934
(Lisboa: Ática, 10.ª ed. 1972). - 33.
Disponível em: http://arquivopessoa.net/textos/168
D. Tareja e D. Filipa de Lencastre, heroínas da Mensagem,
de Fernando Pessoa
Longe da heroína guerreira ou da heroína agente
de mudança está, pois, a mulher n'Os Lusíadas ou na Mensagem. Se,
em Camões, o seu papel, à parte o seu contributo na caracterização do Amor, se
confina à boa ou má influência que ela exerce sobre os homens (casos da fermosíssima
Maria e de Leonor Teles), em Fernando Pessoa, ela surge investida da função de
procriar, paradigmaticamente ilustrada nas figuras de D. Filipa de Lencastre e
de D. Tareja.
Aquela é o «Humano ventre do Império» (M,
23), predestinado a conceber os «génios» que dariam forma ao ideal de ser português;
esta, «mãe de reis e avó de impérios» (M, 28).
Uma e outra ligadas a essa verdade perdida
do que somos: D. Filipa, cujo gesto criador é legitimado pela visita do «arcanjo»,
é a «Princesa do Santo Graal»; D. Tareja o instinto patriótico perdido. Uma exemplaridade
que, em D. Tareja, se reveste de características particulares: a heroína é-nos apresentada
quer como símbolo de protetora fecundidade («Teu seio augusto amamentou / Com
bruta e natural certeza / O que, imprevisto, Deus fadou» - M, ibid.),
bafejada pelo sagrado que o adjetivo «augusto» denuncia, quer como fonte de
regeneração («No antigo seio vigilante / De novo cria»), sob os auspícios de um
destino que a transcende. Note-se, ainda, que a «(bruta e natural
certeza»), com que o destino se cumpre através dela, lhe realça o instinto e a
função maternal da amamentação, fazendo lembrar a loba de Rómulo e Remo, cuja
ligação ao Império romano tem o mesmo valor mítico que a de D. Tareja ao Império
português.
O que D. Filipa e D. Tareja representam, em
suma, é a mesma energia criativa, o mesmo poder de regeneração que outros
autores encontram no mito da Terra-mãe, ausente da Mensagem, se excetuarmos
a alusão que lhe é feita em «Fernão de Magalhães).
Artur Veríssimo, Dicionário da
Mensagem. Porto, Areal Editores, 2000
***
Questionário
sobre o poema “D. Filipa de Lencastre”, de Fernando Pessoa:
Das hipóteses
apresentadas (A, B, C e D), assinala a correta.
1 - O texto poético B pertence à coletânea
Mensagem. Qual é o objetivo que presidiu à elaboração dessa coletânea?
A)
Narrar um conjunto de mitos e lendas da História de Portugal.
B)
Narrar factos da História de Portugal.
C)
Transmitir mensagens de esperança às gerações vindouras.
D)
Apresentar uma visão mítico-poética da História de Portugal.
2 - Quais são as partes nucleares em que se
divide a coletânea Mensagem?
A)
Brasão/Mar Português/O Encoberto.
B)
Brasão/O Timbre/Os Tempos.
C) Os Castelos/Mar Português/O Encoberto.
D) Os Castelos/O Infante/O Encoberto.
3 - A que parte da coletânea Mensagem pertence
o poema B?
A)
Brasão/A Coroa.
B)
Brasão/Os Castelos.
C) Brasão/As Quinas.
D) Brasão/O Timbre.
4 - Quem foi D.ª Filipa de Lencastre?
A)
Uma vítima da História Trágico-Marítima.
B)
Esposa de D. Duarte.
C)
Esposa de D. João I.
D)
Esposa de D. João II.
5 - Como são conhecidos os "génios"
concebidos por D.ª Filipa de Lencastre?
A)
Ínclita Geração.
B)
Geração de 70.
C)
Geração de Sucesso.
D)
Geração de Ilustres.
6 - Por que dedica o poeta um poema a D.ª
Filipa de Lencastre?
A)
Porque D.ª Filipa de Lencastre era a musa inspiradora do poeta.
B)
Porque o poeta considera D.ª Filipa de Lencastre a dama mais ilustre da
História de Portugal.
C)
Porque D.ª Filipa de Lencastre é interpretada como a matriz de Portugal.
D)
Porque D.ª Filipa de Lencastre merece o reconhecimento de Portugal por ter dado
à Pátria filhos ilustres.
7 - Qual é a mensagem final da obra Mensagem?
A)
Mensagem de esperança e de encorajamento.
B)
Mensagem de desencanto e de encorajamento.
C)
Mensagem de esperança e de confiança no futuro.
D)
Mensagem de desencanto e de amargura.
Chave de correção: 1-D, 2-A, 3-B, 4-C, 5-A,
6-D, 7-B.
Disponível em http://www.profareal.pt/testes/doc.asp?tema_id=777
(Consultado em 11-06-2007)
Poderá também gostar de:
Fernando Pessoa - Apresentação crítica, seleção, notas e sugestões para análise literária da obra de Fernando Pessoa, por José Carreiro.
- In: Lusofonia, https://sites.google.com/site/ciberlusofonia/PT/literatura-portuguesa/fernando_pessoa, 2021 (3.ª edição)
- e Folha de Poesia, 17-05-2018. Disponível em: https://folhadepoesia.blogspot.com/2018/05/fernando-pessoa-13061888-30111935.html
“D. Tareja e D. Filipa de Lencastre, heroínas da Mensagem, de Fernando Pessoa” in Folha de Poesia, José Carreiro. Portugal, 14-12-2019. Disponível em: https://folhadepoesia.blogspot.com/2022/12/d-tareja-e-d-filipa-de-lencastre.html
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