domingo, 30 de junho de 2024

O menino da avó, Cecília Meireles

 


 

A AVÓ DO MENINO

A avó
vive só
Na casa da avó
o galo liró
faz “cocorocó!”
A avó bate pão-de-ló
e anda um vento t – o – tó
na cortina de filó.
A avó
vive só.
Mas se o neto meninó
mas se o neto Ricardó
mas se o neto travessó
vai a casa da avó,
os dois jogam dominó.

 

Cecília Meireles, Isto ou aquilo, 1964

 

No poema “A avó do menino”, de Cecília Meireles, o sujeito poético utiliza a simplicidade e a musicalidade para retratar a relação entre uma avó e o seu neto. A estrutura do poema é marcada pela rima constante, em que cada verso termina com o som do “ó” acentuado, criando um ritmo que remete para as cantigas infantis e para a oralidade da língua portuguesa.

A repetição dos versos “A avó” e “vive só” sugere uma solidão não absoluta, mas pontuada pela presença ocasional do neto. Essa solidão é relativa, pois é interrompida pela visita do neto, que traz vida e movimento à casa da avó, simbolizada pelo jogo de dominó.

A metáfora do vento que “anda” na cortina de filó sugere algo invisível e subtil que, no entanto, tem presença e movimento, assim como a solidão da avó que é palpável mesmo não sendo permanentemente visível.

A escolha de palavras com o som do “ó” acentuado, mesmo quando não é gramaticalmente necessário, enfatiza a sonoridade e a intenção em destacar a musicalidade do poema. Isso também pode ser visto como uma forma de dar ênfase à presença do neto, cuja chegada muda o tom da casa e da vida da avó.

O poema retrata, assim, a realidade afetiva de muitos lares, celebrando a alegria trazida pelo convívio intergeracional.


sábado, 29 de junho de 2024

A avó, Olavo Bilac


 

A AVÓ

A avó, que tem oitenta anos,
Está tão fraca e velhinha!…
Teve tantos desenganos!
Ficou branquinha, branquinha,
Com os desgostos humanos.

Hoje, na sua cadeira,
Repousa, pálida e fria,
Depois de tanta canseira:
E cochila todo o dia,
E cochila a noite inteira.

Às vezes, porém, o bando
Dos netos invade a sala…
Entram rindo e papagueando:
Este briga, aquele fala,
Aquele dança, pulando…

A velha acorda sorrindo.
E a alegria a transfigura;
Seu rosto fica mais lindo,
Vendo tanta travessura,
E tanto barulho ouvindo.

Chama os netos adorados,
Beija-os, e, tremulamente,
Passa os dedos engelhados,
Lentamente, lentamente,
Por seus cabelos doirados.

Fica mais moça, e palpita,
E recupera a memória,
Quando um dos netinhos grita:
“Ó vovó! conte uma história!
Conte uma história bonita!”

Então, com frases pausadas,
Conta histórias de quimeras,
Em que há palácios de fadas,
E feiticeiras, e feras,
E princesas encantadas…

E os netinhos estremecem,
Os contos acompanhando,
E as travessuras esquecem,
— Até que, a fronte inclinando
Sobre o seu colo, adormecem…

 

Olavo Bilac (1865-1918), Poesias Infantis.
Rio de Janeiro, Livraria Clássica de Francisco Alves & C.ª, 1904, pp. 7-9

 

fragmento da pág. 7 de Poesias Infantis, 1904

 

 

De acordo com a leitura do poema “A avó”, de Olavo Bilac (1865-1918), classifica cada afirmação que se segue como verdadeira ou falsa. Procede à correção das afirmações falsas.

1. A repetição da palavra “branquinha”, no verso 4, acentua a imagem da avó debilitada.

2. A avó passa a maior do tempo a dormir profundamente.

3. Os netos entram na sala silenciosamente para não incomodar a avó.

4. A avó fica triste quando os netos invadem a sala.

5. Os netos representam a juventude e a vitalidade.

6. A avó conta histórias reais sobre sua vida.

7. A avó transmite valores e cultura familiar, assegurando a continuidade da sua sabedoria e amor entre as gerações.

8. Os netos ficam inquietos e continuam fazendo travessuras enquanto ouvem as histórias.

9. A avó fica mais feliz e rejuvenescida quando está sozinha.

10. A mensagem do poema destaca apenas a inevitabilidade do envelhecimento.

 

Respostas:

1. Verdadeiro.

2. Falso. A avó não dorme profundamente, mas sim de forma intermitente. O uso da palavra "cochila" implica um sono leve, não profundo.

3. Falso. Os netos entram rindo e fazendo barulho: "Às vezes, porém, o bando / Dos netos invade a sala… / Entram rindo e papagueando."

4. Falso. A avó fica feliz quando os netos invadem a sala, como indicado na estrofe: “A velha acorda sorrindo.”

5. Verdadeiro.

6. Falso. A avó conta histórias de quimeras, ou seja, histórias imaginárias.

7. Verdadeiro.

8. Falso. Os netos ficam atentos e tranquilos enquanto ouvem as histórias: "E os netinhos

estremecem, / Os contos acompanhando, / E as travessuras esquecem."

9. Falso. A avó fica mais feliz e rejuvenescida com a presença dos netos: "Fica mais moça, e palpita, / E recupera a memória."

10. Falso. A mensagem do poema é dupla: destaca tanto a inevitabilidade do envelhecimento quanto a capacidade dos mais velhos de encontrar alegria na companhia dos mais jovens.

 

Síntese da leitura do poema:

O poema “A Avó” de Olavo Bilac é uma homenagem à figura da avó e ao seu papel na família. Através de uma linguagem doce e imagens ternas, o sujeito poético descreve a avó como um pilar de força e amor, apesar da sua fragilidade física.

A mensagem do poema é dupla: por um lado, destaca a inevitabilidade do envelhecimento e da passagem do tempo; por outro, celebra a capacidade dos mais velhos de encontrar alegria e propósito na companhia dos mais jovens. A avó, através das histórias que conta, passa adiante a cultura e os valores da família, garantindo que a sua sabedoria e amor perdurem através das gerações.

 

sexta-feira, 28 de junho de 2024

Dia de anos, João de Deus


 

DIA DE ANOS

 

Com que então caiu na asneira
De fazer na quinta-feira
Vinte e seis anos! Que tolo!
Ainda se os desfizesse…
Mas fazê-los não parece
De quem tem muito miolo!

Não sei quem foi que me disse
Que fez a mesma tolice
Aqui o ano passado…
Agora, o que vem, aposto,
Como lhe tomou o gosto,
Que faz o mesmo. Coitado!

Não faça tal; porque os anos
Que nos trazem? Desenganos
Que fazem a gente velho:
Faça outra coisa; que, em suma,
Não fazer coisa nenhuma
Também lhe não aconselho.

Mas anos, não caia nessa!
Olhe que a gente começa
Às vezes por brincadeira,
Mas depois se se habitua,
Já não tem vontade sua
E fá-los queira ou não queira!

 

João de Deus, Campo de Flores (1830-1896)

 

O poema "Dia de Anos" de João de Deus oferece uma visão satírica sobre a celebração dos aniversários.

Através de um tom jocoso e familiar, o sujeito poético questiona a racionalidade de comemorar o passar dos anos, associando essa prática a tolices e desenganos que apenas evidenciam o envelhecimento.

A estrutura do poema, com as suas rimas emparelhadas e redondilhas maiores, contribui para o tom leve e humorístico, tornando a crítica mais acessível e envolvente.

Em última análise, o poema convida os leitores a refletirem sobre o valor das tradições e a inevitabilidade do tempo, sugerindo que há outras formas mais significativas de aproveitar a vida sem se prender a convenções que podem trazer mais desânimo do que alegria.

 


quinta-feira, 27 de junho de 2024

No comboio descendente, Fernando Pessoa


 

No comboio descendente
Vinha tudo à gargalhada,
Uns por verem rir os outros
E os outros sem ser por nada —
No comboio descendente
De Queluz à Cruz Quebrada...

No comboio descendente
Vinham todos à janela,
Uns calados para os outros
E os outros a dar-lhes trela —
No comboio descendente
Da Cruz Quebrada a Palmela...

No comboio descendente
Mas que grande reinação!
Uns dormindo, outros com sono,
E os outros nem sim nem não —
No comboio descendente
De Palmela a Portimão...

 

s.d.

Quadras ao Gosto Popular. Fernando Pessoa. (Texto estabelecido e prefaciado por Georg Rudolf Lind e Jacinto do Prado Coelho.) Lisboa: Ática, 1965. (6ª ed., 1973).  - 117.

Disponível em: http://arquivopessoa.net/textos/4240

 



Análise do poema "No comboio descendente" de Fernando Pessoa

Estrutura e forma

O poema "No comboio descendente" de Fernando Pessoa é estruturado em três estrofes, cada uma com seis versos. A forma fixa do poema destaca-se pela ênfase na sonoridade das rimas, incluindo as internas. A repetição é um elemento crucial, visível na métrica, no ritmo, na estrutura sintática e nos recursos sonoros, como assonâncias e aliterações.

Função da repetição

A repetição no poema tem o propósito de induzir um estado de sonolência, semelhante às canções de ninar. A repetição sintática e semântica cria um efeito de relaxamento, que acalma e adormece os leitores, como se fossem crianças.

Primeira estrofe: de Queluz à Cruz Quebrada

Na primeira estrofe, o tom é de alegria e animação:

  • Sonoridade vibrante: A aliteração com a consoante /k/ e os encontros consonantais /kr/ e /br/ no verso "De Queluz à Cruz Quebrada" evocam o som e a confusão típicos de uma viagem animada de comboio.
  • Rima interna: A rima entre "Queluz" e "Cruz" reforça a ideia de repetição e alegria entre os passageiros.

Segunda estrofe: de Cruz Quebrada a Palmela

Na segunda estrofe, a atmosfera começa a acalmar:

  • Transição para a calma: A sonoridade indica uma diminuição na agitação, sugerindo que os passageiros estão a acalmar à medida que a viagem continua.

Terceira estrofe: de Palmela a Portimão

Na terceira estrofe, há uma mudança de tom:

  • Quebra da repetição: A estrutura paralela dos versos é interrompida pela expressão "Mas que grande reinação!", usada de forma irónica para indicar que, apesar da frase, a atmosfera agora é de sono.
  • Sonoridade nasal: O último verso "De Palmela a Portimão" destaca sons nasais, que sugerem um ambiente tranquilo e os passageiros adormecidos.

Análise alegórica

O poema não descreve apenas uma viagem de comboio animada e barulhenta, mas também representa alegoricamente o processo de adormecimento:

  • Transição de animação para sonolência: A sonoridade e a escolha das palavras ao longo do poema ilustram a transição da vivacidade para a calma e, finalmente, para o sono dos passageiros.
  • Linguagem infantil: Expressões coloquiais como "reinação" e "dar-lhes trela" evocam uma linguagem simples e infantil, reforçando a sensação de uma canção de ninar.

Conclusão

Fernando Pessoa, no poema "No comboio descendente", utiliza a repetição em múltiplos níveis para criar um efeito tranquilizante. O poema leva o leitor de um estado de alegria e excitação para uma serenidade sonolenta, refletindo o processo de adormecimento. A estrutura sonora e a escolha das palavras contribuem para essa transformação gradual, fazendo do poema uma rica alegoria do cair no sono.

 

Adaptado de: “Fernando Pessoa e Cecília Meireles: o encontro entre poesia e criança”, Alice Martha. Actas do IV Congresso Internacional da Associação Portuguesa de Literatura Comparada – Estudos Literários/Estudos Culturais. Universidade de Évora, maio 2001

 



quarta-feira, 26 de junho de 2024

Eu nasci de ti como a flor da Terra, Matilde Rosa Araújo

Ilustração de Madalena Matoso para O livro da Tila. Editorial Caminho, 2010

 

Nascer

 

Mãe!

Que verdade linda

O nascer encerra:

Eu nasci de ti,

Como a flor da Terra!

 

Matilde Rosa Araújo, O livro da Tila. Lisboa, Livros Horizonte, 1957

 


 

O ato de nascer é um milagre que transcende o físico. É a passagem da escuridão para a luz, do silêncio para o som da vida. A mãe é a guardiã desse segredo, a criadora que nos molda com amor e nos permite florescer. Que bela jornada é essa, a do nascer!

 

Escreve um texto criativo inspirado no poema "Nascer" de Matilde Rosa Araújo. Podes optar por um conto, uma carta, um diário ou até mesmo um poema. Aqui estão algumas ideias para te ajudar a começar:

 

Uma carta à tua mãe: Imagina que estás a escrever uma carta à tua mãe, expressando os teus sentimentos sobre o poema. Fala sobre a relação especial que tens com ela e como o nascimento é uma metáfora para a vossa ligação.

 

Um conto sobre o nascimento: Cria uma história onde o nascimento de uma criança é descrito como um acontecimento mágico e poético. Podes personificar a Terra, as flores, e outros elementos naturais para enriquecer a tua narrativa.

 

Diário de uma flor: Escreve uma entrada de diário do ponto de vista de uma flor que acabou de nascer da terra. Descreve as suas primeiras impressões do mundo, a relação com a "mãe Terra", e as suas esperanças e sonhos.

 

Um poema sobre o nascimento: Inspira-te no poema de Matilde Rosa Araújo para escrever o teu próprio poema sobre o ato de nascer, sobre a conexão profunda entre mãe e filho.

Se necessário, segue as seguintes sugestões:

·       O Silêncio da Origem: Descreve a escuridão do útero, onde o bebé se desenvolve. Usa metáforas para expressar essa sensação de proteção e mistério. Explora a ideia de que o silêncio é a primeira linguagem que o bebé conhece.

·       O Despertar: Fala sobre o momento em que o bebé começa a sentir os primeiros movimentos, como se estivesse a despertar para a vida. Usa imagens sensoriais para descrever essa transição do escuro para a luz.

·   A Mãe como Criadora: Compara a mãe à Terra, que nutre e faz brotar a flor. Ela é a origem, o solo fértil onde a vida floresce. Destaca a beleza desse processo de criação, como se a mãe fosse uma artista que molda o filho com amor e cuidado.

·      O Laço Inquebrável: Aborda a ligação entre mãe e filho. Como o poema sugere, o filho nasce “de” sua mãe, mas também “como” a flor da Terra. Usa metáforas para expressar essa conexão profunda e inquebrável.

 

Lembra-te de ser criativo e pessoal na tua escrita. Usa as tuas próprias experiências e emoções para dar vida ao teu texto. Bom trabalho!

 


terça-feira, 25 de junho de 2024

A Arca de Noé, Vinicius de Moraes

Arca de Noé, ilustração de Marta Madureira (2012) 

 

 

A ARCA DE NOÉ

Sete em cores, de repente
O arco-íris se desata
Na água límpida e contente
Do ribeirinho da mata.

O sol, ao véu transparente
Da chuva de ouro e de prata
Resplandece resplendente
No céu, no chão, na cascata.





E abre-se a porta da Arca
De par em par: surgem francas
A alegria e as barbas brancas
Do prudente patriarca

Noé, o inventor da uva
E que, por justo e temente
Jeová, clementemente
Salvou da praga da chuva.

Tão verde se alteia a serra
Pelas planuras vizinhas
Que diz Noé: "Boa terra
Para plantar minhas vinhas!"

E sai levando a família
A ver; enquanto, em bonança
Colorida maravilha
Brilha o arco da aliança.

Ora vai, na porta aberta
De repente, vacilante
Surge lenta, longa e incerta
Uma tromba de elefante.

E logo após, no buraco
De uma janela, aparece
Uma cara de macaco
Que espia e desaparece.

Enquanto, entre as altas vigas
Das janelinhas do sótão
Duas girafas amigas
De fora as cabeças botam.

Grita uma arara, e se escuta
De dentro um miado e um zurro
Late um cachorro em disputa
Com um gato, escouceia um burro.

A Arca desconjuntada
Parece que vai ruir
Aos pulos da bicharada
Toda querendo sair.

Vai! Não vai! Quem vai primeiro?
As aves, por mais espertas
Saem voando ligeiro
Pelas janelas abertas.

Enquanto, em grande atropelo
Junto à porta de saída
Lutam os bichos de pêlo
Pela terra prometida.

"Os bosques são todos meus!"
Ruge soberbo o leão
"Também sou filho de Deus!"
Um protesta; e o tigre - "Não!"

Afinal, e não sem custo
Em longa fila, aos casais
Uns com raiva, outros com susto
Vão saindo os animais.

Os maiores vêm à frente
Trazendo a cabeça erguida
E os fracos, humildemente
Vêm atrás, como na vida.

Conduzidos por Noé
Ei-los em terra benquista
Que passam, passam até
Onde a vista não avista.

Na serra o arco-íris se esvai...
E... desde que houve essa história
Quando o véu da noite cai
Na terra, e os astros em glória

Enchem o céu de seus caprichos
É doce ouvir na calada
A fala mansa dos bichos
Na terra repovoada.

 

Vinicius de Moraes, A Arca de Noé. Rio de Janeiro, 1970

Disponível em: https://www.viniciusdemoraes.com.br/pt-br/poesia/poesias-avulsas/arca-de-noe

 

A arca de Noé, Editora Sabiá

Divisão interna do texto 

O poema “A Arca de Noé” de Vinicius de Moraes pode ser dividido em momentos lógicos que refletem a sequência de eventos e as imagens criadas pelo autor. Aqui está uma possível divisão:

Momento 1: O Cenário Pós-Dilúvio

Descrição do arco-íris e da natureza que se revela após a chuva.

  • A água límpida e a luz do sol criam um ambiente de renovação e esperança.


Momento 2: A Abertura da Arca

Noé abre a arca, e a descrição foca na sua figura como patriarca e inventor da uva.

  • A terra é vista como fértil e promissora para o cultivo de vinhas.


Momento 3: A Saída dos Animais

Os animais começam a sair da arca, cada um com as suas características distintas.

  • A descrição dos animais é feita com humor e leveza, destacando a diversidade da vida.


Momento 4: O Conflito e a Ordem

Há um momento de disputa entre os animais, simbolizando a luta pela vida e pelo espaço.

  • Eventualmente, os animais saem em pares, estabelecendo uma nova ordem no mundo.


Momento 5: A Nova Vida na Terra

Os animais são conduzidos por Noé para a terra prometida, onde a vida recomeça.

  • O poema termina com uma imagem pacífica da natureza e dos animais em harmonia.

Cada um desses momentos captura uma fase diferente da narrativa, desde a devastação inicial até a promessa de um novo começo para a humanidade e para o mundo natural.


***

Reconto

Reconta, em prosa, a história narrada no poema “A Arca de Noé”, de Vinicius de Moraes.

 

segunda-feira, 24 de junho de 2024

É tão bom uma amizade assim, Sérgio Godinho

 


               É TÃO BOM

 

Vale a pena ver

 

castelos no mar alto

 

Vale a pena dar o salto

 

p’ra dentro do barco

5

rumo à maravilha

 

e pé ante pé desembarcar na ilha

 

Pássaros com cores que nunca vi

 

que o arco-íris queria para si

 

eu vi o que quis ver afinal

 

 

10

É tão bom uma amizade assim

 

Ai, faz tão bem saber com quem contar

 

Eu quero ir ver quem me quer assim

 

É bom para mim e é bom p’ra quem tão bem me quer

 

 

 

Vale a pena ver

15

o mundo aqui do alto

 

vale a pena dar o salto

 

Daqui vê-se tudo

 

às mil maravilhas

 

na terra as montanhas e no mar as ilhas

20

Queremos ir à lua mas voltar

 

convém dar a curva

 

sem se derrapar

 

na avenida do luar

 

 

 

É tão bom uma amizade assim

25

Ai, faz tão bem saber com quem contar

 

Eu quero ir ver quem me quer assim

 

É bom para mim e é bom p’ra quem tão bem me quer

“É tão bom”, letra de Sérgio Godinho, do álbum Sérgio Godinho canta com os amigos do Gaspar, 1988

 

De acordo com a leitura da letra da canção “É tão bom”, de Sérgio Godinho, classifica cada afirmação que se segue como verdadeira ou falsa. Procede à correção das afirmações falsas.

1. A primeira estrofe usa comparações como "castelos no mar alto" e "dar o salto p’ra dentro do barco".

2. A expressão “dar o salto p’ra dentro do barco” sugere a hesitação e a procura de segurança no interior da embarcação.

3. A expressão "castelos no mar alto" simboliza algo grandioso e distante, representando a coragem e o desejo de explorar e se aventurar no desconhecido.

4. O refrão da canção celebra a importância das amizades e o apoio mútuo.

5. A ilha mencionada na letra da canção representa um lugar de maravilhas e novas experiências.

6. A expressão "eu vi o que quis ver afinal" (verso 9) sugere uma sensação de deceção com as descobertas feitas.

7. A terceira estrofe (versos 14 a 23) sugere que é importante tomar cuidado ao buscar novas experiências para evitar problemas.

8. A menção à lua e à “avenida do luar” (verso 23) adiciona um toque de realismo à música.

 

Respostas:

1. Falso. A primeira estrofe usa metáforas como "castelos no mar alto" e "dar o salto p’ra dentro do barco".

2. Falso. A expressão “dar o salto p’ra dentro do barco” simboliza a coragem de embarcar em novas jornadas e explorar o desconhecido. Ela não sugere hesitação, mas sim disposição para se aventurar.

3. Verdadeiro.

4. Verdadeiro.

5. Verdadeiro.

6. Falso. A expressão "eu vi o que quis ver afinal" sugere uma satisfação pessoal com as descobertas feitas, e não uma sensação de deceção. O sujeito poético encontrou o que procurava e está satisfeito com as suas descobertas.

7. Verdadeiro

8. Falso. As menções à lua e à "avenida do luar" adicionam um toque de fantasia e sonho à música, e não realismo. Elas servem para enriquecer a letra com uma qualidade poética e imaginativa, reforçando os temas de exploração e maravilha de maneira encantada e idealizada. A música utiliza esses elementos para criar um ambiente que é mais sobre aspiração e encantamento do que sobre a realidade prática e quotidiana.

 

domingo, 16 de junho de 2024

Depus a máscara e vi-me ao espelho, Álvaro de Campos


 

Depus a máscara e vi-me ao espelho...
Era a criança de há quantos anos...
Não tinha mudado nada...

É essa a vantagem de saber tirar a máscara.
É-se sempre a criança,
O passado que fica,
A criança.

Depus a máscara, e tornei a pô-la.
Assim é melhor.
Assim sou a máscara.

E volto à normalidade como a um términus de linha.

 

Álvaro de Campos, Poesia, edição de Teresa Rita Lopes,
Lisboa, Assírio & Alvim, 2002, p. 514.

 

QUESTIONÁRIO

1. Explique a importância da máscara na construção da dualidade do sujeito poético, tal como é apresentada ao longo do poema.

2. Depois de tirar a máscara, o sujeito poético opta por tornar a pô-la.

Justifique essa opção, com base em dois aspetos significativos.

3. Considere as afirmações seguintes sobre o poema.

I. O ato de se ver ao espelho sugere o desejo de autoconhecimento por parte do sujeito poético.

II. O sujeito poético anseia voltar a viver o seu tempo de infância.

III. A coexistência de versos longos e de versos curtos contribui para o ritmo do poema.

IV. O recurso às reticências, no verso 3, indicia a frustração sentida pelo sujeito poético.

V. No texto, evidenciam-se características da linguagem poética de Álvaro de Campos, como a liberdade formal e o uso de anáforas.

Identifique as três afirmações verdadeiras.

 

CRITÉRIOS DE CORREÇÃO

1. Explica a importância da máscara na construção da dualidade do sujeito poético, abordando, adequadamente, os dois tópicos de resposta.

- a máscara esconde o Eu associado à infância, num jogo entre ser e parecer/passado e presente, no qual a permanência do Eu passado surge quando a máscara é retirada;

- a duplicidade permite que o sujeito poético mantenha o seu ser autêntico e, simultaneamente, que desempenhe o papel social associado à máscara (optando pela identidade adquirida pela máscara).

 

2. Justifica a opção do sujeito poético por tornar a pôr a máscara, abordando, adequadamente, dois dos tópicos de resposta.

 

- a criança que a máscara oculta representa a vulnerabilidade do sujeito poético associada à infância;

- o Eu sente-se mais confortável quando coloca a máscara, na medida em que a imagem que dá a ver aos outros é a de alguém normal («E volto à normalidade» v. 11);

- a normalidade (o «términus de linha» v. 11) é construída através do recurso à máscara na viagem de autoconhecimento que o sujeito poético realiza, o que implica viver o presente, aceitando as convenções sociais.

 

3. I, III e V.


Fonte: Exame Final Nacional de Português | Prova 639 | 1.ª Fase | Ensino Secundário - 12.º Ano de Escolaridade | República Portuguesa – Educação, Ciência e Inovação / Instituto de Avaliação Educativa, I. P. (IAVE), 2024 (Decreto-Lei n.º 55/2018, de 6 de julho; Decreto-Lei n.º 62/2023, de 25 de julho) – VERSÃO 1


 ***


A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL AO SERVIÇO DA EDUCAÇÃO: explicação sistematizada do poema de Álvaro de Campos que saiu no exame 12.º ano.

1. **Tirar a máscara**

- O autor tira a máscara.

- Olha-se ao espelho.

- Vê-se como era em criança.

- A essência dele não mudou.

2. **Vantagem de tirar a máscara**

- Ao tirar a máscara, redescobre-se a criança interior.

- A verdadeira identidade, pura e intocada, permanece.

3. **Voltar a pôr a máscara**

- O autor decide voltar a pôr a máscara.

- Sente-se mais confortável e seguro assim.

- A máscara torna-se a sua personalidade.

4. **Aceitação**

- Aceita que vai continuar a usar a máscara.

- É assim que consegue viver e funcionar na sociedade.

 

Partilhado por Lúcia Vaz Pedro, in Pulsações Escritas - Facebook, 22/06/2024