«Falemos de casas
[…]
pensamentos nas pedras de alguma coisa
celeste como fogo exemplar.»
«O soneto é uma casa
poética . Em
nenhuma outra forma
fixa o lirismo
sabe conter-se tão amoldado, tão justo na medida que o veste e tão livre nos movimentos de respiração
e de gesto que
lhe apontam o exterior
de que é abrigo
e olhar . Medidas
e casas são
gosto e desejo
de cada um ,
mas sempre
se pode determinar o maior
ou menor
espaço que
delimita o canto habitável e a maior ou menor folga que define a propriedade
ou o empréstimo .
Formas de rigor
no estar livre ,
em
suma . Com
as adaptações subjectivas que sempre
condicionam a liberdade dos outros (a do género) pela
nossa e lhe
conferem o rigor do exacto momento
que vivemos. Assim
o soneto , depois
da grande fortuna
clássica e simbolista que soube conquistar , se vê preterido pelas formas
anárquicas da des-“ocupação do espaço ” contemporâneo , num sistema de substituições […]».
Mª Alzira Seixo , Discursos do Texto ,
Amadora, Livraria
Bertrand, 1977, pp. 283-284.
*
«[…] o soneto é uma estrutura e é uma unidade de tratamento da
linguagem poética, constituindo uma descida vertical na pesquisa e na construção
do poema considerado como um objecto.»
E. Melo e Castro, depoimento a O Tempo e o Modo, 59, p. 383.
*
O que há no soneto? Uma unidade perfeita: desenha-se cada
ideia parcial deper si, mas não tão independente das outras que não haja
entre elas relação, até que afinal, juntando tudo num só se apresenta por todos
os lados simultaneamente como em resumo, o fecho – chave de ouro! Dai, a unidade. E simplicidade?
Toda: as partes conservam estreito laço entre si, é só um sentimento, só uma
ideia; não são várias, mas vários lados: a unidade final funde-os num todo.
Antero de Quental, «Prefácio à Edição dos Sonetos de 1861». In:
Antero de Quental, Sonetos, Organização, introdução e notas de Nuno
Júdice, Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 2002, p.
230.
1988 |
Observem que o poema de Avelino de Araújo só usou palavras no título. O texto, em si, é construído na associação visual da imagem que compõe o corpo do poema com as duas palavras do título. Analisando esta combinação temos o desenho de uma cerca de arame farpado, a palavra apartheid e a palavra soneto. E a indicação do contexto histórico da produção do texto remonta ao ano de 1988. A leitura mais imediata que o texto provoca – entre outras possíveis – é a que relembra o significado de apartheid, o regime político de segregação racial que imperou na África do Sul até os anos 90. No apartheid eram determinadas as áreas das cidades em que os negros poderiam viver e em quais eles poderia circular. Se ultrapassassem os limites estabelecidos eram violentamente reprimidos pela polícia. A palavra soneto, por sua vez, evoca a forma fixa mais clássica de poesia: o poema com 14 versos, distribuídos em duas estrofes de 4 versos (dois quartetos) e duas estrofes de 3 versos (dois tercetos). É a forma em que estão distribuídas as linhas que formam a imagem do corpo do texto. Linhas que são fios de arame farpado, objeto usado para fazer cercas que delimitam propriedades… ou que formam cercados para animais.
Com a associação da imagem do arame farpado disposto numa cerca de quatro-quatro-três-três às palavras apartheid e soneto Avelino de Araújo nos diz muito sobre o regime doapartheid: esse regime segregacionista, ao confinar seres humanos a áreas restritas, trata-os como animais. Três palavras e uma imagem foram suficientes para construir este sentido.
https://literarizando.wordpress.com/2009/03/08/gabaritos-2009-ficha-2/
PROPOSTA DE ESCRITA RECREATIVA, EXPRESSIVA E LÚDICA:
O soneto seguinte foi escrito por
Florbela Espanca, mas encontra-se incompleto.
Completa-o de forma lógica, mantendo o
tom poético (linguagem conotativa) e respeitando as seguintes características:
Os versos
são decassilábicos;
O esquema
rimático é ABAB BABA CCD EED;
Os versos
encontram-se agrupados em quatro estrofes (duas quadras e dois tercetos);
O último
terceto termina com chave de ouro.
Vaidade
Sonho que
sou a Poetisa eleita,
Aquela que
_________________,
Que tem a
inspiração _________________,
Que reúne
num _________________ a imensidade!
Sonho que
um verso meu tem claridade
Para encher
_________________! E que de leita
Mesmo
aqueles que morrem de _________________!
Mesmo os de
alma profunda e _________________!
_________________
que sou Alguém cá neste mundo...
Aquela de
_________________ vasto e profundo,
Aos pés de
quem _________________ anda curvada!
E quando
mais no céu eu vou _________________,
E quando
mais no alto ando _________________,
Acordo do _________________...
E não sou _________________...
Florbela Espanca
(Para)Textos. Caderno de Atividades – Língua Portuguesa 8.º Ano. Ana Miguel de Paiva, Gabriela Barroso de Almeida, Noémia Jorge, Sónia
Gonçalves Junqueira. Porto Editora,
2012, p. 71.
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Contributo para uma Leitura
de «Prefácio» em POESIA TODA de
Herberto Hélder, Helena Paula F. S. Borges, 1996.
Como escrever
um soneto, criado
por Jack.aw, revisões wikiHow.
Sonetário
brasileiro, Elson
Fróes.
Poesia
lúdica barroca, Folha
de Poesia, José Carreiro,
2010-11-04.
[Post original: http://comunidade.sol.pt/blogs/josecarreiro/archive/2009/05/04/soneto.aspx]