sexta-feira, 20 de agosto de 2021

Gravador de Chamadas, Paulo Pais


 


Apagou o disco

deitou o café na chávena

a manteiga no pão

compôs o sono com um biscoito ou dois

 

arrastou o pequeno almoço no pijama

demasiado comprido

 

pousou a bandeja prudente

aos pés da cama fingiu não ver o retrato

(não era obrigado a cumprimentar os mortos)

a mulher dormia galgando o espaço

 

o que seria melhor para o seu cansaço?

 

Paulo Pais, Gravador de Chamadas. Porto, Campo das Letras – Editores, S. A., 1997, p. 37 (Coleção “O Aprendiz de Feiticeiro” dirigida por José Cruz Santos)

 

* * *

 

As nuvens varriam restos do sol

para lá dos montes

o azul da noite acordava o frenesim dos bichos

 

sacudiram as finas pregas da chuva

chamaram o gato que bebia o último sol do dia

por entre as frinchas da água

 

entraram em casa secaram as roupas

lembrados ainda da visita dos pássaros

 

nada está dito

resta um fio de vidro no seio dos dedos

 

Paulo Pais, Gravador de Chamadas. Porto, Campo das Letras – Editores, S. A., 1997, p. 50 (Coleção “O Aprendiz de Feiticeiro” dirigida por José Cruz Santos)

 

 


CARREIRO, José. “Gravador de Chamadas, Paulo Pais”. Portugal, Folha de Poesia, 20-08-2021. Disponível em: https://folhadepoesia.blogspot.com/2021/08/gravador-de-chamadas-paulo-pais.html


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