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Eu, que
sou feio, sólido, leal, |
1 devasso: libertino; moralmente vergonhoso
2 vexado: envergonhado
3 patriarca: chefe de família
4 botequim: estabelecimento comercial onde se servem cafés e outros; bar
5 turba: magote de gente; multidão
6 exéquias: cerimónias religiosas fúnebres
7 avultava: sobressaía
8 titulares: que tem título de nobreza; que é fidalgo com título
9 ostentação: exibição vaidosa; aparato; pompa
10 chusma: multidão
11 urdia: imaginava
12 esbocetos: pequeno desenho para estudo de obras em ponto grande; esboço
Educação Literária
1. Explique se a figura feminina que é descrita no poema se enquadra no espaço da cidade. Justifique a resposta através de citações textuais.
2. Identifique o evento que ocorre na cidade enquanto o sujeito poético descreve a figura feminina.
2.1 Explique se o eu dá importância a este acontecimento, ilustrando a resposta através de transcrições do texto.
2.2 Identifique a possível crítica subjacente à atitude do sujeito poético em relação a este evento.
3. Tendo em conta as conclusões a que chegou na questão 2, explicite o que pensa o eu do espaço citadino, justificando a resposta através de transcrições textuais.
4. Identifique os sentimentos que a figura feminina desperta no sujeito poético.
Chave de correção
1. A figura feminina que é descrita no poema não se
enquadra no espaço da cidade, como se pode ver pelo facto de se mostrar
«assustada» (v. 2), de ter um vestido simples, de não participar nas «exéquias
d[o] monarca» (v. 24), seguindo antes a «pensar no [s]eu bordado» (v. 26) e de
revelar inadaptação àquele espaço, ao parar «embaraçada / Ao pé dum numeroso ajuntamento.»
(vv. 43-44). Este contraste é expressivamente ilustrado pelo facto de ela se
destacar, na sua brancura, no meio de uma multidão negra — o que pode ser
entendido como uma metáfora de pureza face à degradação da cidade.
2. O evento que ocorre na cidade enquanto o sujeito
poético descreve a figura feminina é o funeral do rei.
2.1. O sujeito poético não dá importância ao
funeral do
rei. Fala-se nas «exéquias dum monarca» (v. 24), e a utilização do artigo indefinido
mostra que a identificação do rei em causa nem sequer é considerada necessária,
o que revela uma profunda indiferença face ao sucedido. No mesmo sentido vai a
referência posterior a «[u]ma estátua de rei num pedestal» (v. 28) (sublinhado
nosso).
2.2. Sugestão de
resposta: A indiferença face ao acontecimento pode ser interpretada como uma consequência do facto de o rei se enquadrar na estrutura
decadente da cidade, tal como a «chusma de padres de batina, / E de altos
funcionários da nação» (vv. 39-40), que, significativamente, é reduzida a um
«bando ameaçador de corvos pretos» (v. 48).
3. O sujeito poético, muito embora esteja parcialmente
integrado no espaço citadino, na medida em que se encontra à «mesa dum café
devasso» (v. 5), a beber «cálices de absinto» (v. 10), tem perfeita noção da
decadência que o mina. É por este motivo que designa a cidade como «Babel […] velha
e corruptora» (v. 7), caracterizando depreciativamente os altos funcionários da
nação e os elementos do clero como «[u]m bando ameaçador de corvos pretos» (v.
48). Com efeito, sente vontade de proteger a figura feminina deste ambiente
degradado («Tive tenções de oferecer-te o braço», v. 8) e, ao vê-la a praticar
uma boa ação, procura imediatamente libertar-se da decadência em que mergulhara
(«Mandei ir a garrafa, porque sinto / Que me tornas prestante, bom, saudável.»,
vv. 11-12).
4. Esta mulher poderá contribuir para que o
sujeito lírico seja redimido, seja salvo da vida decadente em que se afunda, da
vida inútil que se vai esgotando no interior dos cafés, de que ele se
envergonha, tornando-o «prestante, bom, saudável», algo por que ele suspira. Contudo,
no poema, o eu
acaba por distanciar a figura feminina utilizando uma tripla adjetivação que encerra, em si, uma antítese («eu que
sou feio», tu que «és bela», o que permite concluir que o poeta coloca a mulher
numa relação de superioridade em relação a si. No final do poema, esta oposição
é retomada
(tu que «és ténue, dócil, recolhida», «eu, que sou hábil, prático, viril»,
embora aqui de maneira mais suave, em resultado da redenção do «eu» do poeta,
devido à simples presença desta jovem, que lhe provoca o desejo de
mudança.
1. Tendo em conta os seus conhecimentos sobre as funções sintáticas, classifique as afirmações que se seguem como verdadeiras ou falsas, corrigindo as falsas.
(A) O constituinte «feio, sólido, leal» (v. 1) desempenha a função sintática de modificador apositivo do nome.
(B) O constituinte «-te» (v. 8) desempenha a função sintática de complemento indireto.
(C) A oração «que bebia cálices de absinto» (v. 10) desempenha a função sintática de modificador restritivo do nome.
(D) O constituinte «Na fresquidão dos linhos matinais» (v. 16) desempenha a função sintática de modificador da frase.
Expressão oral
1. Considere a estrofe final do poema (vv. 49-52):
«E foi, então, que eu, homem varonil,
Quis dedicar-te a minha pobre vida,
A ti, que és ténue, dócil, recolhida,
Eu, que sou hábil, prático, viril.»
1.1 Na sua opinião, a imagem do homem e da mulher que é transmitida nesta estrofe ainda se adequa à sociedade contemporânea?
Reflita sobre esta questão e prepare um texto de opinião, de quatro a seis minutos, durante a qual apresente o seu ponto de vista em relação a esta questão. Deverá explicitar com clareza a sua opinião, apresentando, no mínimo, dois argumentos, bem como, pelo menos, um exemplo que ilustre cada um deles.
1. Considere a seguinte afirmação:
«A nível social, a cidade significa opressão, e o campo a recusa da opressão e a possibilidade do exercício da liberdade.»
Helder Macedo, Nós — Uma Leitura de Cesário Verde, Lisboa, Dom Quixote, 1986.
1.1 Partindo da afirmação anterior, redija uma exposição, com um mínimo de cento e trinta (130) e um máximo de cento e setenta (170) palavras, no qual se refira à oposição cidade/campo na poesia de Cesário. Deverá fazer alusões concretas aos poemas estudados.
Proceda à planificação do texto e, posteriormente, à sua revisão.
Educação
Literária II
Responda ao questionário
seguinte, justificando sempre as suas afirmações.
1. Identifique
o episódio do quotidiano introduzido neste poema.
2. Localize,
no espaço e no tempo, este episódio.
3. Releve
os elementos que caracterizam o espaço como "corruptor".
4. Refira
os elementos que denunciam a perspetiva do "poeta- narrador" perante
o observado.
5. Estabeleça
os "contrastes" que neste poema são feitos.
6. Destaque
os recursos estilísticos que melhor acentuam esses contrastes.
7. Esclareça,
tendo em conta a poesia de Cesário, o valor pictórico da oposição
"pombinha" e do "bando de corvos".
Chave de correção
1. O poeta observa, sentado a uma mesa de café, "A
Débil", bela, frágil, assustada, que passa indefesa na rua, enquanto uma
multidão, composta por povo anónimo, padres e altos funcionários da nação,
forma um "numeroso ajuntamento". Está-se perante uma cerimónia pública.
2. Este episódio desenrola-se numa cidade, numa "Babel tão
velha e corruptora", sendo que o poeta se encontra "à mesa de um café
devasso", enquanto a "Débil" passa na rua. É um "soberbo
dia", de manhã, daí as referências quer à luz do sol- "claro
sol"- quer à "frescura "dos linhos matinais" que constituem
o vestido da moça.
3. À partida, o poeta define o café em que se encontra como
"devasso" onde bebe "absinto" e, ao avistar a
"Débil", manda retirar a garrafa; depois, refere-se à cidade como
"Babel [...] velha e corruptora". Finalmente, sugere a "proteção
da mãe da moça" que a "guardava [...]" e que "não [...]
morrerá sem que [a Débil] se case”.
4. O poeta assume uma perspetiva subjetiva e sentimental: desde o
início afirma que a rapariga lhe inspira "estima", desejo de proteção
("tenções" de [lhe] oferecer o braço", assim como a sua visão o
torna "prestante, saudável" e lhe inspira, "[o seu] semblante grego",
desejos castos - "uma família, um ninho de sossego". Todavia,
preocupando-se Cesário com o mundo exterior, concreto, objetivo, não resiste à
necessidade de pontuar o seu discurso com marcas de um certo realismo pictórico
- "A Débil" é "fraca e loura; o vestido que traz, branco e fresco
– “a frescura dos linhos matina”, mas também poetiza -"transforma" o
que vê numa outra realidade - à mancha branca do vestido associa uma "pombinha",
à mancha negra da multidão, "um bando de corvos".
5. O primeiro contraste que se estabelece é entre o próprio poeta e
a moça - ele é “feio, sólido, leal", ela, "bela, frágil,
assustada", tem "um corpo que pulsa alegre e brando", é "branca,
esbelta e fina"; ele é um ''homem varonil [...]/ hábil, prático,
viril", ela, ''ténue, dócil, recolhida". Enfim, ele é masculinidade e
força, ela, feminilidade e fragilidade.
Depois, entre o espaço - "a Babel velha e corruptora"
e a mesma moça se nota um contraste - a cidade corrompe, a moça inspira sentimentos
de castidade, de doçura e de estima.
Finalmente, existe um contraste entre a multidão- "o povo
turbulento” e a figura feminina que passa serena - "com elegância e sem
ostentação", perturbada pela presença da multidão - "paraste
embaraçada/ao pé de um numeroso ajuntamento".
6. Para acentuar o contraste entre o poeta e a moça, predomina a
tripla-adjetivação - "feio, sólido, leal", "bela, frágil,
assustada". Da mesma forma se estabelece o contraste entre a "Débil"
e a cidade, ou entre a moça e a multidão. Simbolicamente, o poeta acentua este ú1timo
contraste pela oposição "pombinha"/ "bando de corvos"-
branco-negro; presa-predador.
7. "Pombinha" e "bando de corvos" são dois
símbolos que a "visão transfiguradora" de Cesário - a sua "visão
de poeta"- associa ao andar da moça por entre a multidão. Essa associação
é feita quer pela cor do vestido da moça, quer pela cor das vestes da
"chusma de padres de batina" ou desse "numeroso
ajuntamento" por onde ela passa.
Por outro lado, "o povo turbulento" associado ao
"corvo" enquanto predador, acentua a imagem de que esta moça é uma
presa porque é frágil.
(Escola
Secundária Domingos Rebelo, 2000)
***
Educação Literária III
1. O poeta encontra-se num "café devasso".
1.1. Aponta as influências que
a vida citadina exerce sobre o sujeito poético, atendendo à autocaracterização
e às características da cidade.
2. O eu lírico tem como destinatário uma figura
feminina.
2.1. Identifica o tipo de
mulher presente no poema. Justifica a tua resposta.
2.2. Demonstra
que ela representa valores opostos aos da cidade.
2.3. Reconhece o
Mito de Anteu em Cesário, exemplificando-o com uma citação.
2.4. Com base,
sobretudo, na última estrofe, explica como a aproximação poeta/mulher se torna
possível.
3. Na 6.ª estrofe, Cesário
é o poeta do real e da transfiguração.
3.1. Destaca os
elementos que lhes correspondem.
3.2. Identifica
a figura de estilo que se encontra ao serviço da transfiguração. Justifica a
resposta com citações.
3.2.1. Interpreta
a sua expressividade.
(Escola
Secundária Domingos Rebelo, 1996)
“Eu, que sou feio, sólido, leal
(Cesário Verde)”, José Carreiro. Folha de Poesia, 2015-06-04. Disponível
em https://folhadepoesia.blogspot.com/2015/06/a-debil.html
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- “Para uma síntese da obra de Cesário Verde” - apresentação crítica, seleção, notas e sugestões para análise literária da lírica de Cesário Verde, por José Carreiro. In: Folha de Poesia, 2018-04-22. Disponível em https://folhadepoesia.blogspot.com/2018/04/cesario-verde.html
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