POEMA 30
Na ave que passou
Recolhi o quê?
Deus a levou.
Minha saudade, não:
Essa
Traz de longe e de anos
Uma palha,
Sinal de triste e de sujo
Que ainda uma lágrima valha,
Lá onde a alma começa.
Assim os cães que muito amam
Voltam a casa do dono.
Que perdidos!
O seu amor vagabundo
Os enrosca naquele sono
Cheio do cabo do mundo.
Triste, me sinto ir
Entre a ave e a saudade,
Sem saber preferir.
Tudo largo de mão!
Creio até que perdi a minha idade
E o instinto e silêncio do meu cão.
Na ave que passou
Recolhi o quê?
Deus a levou.
Minha saudade, não:
Essa
Traz de longe e de anos
Uma palha,
Sinal de triste e de sujo
Que ainda uma lágrima valha,
Lá onde a alma começa.
Assim os cães que muito amam
Voltam a casa do dono.
Que perdidos!
O seu amor vagabundo
Os enrosca naquele sono
Cheio do cabo do mundo.
Triste, me sinto ir
Entre a ave e a saudade,
Sem saber preferir.
Tudo largo de mão!
Creio até que perdi a minha idade
E o instinto e silêncio do meu cão.
Vitorino Nemésio, Eu, Comovido a Oeste (1940)
LINHAS DE LEITURA
Considere as seguintes linhas de leitura do poema:
• a ave que passou ‑ o tempo fugaz;
• a saudade que ficou ‑ tristeza e mancha;
• o cão ‑ motivo doméstico da fidelidade do dono (à casa de onde partiu);
• entre a partida e o regresso do filho pródigo ‑ o dilema, o nada.
Plural 12, E. Costa, V. Baptista, A. Gomes, Lisboa Editora, 1999.
SUGESTÕES DE LEITURA
[Post original: http://comunidade.sol.pt/blogs/josecarreiro/archive/2012/08/27/poema30.aspx]
Sem comentários:
Enviar um comentário