Gilbert Garcin, "Le funambule", 2002 |
O
valioso tempo dos maduros
Contei
meus anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui para a frente do
que já vivi até agora.
Tenho
muito mais passado do que futuro. Sinto-me como aquele menino que ganhou uma
bacia de jabuticabas.
As
primeiras, ele chupa displicente, mas, percebendo que faltam poucas, rói até o
caroço.
Já não
tenho tempo para lidar com mediocridades.
Não
quero estar em reuniões onde desfilam egos inflamados.
Inquieto-me
com invejosos tentando destruir quem eles admiram, cobiçando seus lugares,
talentos e sorte.
Já não
tenho tempo para conversas intermináveis, para discutir assuntos inúteis sobre
vidas alheias que nem fazem parte da minha.
Já não
tenho tempo para administrar melindres de pessoas que, apesar da idade
cronológica, são imaturos.
Detesto
fazer acareação de desafetos que brigaram pelo majestoso cargo de
secretário-geral do coral.
As
pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos.
Meu
tempo tornou-se escasso para debater rótulos; quero a essência, minha alma tem
pressa...
Sem
muitas jabuticabas na bacia, quero viver ao lado de gente humana, muito humana,
que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com triunfos, não se considera
eleita antes da hora, não foge da sua mortalidade.
Só há
que caminhar perto de coisas e pessoas de verdade.
O
essencial faz a vida valer a pena.
E para
mim basta o essencial.
Mário de Andrade
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