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Segue o
teu destino, |
Ricardo
Reis, Odes, Lisboa, Ática, 1970
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1 aras: altares.
2 ex-voto: objeto que se oferece em cumprimento de uma promessa.
Questionário sobre o poema “Segue o teu destino”, de Ricardo Reis.
1. Ricardo
Reis defende o prazer e a busca da calma ou a sua ilusão para viver feliz.
1.1. Explique o sentido do verso "Ama as tuas
rosas", tendo em conta os conselhos dados na primeira estrofe.
1.2. Comente a construção dos primeiros três versos,
atendendo às formas verbais e à função da linguagem.
2. Mostre
em que medida se diferencia a realidade daquilo que "somos".
3. Escolha
a expressão que melhor exprima a apatia como ideal ético. Justifique.
4. Prove
que é necessária a ataraxia para viver com satisfação, mas que a calma e a
felicidade são inatingíveis, mesmo para os deuses.
5. Comente
o pensamento epicurista que se depreende do poema.
6. Enquadre
esta composição na produção poética de Ricardo Reis.
Chave de respostas
1.1. O sentido do verso "Ama as tuas rosas": no
primeiro verso, surge o conselho dado a um "Tu" de seguir o seu
destino e de se preocupar com o momento presente e com aquilo que lhe diz diretamente
respeito ("as tuas plantas", "as tuas rosas"), pondo de
parte o que lhe é alheio.
1.2. Nos primeiros três versos, encontramos o uso do
imperativo e a função apelativa da linguagem.
2. A realidade nem sempre corresponde àquilo que
desejamos: é sempre mais ou menos do que aquilo que queríamos alcançar (a
realidade está dependente do destino); nós, sendo iguais a nós próprios,
seremos sempre aquilo que queremos ser, se soubermos tentar alcançar apenas o
que nos foi predestinado.
3. Todo o poema exprime uma atitude de apatia como ideal
ético, mas os versos "Vê de longe a vida. / Nunca a interrogues." ou
"Grande e nobre é sempre / Viver simplesmente." demonstram a aceitação
calma de tudo o que o destino nos reserva, sem questionar e sem nos apegarmos à
vida...
4. A ataraxia é necessária para vivermos com satisfação,
porque a calma, a tranquilidade e a felicidade são essenciais para a nossa
vida; no entanto, são também inatingíveis, porque a realidade "é sempre
mais ou menos do que queremos", porque a concretização nem sempre
corresponde às intenções ou às expectativas. O destino, de facto, comanda a
vida e as explicações para os acontecimentos estão mesmo "para além dos
deuses" (v. 20).
5. Do poema depreende-se um pensamento epicurista pela
busca de uma atitude que harmonize todas as faculdades, que atinja o
equilíbrio, a calma e a tranquilidade, evitando, assim, as preocupações que a
fugacidade da vida possam causar. Daí, a intenção de buscar o isolamento
("suave é viver só"), ver "de longe a vida", vivendo
simplesmente e aproveitando o momento presente.
6. As razões que nos permitem enquadrar esta composição
na produção poética de Ricardo Reis são:
-
a referência a ideais clássicos;
-
o tom moralista (uso dos imperativos);
-
a aceitação passiva da ordem das coisas ("vê de longe a vida");
-
a busca da perfeição e do equilíbrio;
-
a ideia de que não nos devemos prender demasiado ao momento presente, porque a
vida é fugaz;
-
o epicurismo;
-
o individualismo (vv. 1, 11).
Disponível em: http://www.esa.esaportugues.com/programa/Reis/texto1RR.htm
(Consultado em 17-02-2015)
Comentário de
texto
Elabore um comentário do poema em que desenvolva
os seguintes tópicos:
- regras principais de uma
arte de viver;
- função do emprego do
modo imperativo;
- relação estabelecida
entre os homens e os deuses;
- integração no universo
poético de Ricardo Reis.
Explicitação
de cenários de resposta
Regras principais de uma arte de viver
«Segue o teu destino»; «Vê
de longe a vida. / Nunca a interrogues.»; «serenamente / Imita o Olimpo»: estas
formulações apontam para a regra por excelência proposta ao leitor, que é a de
não se questionar sobre o sentido ou o mistério da vida, permanecendo sem
inquietação e sem ansiedade, antes com tranquilidade e desprendimento.
«Suave é viver só.»;
«Grande e nobre é sempre/ Viver simplesmente.»: aqui, registam-se como indicações
importantes a de viver sozinho e a de viver com simplicidade - embora «Viver simplesmente»
também se possa ler «simplesmente viver», isto é, viver sem fazer perguntas metafísicas,
tal como «viver só» pode significar «viver apenas».
Outra ideia forte é a da
não coincidência entre desejo e realidade («A realidade / Sempre é mais ou
menos / Do que nós queremos.»), ideia que está ligada às instruções já
referidas: não se questionar e não ansiar por nada.
Função do emprego do modo imperativo
O imperativo é utilizado
no poema, não como o modo da ordem, mas como o do conselho, servindo para a
prescrição de normas de vida simples e serena. Os três primeiros versos, por exemplo,
contêm, em três orações paralelas, três dessas normas.
Por outro lado, a
alternância entre o imperativo e o presente do indicativo, ao longo do poema, mostra
como as regras de vida que são propostas decorrem de uma observação e avaliação
da realidade.
Relação estabelecida entre os homens e os
deuses
Primeiro, há uma relação
de distância, patente na oferenda de ex-votos.
Depois, percebe-se uma
relação de proximidade e de quase identificação: o facto de a «resposta» estar
«além dos deuses» implica que a pergunta que os homens fazem também não pode
ser respondida pelos deuses, e que eles estão na mesma situação que os homens
perante o mistério do mundo.
Daí que a última estrofe
aconselhe os homens a imitarem «O Olimpo» e a aproximarem-se, portanto, dos
deuses. A característica essencial dos deuses que deve ser imitada pelos homens
é a de que «não se pensam», isto é, não tentam interrogar o sentido da vida -
numa palavra, vivem simplesmente.
Integração no universo poético de Ricardo
Reis
Esta poesia parte do
ensinamento do mestre Caeiro - o não pensar, o nada desejar, o viver das sensações
-, pois Ricardo Reis é um dos seus discípulos. Mas há um tom moral de
ascendência estoica que a este último heterónimo advém, por seu turno, da
educação clássica, donde procede também o seu gosto pelas formas regradas da
poética horaciana.
Faz parte do seu modo
particular de entender o ensinamento de Caeiro a emergência do paganismo. As
referências constantes aos deuses da Antiguidade greco-latina são uma forma privilegiada
de entender e de formular a primazia do corpo, das formas, da natureza, dos
aspetos exteriores da realidade, sem cuidar da subjetividade ou da
interioridade.
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- In: Lusofonia, https://sites.google.com/site/ciberlusofonia/PT/literatura-portuguesa/fernando_pessoa, 2021 (3.ª edição)
- e Folha de Poesia, 17-05-2018. Disponível em: https://folhadepoesia.blogspot.com/2018/05/fernando-pessoa-13061888-30111935.html
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