Em três poemas das suas «Rimas»,
Camões chama às situações sentimentais descritas na sua poesia lírica «verdades
puras». Esta declaração do poeta incentivou desde o século XVII a leitura da
poesia de Camões como confissão autobiográfica, como diário sentimental. A meu
ver, essa interpretação é um equívoco: foi isso que procurei demonstrar na aula
de abertura do FeLiCidade Festival 2024, ontem, 04.05.24, no CCB.
O «Eu» da poesia lírica de Camões
não é o homem real Luís Vaz de Camões (que se declara, nas cartas aos amigos,
frequentador de prostitutas), mas sim uma personagem que, ao declarar-se
platonicamente apaixonado por uma Dama, está a encenar as biografias reais ou
inventadas de poetas anteriores, admirados por Camões.
Horácio, Ovídio, Petrarca e Garcilaso são os modelos nos quais Camões baseia a sua «persona» lírica. Quanto ao termo «verdade», é usado segundo o código da poesia greco-latina, em que «verdade poética» equivale a «qualidade poética». O que se exige da verdade poética é que se pareça com a verdade factual, tal como Horácio afirma no v. 338 da sua «Arte Poética», ao recomendar que «coisas fingidas por causa do deleite sejam próximas das verdadeiras». A minha argumentação segue várias etapas, até chegar a três passagens de «Os Lusíadas», que nos ajudam a perceber melhor o enigma daquilo que Camões entende por «verdade».
“Camões e a
verdade poética | Camões: 500 anos”, Frederico
Lourenço, Coimbra, 05-05-2024
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Frederico Lourenço, Lisboa (CCB), 4/5/2024 |
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