Faz hoje exactamente 44 anos que morreu Ruy Belo.
Muito doente, o Ministério da Educação mandou-o trabalhar numa escola do curso nocturno.
Quando chegava a casa, tinha de se sentar a meio das escadas porque o coração não lhe permitia subir os dois andares de uma só vez.
Tenho tantas saudades dele... Guardo sempre um postal que ele me escreveu quando era leitor de Português em Madrid: de cima abaixo não havia um espaço vazio. De cima abaixo só escreveu "escreve-me, escreve-me, escreve-me....."
Alice Vieira, facebook.com/alice.vieira, 2022-08-08
OS BALCÕES SUCESSIVOS SOBRE O RIO
Os balcões sucessivos sobre o rio
as tesouras de poda nas roseiras
a sonolência lânguida e perversa
esse todo coerente e sobre ele apenas
a abóbada da minha perfeição
é esse o meu convite à desistência
a pena menos pública do mundo nos
lagos das finas flores dos sabugueiros
onde a mulher soltava os cabelos
pra que neles se prendesse o cheiro a erva
Ela tinha um aspecto inesperado
vinha com o vestido cor magenta nos
braços que lhe cresceram sobre a terra
movia-se ao andar como uma barca
Importa-me é o curso do dia e da noite
Vou andar um bocado nos caminhos
é pela hora em que não há ninguém
nudez desprevenida dos meus dias
mas só de noite desço até ao mar após
as sete horas da tarde hora crepuscular
os cheiros confortáveis e antigos
imagens dum lirismo fraudulento
um conforto algum tanto apreensivo
coisas que desde a infância a construíam
Mudo de opinião continuamente
espero o teu regresso pela tarde
e cuidadosamente velo a minha cólera
A vida é para mim pesar de pálpebras
leitura de discursos no outono
na casa abandonada e submetida à chuva
Regresso afinal aos próprios hábitos
sorrisos de mulheres sobre a areia
sou fiel à tristeza e pouco mais
e meto então um lenço num dos bolsos
que cheira ao perfume dos pinheiros
Ave de alarme sou deixem-me só
sou um contemporâneo assisto a tudo
os sinos vesperais nos dias de verão
o cão que passa numa encruzilhada
um cântaro que racha inexplicavelmente
confundido no hálito do mar
a minha saudação aos infantes do medo
crianças que iniciam o andar
Espero por alguém espero pelo sol
pla doçura estival da laranjeira
ando pelos caminhos muito tempo
e passo pelas portas devassadas pelos ventos
em cujos gonzos sopram agonias
E espero de novo a floração da primavera
Não quero nada quero estar presente sobre
as dunas do começo dos pinhais
nesse mundo de medos e animais
onde abri os meus olhos para a luz de agora
E perco todo eu em contrições
ó terra branca e carnal e triste
as minhas madrugadas do sargaço
abertas nos bocejos da neblina
quando o tempo é suave e chega em dunas
à sensibilidade das narinas
nas horas generosas da maré
Ruy Belo,
Despeço-me da Terra da Alegria, Col. O Oiro do Dia, Porto, Editorial Inova,
1977
https://arquivos.rtp.pt/conteudos/ruy-belo/, 1991 |
A ILHA DE ARTUR
Habito na morada do castigo
madura como a areia ou o verão no mar
Eu caminhei nos passos solitários
o sol neste lugar é uma ofensa
Nós nunca cultivámos a amizade
num mar mesmo maléfico e maravilhoso no
triunfo da verdura como um grito nas
vozes às vezes tristes alegres às vezes
meu destino de morte e esquecimento eterno
Essas flores ardentes do verão
ocultas ou nas gretas ou esconderijos
palavras inventadas e selvagens para mim
irmão não só do sol como da lua
são para mim já hoje um ser de lenda
ó minha mãe fantástica pessoa
A casa sempre o viajante há-de voltar muito apesar da
proibição eterna dos amigos da
laranjeira plantada pela lua
olhar límpido aceso da alegria
colar solar que cerca a minha aldeia
pois os mortos não têm já família
Fantásticas crianças estivais
eu salvaguardo a solidão do nome
o sacrifício perversão humana
o coração cristão da crua idade a
respiração loquaz dos vegetais
o vento do outono sobre o mar
o severo momento do crepúsculo
poder inacessível a palavras
ao dia pleno a perfeição da vida
esse reduto último do mar
Os juízos da morte são inexoráveis
nos começos da alta primavera
com a flecha dos dias desferida
e a impunidade ausente a lua
Fantásticos silêncios de verão
grande estuário para um rio em calma
aves marinhas longe em seu descanso
rosa que imita a primitiva rosa
ou pérola que segue a primitiva pérola
a excessiva operação do verão
tudo é demasiado para mim
Frescura das manhãs junto dos cais
ó simples criaturas migratórias
ó pequenas estrelas de dezembro
Silêncio tudo e todos fala-se de mim
Madrid,
24/IV/1977
Ruy Belo,
Despeço-me da Terra da Alegria, Col. O Oiro do Dia, Porto, Editorial Inova,
1977
Ruy Belo, Despeço-me da Terra da Alegria, com um desenho de José Rodrigues, Col. O Oiro do Dia, Porto, Editorial Inova, 1977 (1.ª ed.) |
A FONTE DA ARTE
Homenageio a tua primavera em flor
alma precocemente iluminada
que pões a salvação no mais profundo risco
o silêncio dos olhos sobranceiros
na predestinação da profecia
suavidade um dia em minha morte
com o olhar imerso na tristeza
Povoavam pássaros a noite
tudo era pensamento para mim
e as palavras só vinham depois
Ó meu país longínquo donde venho
nessa nuvem de vida sobre a minha morte
Na manhã combalida do domingo
na primavera dolorosa dos teus passos ruy
ao tempo de uma má reputação
o metro tem a voz de um cordeiro triste
É isso apenas isso e o demais são
a morte e a nascença dos contrários a
fórmula da ternura e do sossego
abismo de ameaças nos seus olhos
regiões insondáveis e inacessíveis
pequeníssimas flores da memória
relâmpago dourado do olhar
os cheiros acres das redondas cavidades
a tua boca de ouro de onde voam as palavras
animadas figuras do meu sonho
os peixes negros e dourados das recordações
olhos brilhantes de animais desconhecidos
coisas que por pensá-las eu as sinto
Os dias diminuem é outono
alguém alguma coisa me virá desse distante bosque
O que dirão de mim o castanheiro
os rostos múltiplos trazidos pela tarde num momento
a verde zebra que nos campos vibra ou
papoila rubra que no céu me sobra?
Mas amo muito mais amo o bem e o mal
os campos no outono moribundo
no meio do inverno a casa acolhedora
estranha companheira dos meus dias
demónio de demência e desespero
ao longo do caminho no outono
O receio da morte é a fonte da arte
Eu amo a embriaguez vasta dos espaços
a canção inquieta do amor as
alturas coloridas do outono
Não se pode dizer muito melhor
na monstruosa veemência dos sentidos
e sinto-me perdido de tristeza
entre esses longos nomes das mulheres casadas
Houveram morte às minhas mãos as cartas
os aviões nos distribuem por países
saem de um centro partem nas mais várias direcções
farejam na distância os seus destinos
retalham-nos o espaço em sulcos divisórias
Por onde corre agora a fonte das suaves raparigas?
Ficou na casa o meu lugar vazio
levo a desgraça como um braço ao peito
e árvores ao vento neste dia
e sombra ao sol deste meu dia
Queimam as folhas no parque del oeste
o tecto é baixo o sol está quase a pôr-se
tenho nas minhas mãos três notas do país amado
Esta manhã falavam-me de málaga
e de súbito no meio desta névoa
abriu-se o céu de há anos no verão
Éramos tão jovens nesse tempo
que não sabíamos sequer que nos amávamos assim
e discutimos junto ao porto e regressámos separados
ao hostal onde estávamos aboletados
E tu de olhos no chão reflectias o vulto entre as águas
e não havia os filhos éramos os dois apenas
mas enfim foi há pouco posto que inda hoje brilha
a moeda nesse ano posta em circulação
e que acabo de ter nas minhas mãos no bar
Não me farto de contemplar
o braço esquerdo e a perna direita
que cortados de mim não me pertencem mais
Tu foste sempre reino sobre ti
e o meu desejo é seguir do alto o tejo
Que depressa se esfuma uma cidade no ar
não são sequer as nuvens nem o vasto espaço
basta um golpe de asa que roçando limpe
o pára-brisas próximo horizonte
Pensar é estar alguma coisa a mais
pensar é o que sobra da respiração
pensar é o que não nos leva às coisas
pensando se antecipa a própria morte
O receio da morte é a fonte da arte
Madrid,
24/IV/1977
Ruy Belo, Despeço-me da Terra da Alegria, Col. O Oiro do Dia, Porto, Editorial Inova, 1977
Ruy Belo, Despeço-me da Terra da Alegria, com um desenho de José Rodrigues, Col. O Oiro do Dia, Porto, Editorial Inova, 1977 (1.ª ed.) |
DESPEÇO-ME DA
TERRA DA ALEGRIA
Os pássaros da
noite povoavam
as tílias desta
minha solidão
O juízo severo
dos seus olhos
de olhar onde
cabia o pensamento
a luz e a
sombra de uma geração
precariamente
iluminavam uma alma
que punha a
salvação no mais profundo sono
Um castanheiro
filho descuidado do meio-dia
de uma ramagem
lenta e ondulante
sorria com
sorrisos litorais
em um jardim em
flor do meu desejo
Homenageio
aquela primavera
primeira
primavera da amizade
Tudo era pensamento
para ele mesmo até
caminhos que
não levam a qualquer
parte sabida ou
sequer desconhecida
Belo país da
arte eu te saúdo
as imagens
levantam-se no ar
e um mundo
litúrgico somente imaginado repovoa
as sendas dos
amantes verdadeiros
onde as
palavras só vinham depois
Põe só a tua
mão perto de mim sob os
lobos de pedra
em cada capitel
Oceanos de
olvido na memória
esse país
longínquo donde venho
nuvem de vida
sobre a minha morte
Apaga o tempo
de uma má reputação
anos de
inquietação de espanto de vergonha
estrela da
minha infância ergue-te de novo
tu que eras
para mim o sol a lua
deslumbrante
manhã da existência
País onde me
leva o meu apelo
sonhos de dia
sonhos de mulher
o gosto do
açúcar e do sal
uns olhares de
sombra e de mistério
o sentido e o
símbolo dos sonhos
Os peixes
negros e dourados das recordações
olhos
brilhantes de animais desconhecidos
pequeníssimas
flores da memória
relâmpago
dourado do olhar
Os cheiros
acres das redondas cavidades
alguma boca de
ouro de onde voam as palavras
animadas
figuras do meu sonho
abismo de
ameaças nalguns olhos
regiões
insondáveis e inacessíveis
o espanto
provocado pelo crime
libertação
total e harmonia
a superfície
lúcida dos sonhos
os rostos
múltiplos trazidos num momento
palavras
luminosas para mim
O que dirá de
mim o castanheiro do outono
a estação do
que passa e se desfaz
Esqueci a minha
infância e não sei nada
Estou à sombra
e espero alguém virá
sombria melodia
do meio-dia
o perfume dos
campos cavalgados
na quente luz
do dia em que eu vivia
Alguém me
chegará desse distante bosque
onde eu errei a
minha juventude
nas formas
levemente tacteadas pelos dedos
Não me demoro
ou moro em sítio algum
já nada
significam as palavras
neste deserto
onde vigilo e estou desperto
terrivelmente
só dentro da noite. Ali
no silêncio
profundo da floresta ao
teu singular
olor de singular mulher
crucifiquei a
minha juventude
A vida tem
aspectos criminosos como
a subida da
chama silenciosa
na haste da
mulher que se procure
Não há nenhum
regresso nos meus passos
a lua era outra
lua de hora a hora
a natureza
espera-me faz-me sofrer
troncos
incendiados no outono
depois
adormecidos no inverno
o aspecto
humano de uma terra cultivada
Melodia da voz
que abre os corações
pássaro
disparado pelos ares
a gratidão que
segue a solidão
tudo aquilo era
belo e era bom
sabia a
alimentos e a paz
a homens a
calor a infância e lar
Ela trazia amor
nas suas mãos
Sorri sofri a
noite era já negra
o amor é coisa
débil fugitiva
onde não cabem
coisas sedentárias
Agora
arrebatado e empreendedor
ingénuo como um
jovem mas depois iniciado
e requintado e
até calculador
olhar sentir
cheirar e tactear
diversamente
cada uma das mulheres
na sua
irredutível singularidade
As noites já
começam a ser frescas
será pelos
começos do outono
o vento do
outono é agora húmido
há um silêncio
até ao fim do mundo
às vezes quando
falas tudo neva sobre
as folhas longo
tempo revestindo
as árvores
durante o dilatado outono
somente agora
verdadeiramente moribundo
com as
primeiras neves do inverno
demónio de
demência e desespero
estranha
companheira dos meus dias
E a solenidade
das noites do inverno
descia no meu
corpo solitário e nu quando me
sentia longe
das habitações humanas
da casa
acolhedora ao cimo do inverno
A fome
murmurava no meu corpo
O meu desejo
ardente de salvar-me de
cantar os
velhos salmos no altar do mundo
ameaçado mísero
e pequeno um
círculo
rodeando o coração
desânimo da
morte amargurada
debaixo da
folhagem já apodrecida
através das
diversas estações
de olhos
divididos por florestas
de narinas
abertas pra balsâmicas violetas
bebendo as
montanhas e as nuvens
e a quente
intimidade sobre a terra
Acordaram-me os
ramos de um salgueiro
os dias das
imagens transbordantes
Na embriaguez
vasta dos espaços
na solidão
desértica da alma
o meu amor
profundo pela arte
o meu ódio selvagem
contra mim
Nós mudamos de
heróis e pouco mais
só eu mais
maduro e seguro de talento
não tenho paz
alguma a teu respeito
ó virgem
vagarosa e concentrada
de um rosto
calmo belo e impassível
ó vida ó minha
primitiva mãe
inacessíveis
profundezas da lembrança
ó volúpia da
noite ó minha morte
e na sua pureza
a sua essência
e simplesmente
a minha humana mão
o jogo da
ambição um simples jogo
Na refrescante
primavera primitiva
ternura
maternal e melancólica
e logo após o
sentimento frágil
naquele êxtase
breve e fugitivo
que é inerente
ao acto do amor
a solução em sombra
dessa face luminosa
que brilha um
breve instante numa vida
a solidão
desértica do espírito
o símbolo
sagrado do amor
O gozo áspero
do vasto perigo
modulação
suavíssima das faces
não cessará de
abrir a Hordas minhas mãos
E depois disso
a neve logo cobre
aquela boca de
fim de verão
como esses
frescos peixes prateados
olhos dourados
ansiosos fixos
que à morte se
abandonam resignados
Hei-de saborear
o mundo o seu horror
fealdade beleza
e harmonia
ver passar o
inverno e o verão
e sentir solidão
e alegria
Quando por
vezes paro de cantar e vejo
uns
deslumbrantes ombros femininos de
gigantescas
estrelas nos cabelos
quero sentir-me
atado ao respirar da casa
Ver-me sensível
para com as estações
irmão somente
de inocentes animais
ao sol ao
nevoeiro à chuva à neve
ser no meu
coração uma criança
viver num mundo
sempre renascente
ser consciente
desta vida instável
saber que em
meio dos espaços infinitos
circula em mim
uma porção de sangue quente
sentir em mim a
marca da puerilidade vagabunda
familiar da
morte a cada passo
E a mãe eterna
de olhos de medusa
atravessava o
país dos mortos
no canto alegre
e grave dos seus passos
Olho a marcha
da morte no teu rosto
um frémito
ligeiro passa em tua pele
Vi a sonhar a
égua da infância
Chegou enfim o
tempo do adeus
Oiço a canção
efémera das coisas
despeço-me da
terra da alegria
já reconheço a
música da morte
Severos surdos
saem os meus sons
destino humano
instável enfim móvel
O seu pequeno
pé o seu pescoço branco
reflexo de ouro
tão propício ao sono
e música de
outono e de abundância
o seu rosto
real era recusa
Pelas alturas coloridas
do outono canto
a canção
inquieta do amor
cabeleira
precursora do amor
amor misterioso
e perigoso
nada mais do
que triste triste apenas
ó mulher loura
sorridentemente dou-te
um beijo alto
como um sacramento
A despedida
súbita do sol
despedida dos
dias e estações
crepúsculo
propício ao adeus
a esta vida
frágil é que aspiro
triunfo sobre a
vida fugitiva
ave entregada
ao decisivo voo
pensamentos de
terna nostalgia
jardim de
harmoniosos pensamentos
dou-te de toda
a alma o nome da ausente
árvore em flor
no bosque fonte no deserto
Praia da Consolação, 10/VII/1975
Ruy Belo,
Despeço-me da Terra da Alegria,
Col. O Oiro do Dia, Porto, Editorial Inova, 1977
Ruy Belo retratado por Antero Guerra, 2014 |
AUTO-RETRATO
Estado civil casado
nacionalidade portuguesa
triste se alegre e sorridente quando triste
muito mais egoísta se se veste de altruísta
chefe só de família olhar cansado
calva prometedora e tendência obesa
à beira dos quarenta anos de idade
e ajoujado ao peso de vários passados
tímido e trágico e capaz de crueldade
tanta quão tamanho o arrependimento
temendo hoje não tanto já fazer o mal
como fazer algumas ou pior uma só vítima
incoerente e instável ora dado a bons bocados
como logo açoitado pelos ventos dos cuidados
poeta para mais por condição
homem que só pensar sabe afinal fazer
que vive a arte o amor a vida até como destruição
digam vossas mercês como devia ele ser
pois sempre assim seria inútil mesmo renascer
Madrid,
1972
Escultura "Ruy Belo" (por Francisco Simões), no Parque dos Poetas em Oeiras, Portugal |
[UM DIA ALGUÉM NUMA GRANDE CIDADE LONGÍNQUA DIRÁ QUE MORRI]
Um dia alguém numa grande cidade longínqua dirá que morri
di-lo-á decerto com pena mas sem o alívio que eu próprio
decerto senti
primeiro ao solucionar de vez esse problema de respiração
que a vida é
desde a convulsão da criança que a meio
do copo deixou ir leite para a traqueia
até à instantânea atrapalhação do mergulhador a quem de
súbito falta o ar comprimido
só dispõe da reserva e lhe faltava tanto que ver no fundo
sonhador do mar
depois senti alívio porque às cegas a meio por exemplo da
aragem na face
eu pensava na morte
como problema metafísico a resolver pelo menos com higiene
se não com dignidade com acerto como mais um problema à
medida do homem
Eu estava do lado dos vivos estou do lado dos mortos
o grande problema era saber se me doía ou se não me doía
agora nem sei se me doeu ou não ou fui um mero espectáculo
de mau gosto
para a única pessoa encarregada de me ajudar nesse momento
Ninguém a princípio terá sabido que eu morrera só minha
mulher avisada de longe virá e me porá a mão sobre a testa
os demais não não disponho do olhar para me defender
o tempo depressa se passa são trâmites legais até me terem
deixado
debaixo do chão bem debaixo do chão sem frases lidas
ou gravadas sem sentimento nenhum
Uns dias depois um pequeno grupo junto a uma grande janela
olhará a neblina da manhã de janeiro
e terá mãos que eu tive para os meus problemas de vivos
Onde eu estive sobre uma mesa com uma perna cruzada
suaves começarão a suceder-se e acumular-se os dias
como cartas revistas linguísticas ou livros adormecidos
despertos apenas no momento fugaz da leitura
A vida será indistinta virá até nós como árvores
rodará em volta como um lençol até cobrir-nos os ombros
Falareis de mim não posso impedir que faleis de mim
mas já nada disso me pesa como o simples facto de ter de ser
vosso amigo
Estou só e só para sempre e só desde sempre
mas antes por direito de opção. Agora não
Deixaram-me aqui doutor em tantas e tão grandes tristezas
portuguesas
e durmo o sono das coisas convivo com minerais preparo a
minha juventude definitiva
Era como eu esperava mas não posso dizer-vos nada
pois tendes ainda o problema e a cara da pessoa viva
Consolação,
12-30 dia 15/IV/74
Ruy Belo, “Dispersos” in Todos
os poemas – 4.ª ed. - Porto: Assírio & Alvim, 2014. -
894 p.: il. ; 23 cm. - (Obras de Ruy Belo). - Bibliografia, p. 875-880. - ISBN
978-972-37-1417-3
Homem de palavras: Ruy Belo de A a Z
Amizade. E amor. E árvores, “principalmente as que
dão pássaros”. Detenhamo-nos na amizade, celebrada pelo poeta de um modo aberto
e inequívoco, sem defesas: “Nos dias de hoje ou nos tempos antigos/ não preciso
de menos que todos os meus amigos”. Os versos são de “À Memória da Céu”. Mas há
mais, num poema como “Peregrino e Hóspede Sobre a Terra”: “O meu país são todos
os amigos/ que conquisto e que perco a cada instante”. A amizade do poeta não
era teoria. Era convívio. Era memória. Fazia-se da mesa e da partilha, semeada
no seu passado rural, lembrado nestes versos de “O Jogo de Chinquilho”: “Até
este café onde sentado olho e penso por olhar/ é afinal o mesmo onde bebi a
meias com meu pai/ a primeira cerveja uma cerveja vinda/ através do calor do
dia de verão”.
Beleza. O esteta Ruy Belo ia buscar inspiração à
Natureza, ao Verão, ao mar, a artes várias, da arquitectura à música, da
pintura à escultura. Em Óbidos está aberta ao público uma exposição de
fotografias da autoria de Duarte Belo, seu filho, de peças de cerâmica que
povoavam a casa da família. Se quisermos destacar uma arte que entrou pela sua
poesia dentro foi o cinema. Dois poemas paradigmáticos dessa relação. “Na morte
de Marilyn” e “Esplendor na relva”, título de um dos seus filmes favoritos.
Consolação. O mar era paixão
assumida. “Não sei se gosto mais do mar/ se gosto mais da mulher/ Sei que gosto
do mar sei que gosto da mulher” (“Uma Forma de Me Despedir “). A praia da
Consolação, em Peniche, era uma das praias onde passava os verões em família e
com os amigos. Outra era a praia da Senhora da Guia, em Vila do Conde. Não
foram raras as vezes em que arriscou a vida ao nadar em mares bravios. Numa
delas chegou a entrar em coma. Quando dele saiu, vindo de algas e corais,
escreveu a “Fala de um Homem Afogado ao Largo da Senhora da Guia no Dia 31 de
Agosto de 1971”.
Deus. Depois deus. Após ter vivido o que
classificou como uma “aventura mística”, foi-se transformando num dos “vencidos
do Catolicismo”, consagrados num poema dedicado a um conjunto de católicos
progressistas, do qual faziam parte figuras como João Bérnard da Costa e Pedro
Tamen. “Nesta vida é que nós acreditamos/ e no homem que dizem que criaste/se
temos o que temos o jogamos/ ‘Meu deus meu deus porque me abandonaste?”.
Espinho. Ruy Belo era um autor que nomeava, no
plano literário, o chão concreto que pisava. Espinho transformou-se no lugar de
“Literatura Explicativa”, poema no qual afirma numa espécie de jogo que o ciclo
dos dias diz mais do que aparenta: “O pôr-do-sol em espinho não é o
pôr-do-sol/nem mesmo o pôr-do-sol é bem o pôr-do-sol”. Acaba por ser mais uma
reflexão sobre a passagem do tempo e o fim de tudo.
Futebol. “A poesia é, por natureza, difícil. Como o
futebol”. Disse-o numa entrevista que se pode encontrar no volume “Na Senda da
Poesia”. O futebol era uma das paixões do poeta, afecto que partilhava com José
Medeiros Ferreira na elitista Faculdade de Letras de Lisboa. Ambos liam o
jornal “A Bola” e Belo, era, na qualidade de defesa central da equipa da
Faculdade, um jogador implacável, pelo qual poucos passavam.
Gulbenkian. É uma instituição que lhe
foi e é importante. Quando voltou de Roma, em 1961, recebeu uma bolsa com fins
académicos. Em 2011, nos 50 anos da publicação de Aquele Grande Rio Eufrates,
realizou-se na Fundação um encontro organizado por Paula Morão, Nuno Júdice e
Teresa Belo.
Humor. O Homem de Palavra(s) é lembrado sobretudo
como um “fugitivo da catástrofe” que trazia a morte sempre consigo. Uma leitura
menos superficial dos seus poemas neles encontrará versos igualmente
construídos com um humor ora irónico ora amavelmente satírico. O pequeno
“Epígrafe para a nossa solidão” é um deles: “Cruzámos nossos olhos em alguma
esquina / demos civicamente os bons dias:/ chamar-nos-ão vais ver
contemporâneos”. Mas há mais divertimento espalhado na sua lírica. Em versos
como estes: “Se nem resolvi ainda o problema da unha do dedo mínimo/ como
pretender ter resolvido o mínimo problema?”; “a minha grande esperança é o
café”; “que alegria ser poeta português/ Portugal fica em frente”.
Infância. “Somos crianças feitas para grandes
férias”. A poesia de Ruy Belo é marcada pela sua infância, passada em São da
Ribeira, freguesia do concelho de Rio Maior, com actividades como “o jogo do
berlinde o trinta e um pedradas/ nas cabeças nos ninhos nas vidraças”. No poema
“O Jogo do Chinquilho” escreveu sobre a possibilidade de reviver uma felicidade
primordial: “Renasce neste largo a minha infância/a minha vida tem aqui nova
nascente/ e jorra de repente com o ímpeto do início”.
Juventude. É um dos temas
fundamentais da sua poesia. A juventude como tempo que se perdeu, como paraíso
do passado. “E Tudo Era Possível”, de “Homem de Palavra(s)”, é um poema sobre
esses irrecuperáveis dias juvenis, mas não deixa de ser um texto luminoso. Abre
assim: “Na minha juventude antes de ter saído/ da casa de meus pais disposto a
viajar/ eu conhecia já o rebentar do mar/ das páginas dos livros que já tinha
lido”.
Liberdade. Tinha ficha na PIDE.
Colaborou em O Tempo e o Modo, tomou posição na crise académica de 1962,
assinou em 1965 o manifesto dos 101 católicos a favor do Manifesto da Oposição
Democrática e, em 1969, candidatou-se, com nomes como Mário Soares, Gonçalo
Ribeiro Teles e Francisco Sousa Tavares, como deputado por Lisboa nas listas da
CEUD (Comissão Eleitoral de Unidade Democrática) às eleições para a Assembleia
Nacional. No poema “O Urogalo” (“Transporte no Tempo”) escreve que “o urogalo
vive solitário e livre e/ a solidão e a liberdade condição de vida/podem custar
a vida àquele que vive/ mas isso não importa”.
Mulher. Em “Uma Forma de Me Despedir” revelou uma
dúvida: “Não sei se gosto mais do mar/ se gosto mais da mulher/ Sei que gosto
do mar sei que gosto da mulher”. As musas vão comparecendo na poesia daquele
que celebrou as “suaves raparigas”. Sem elas não teria escrito alguns dos mais
densos poemas de temática amorosa como “Solene Saudação a Uma Fotografia” ou
“Encontro de Garcilaso De La Vega Com Dona Isabel Freire, em Granada, no Ano de
1526”. Ou “Muriel”, belíssima consagração poética de uma impossibilidade
amorosa: “Tu és a mesma mas nem imaginas/como mudou aquele que te esperava”.
Noite de Madrid. “Na Noite de Madrid” é o
título de um poema em que Belo relata o momento em que viu um homem morto no
asfalto quando “os vivos” voltavam dos bares “com música nos olhos”. Fixa um
tempo decisivo na sua vida, altura em que, entre discotecas e espectáculos,
realizou os excessos que não praticara quando era novo. Foi sentindo cada vez
mais a solidão de uma cidade que ficava demasiado longe do mar. Recriando uma
formulação sua, ele vinha para a vida e deram-lhe dias.
Opus Dei. Quando foi para Coimbra estudar Direito
começou a ter contacto, através de encontros culturais, com a Opus Dei, na qual
permaneceu durante dez anos. Assumiu os cargos de director literário da
Editorial Aster e de chefe de Redacção da revista Rumo. Com o tempo começou a
considerar a organização opressora da sua vocação de escrever.
Portugal. Um dos seus poemas mais conhecidos e
repetidos por figuras de diferentes quadrantes políticos e sociais é “Portugal
Futuro”, um país “aonde o puro pássaro é possível”. Este é um território
imaginado, bem distante daquele que lhe causava mal-estar e onde lamentava ter
nascido, fixado no verso que abre “Morte ao Meio Dia”, “No meu país não
acontece nada”, mais tarde reproduzido por José Cardoso Pires em “Alexandra
Alpha”.
Queluz, Monte Abraão. Foi o lugar onde viveu
com a sua família numa casa – e sabemos, através de um conhecido poema, o
quanto valorizava as casas e a intimidade. Junto à porta do prédio onde viveu
entre 1970 e 1978 existe agora uma placa, numa iniciativa da União de
Freguesias de Massamá e Monte Abraão.
Rio Eufrates. Aquele Grande Rio
Eufrates, saído em 1961, foi o debute editorial de Ruy Belo. O título
inspira-se numa passagem do Apocalipse, XVI, 12 — “E o sexto anjo derramou a
sua taça sobre aquele grande rio Eufrates” — e é o mote para um livro no qual é
evidente uma demorada conversa com a Bíblia. Nas suas palavras, escreveu os
poemas “nos breves intervalos de um silêncio durante muitos anos imposto”,
revelando que a sua respiração poética era mais forte do que qualquer tentativa
de agrilhoamento.
Sono. O sono – ou a falta dele – era uma questão
para Ruy Belo. A “peste da insónia” fatigava-o e obrigava-o a tomar
barbitúricos. É de dizer que sem a insónia não teria escrito muito dos seus
poemas, aqueles longos poemas onde aliava uma capacidade de tocar nas grandes
feridas mantendo sempre uma técnica seguríssima, de muitos recursos
estilísticos. Também se podia escolher aqui a palavra sentimento. Que não haja,
no entanto, enganos em fazer interpretações literárias e rimas biográficas
demasiado directas. “Não costumo por norma dizer o que sinto/ mas aproveitar o
que sinto para dizer qualquer coisa”.
Teresa Belo. Apaixonou-se por Maria
Teresa Carriço Marques, nascida em Vila do Conde, numa altura em que ambos eram
alunos da Faculdade de Letras de Lisboa. Teresa Belo, como se tornou conhecida
entre os seus, a sua “musa discreta”, com uma “graça inesperada”, “expressão
sempre surpreendente da surpresa”. A pessoa que lhe deu a liberdade de que
necessitava para se cumprir por inteiro, sem restrições, como escritor. Em 1966
casaram e tiveram depois três filhos, Diogo, Duarte e Catarina. A cerimónia do
casamento contou com um pormenor burlesco, revelador da personalidade do poeta.
Ruy terá chegado tarde à igreja porque se deixara ficar, distraído, na pensão,
a olhar o mar.
Universidade. Além do poeta, também
existiu o Ruy Belo académico. Tirou duas licenciaturas – uma em Direito, outra
em Letras – e doutorou-se ainda muito novo. Em 1971, depois de não ter sido
colocado como professor universitário em Portugal, foi para Madrid com a missão
de se tornar leitor de português na Universidade Complutense. De regresso ao
seu país, em vez de ir para o ensino universitário, tendo em conta a
profundidade e sistematização dos seus conhecimentos culturais, foi obrigado a
dar aulas no ensino nocturno de uma escola secundária. A sua própria escrita
foi sempre antecedida de muito estudo dos processos literários – e disso são
prova as inúmeras anotações que fez nos seus cadernos.
Vida. Registou em “Não Sei Nada” uma reflexão
radical: “A minha vida passou para o dicionário que sou. A vida não interessa.
Alguém que me procure tem de começar — e de se ficar – pelas palavras”.
Declarou que a vida, “esse processo que perdi”, não lhe interessava e que era
na poesia que morava o sentido. Mas sem a sua vulnerabilidade à vida não seria
o poeta que foi (“temi amei preocupei-me com problemas fui feliz vivi a vida
emocionei-me”). A sombra perpassa a sua poesia mas sempre como contraponto das
possibilidades da vida que o poeta sentia na sua máxima intensidade. “O receio
da morte é a fonte da arte”.
Xixi. Sim, xixi. No mar. Em “Na Praia” Belo,
fazendo prova do seu picaresco sentido de observação, escreveu sobre um
desporto muito praticado e pouco nomeado. Escolheu o ch mas podia ter escolhido
o x, sem ferir o bom português: “Raça de marinheiros que outra coisa vos
chamar/ senhoras que com tanta dignidade/à hora que o calor mais apertar/
coroadas de graça e majestade/ entrais pela água dentro e fazeis chichi no
mar?”.
Y, de Ruy. O y com que se
apresentava como escritor e que o distinguia do cidadão Rui de Moura Belo que
nasceu a 27 de Fevereiro de 1933 em São da Ribeira e que morreu em Queluz,
Sintra, a 8 de Agosto de 1978. O y de um poeta que dialogou com Fernando Pessoa
(“Pessoa é o poeta vivo que me interessa mais”) e se dirigiu a Herberto Helder,
em “Vat 69”, ao mesmo tempo que assumia que “a eternidade é não haver papéis”.
Zenha. Depois de, em 1958, se ter doutorado em
Roma em Direito Canónico, foi convidado por Francisco Salgado Zenha para lidar,
no seu escritório, com casos de dissoluções matrimoniais, nas quais era
importante ter alguém que soubesse do assunto. Escrevia as alegações em latim.
De pé, como lembra o advogado Duarte Teives. E como no poema. “A natureza é
certo muito pode mas um homem de pé pode bem mais”.
Nuno Costa Santos, 2016-10-01
CRONOLOGIA DE RUY BELO
1933
Nasce
Rui de Moura Ribeiro Belo, a 27 de fevereiro, em São João da Ribeira, concelho
de Rio Maior e distrito de Santarém, na casa que hoje tem o seu nome. Terceiro
filho de Joaquim Ribeiro Belo e Adelaide Correia de Moura, professores na
Escola Primária de São João da Ribeira.
1939
Inicia
os escudos primários como aluno de seus pais.
1943
Ingressa
no Liceu Nacional de Santarém.
1951
Conclui
os escudos liceais, com média de 17 valores, recebendo o prémio de melhor aluno.
Inicia os estudos universitários na Faculdade de Direito de Coimbra.
Adere ao Opus
Dei, como membro numerário.
1953
Fica
isento do Serviço Militar.
1954
Concluído
o terceiro ano de Direito, transfere-se para a Universidade de Lisboa.
1956
Termina a licenciatura em Direito. Parte para Roma, a fim de cursar Direito Canónico no Pontificium Athenaeum Angelicum, Facultas luris Canonici (Pontifícia Universidade S. Tomás de Aquino).
Traduz Les Quarante-huit Amériques, de Raymond Cartier, e
prefacia a edição portuguesa da biografia de Shakespeare One Crown with a
Sun, de Rurh Holland.
1957
Conclui a licenciatura em Direito Canónico com a classificação de magna cum laude.
Dá
início a uma longa colaboração nas páginas da revista Rumo, com o artigo
«Roma Volta a Ser Seiscentista - Exposição de Pintura e Escultura em Via
Nazionale».
1958
Defende a dissertação de doutoramento em Direito Canónico Ficção Literária e Censura Eclesiástica, aprovada com a classificação de magna cum laude.
Regressado
a Lisboa, assume funções de director literário da Editorial Aster, que exercerá
durante cerca de três anos.
1959
Integra o Conselho de Redacção da revista Rumo, até 1966.
Traduz Pilote de
Guerre, de Saint-Exupéry, e Vida de
Cristo, de Justo Pérez de Urbel.
1960
Inicia o estágio para a advocacia como Subdelegado do Procurador da República.
É adjunto da Direcção do Serviço de Escolha de Livros do Ministério da Educação Nacional, cargo que abandona quando está prestes a ser nomeado Director.
Traduz Briefi über Selbstbildung, do teólogo Romano Guardini.
Durante o Verão, profere
quatro palestras sobre temas literários na Emissora Nacional.
1961
Abandona o Opus Dei.
Estreia-se com o livro de poesia Aquele Grande Rio Eufrates.
Publica o ensaio Poesia Nova, em separata da Rumo.
É representado na Antologia da Poesia Universitária (org. Alfredo Barroso, Fiama Hasse Pais Brandão, J.M. Vieira da Luz e Rui Namorado) e na segunda edição da Antologia da Novíssima Poesia Portuguesa (org. Maria Alberta Menéres e E.M. de Melo e Castro).
Em outubro, matricula-se no curso de
licenciatura em Filologia Românica da Faculdade de Letras da Universidade de
Lisboa, onde terá como condiscípula a sua futura Mulher, Maria Teresa Carriço
Marques.
1962
Publica o segundo livro de poesia, O Problema da Habitação - Alguns Aspectos.
É bolseiro de investigação, até 1968, da Fundação Calouste Gulbenkian.
Participa na greve académica.
1963
É nomeado Subdelegado do Procurador da República no 4.º Juízo Correccional
da Comarca de Lisboa.
1964
Traduz
L'Art Moderne, de Joseph-Emile Muller, e La Bête Quaternaire, de
Renée Massip.
1965
Organiza
e prefacia uma nova edição de Os Brilhantes do Brasileiro, de Camilo
Castelo Branco.
Saem
do prelo, entre outras, as traduções de Contes et Légendes de l'Egypte
Ancienne, de Marguerite Divin, Récits Tirés de l'Histoire de Rome, de
Jean Defrasne, Considérations sur les Causes de la Grandeur des Romains et
de leur Décadence, de Montesquieu, e Essai sur les Libertés, de Raymond
Aron.
1966
Casa com Maria Teresa Marques, em Vila do Conde.
Dirige o serviço de edições da União Gráfica. Publica o terceiro livro de poesia, Boca Bilingue. Organiza e prefacia Prosas Dispersas, de Antero de Quental.
Traduz Moravagine,
de Blaise Cendrars, e Un Sens à la Vie, de Saint-Exupéry.
1967
Nasce o primeiro filho, Diogo.
Licencia-se em Filologia Românica, com média de 17 valores.
Alimenta o projecto de uma tese de licenciatura subordinada ao tema «O Soneto na Literatura Portuguesa a partir do Simbolismo», que não chegará a concrerizar-se.
Profere conferências sobre Manuel Bandeira, na Sociedade
Nacional de Belas Artes, e sobre as relações entre poesia e educação, no Colégio
Moderno da Covilhã.
1968
Nasce o segundo filho, Duarte.
Vem a lume o ensaio Manuel Bandeira em Verso e Prosa, em separata da revista O Tempo e o Modo.
Traduz e prefacia Citadelle,
de Saint-Exupéry.
1969
Publica a colectânea de estudos Na Senda da Poesia e, em separara da revista Ocidente, o ensaio Camóes e o Seu Crítico - Jorge de Sena.
É representado na quarta série da antologia Líricas Portuguesas, com organização de António Ramos Rosa.
Candidata-se a deputado por Lisboa, nas listas da Comissão
Eleitoral de Unidade Democrática, lideradas por Mário Soares.
1970
Sai
o quarto livro de poesia, Homem de Palavra[s]. É
co-fundador da
SEDES – Associação para o Desenvolvimento Económico e Social, integrada por personalidades
liberais e progressisras, entre as quais António Alçada Baptista, Adérito Sedas
Nunes, Alfredo de Sousa e João Salgueiro.
1971
Publica
Poemas Escolhidos, de Jorge Luis Borges. Prefacia Sob Sobre Voz, de
João Miguel Fernandes Jorge, bem como a segunda edição de Pelo Sonho É que
Vamos, de Sebastião da Gama.
Colabora em Outubro, compilação de Casimiro de Brito e Gastão Cruz.
Parte para Espanha, apesar das tentativas de impedimento pela PIDE, a fim de exercer funções de Leitor de Português na Universidade Complutense de Madrid.
Reside no Colegio
Mayor Casa do Brasil e, depois, no Colegio Mayor Nuestra Sefiora de Guadalupe,
até 1977.
1972
Reedita Aquele Grande Rio Eufrates.
Publica, em Madrid, o celebrado «Encontro de Garcilaso de la Vega com Dona Isabel Freire, em Granada, no Ano de 1526».
Traduz La Révolution Russe de 1917, de Marc Ferro.
Colabora na compilação Poesia 71, de Fiama Hasse Pais Brandão e Egito Gonçalves.
Começa a frequentar a praia
da Consolação.
1973
Lança o quinto volume de poesia, Transporte no Tempo, e a antologia pessoal País Possível, «Um livro novo» com o importante inédito «Pequena História Trágico-Terrestre».
Verte para português a comédia Dona Rosita la Soltera o El Lenguaje de las
Flores, de Federico García Lorca.
1974
Dá à estampa um novo livro, com o longo poema épico-dramático A Margem da Alegria.
Nasce o terceiro filho, Catarina.
Finaliza as «legendas em verso»
para o volume Os Poucos Poderes, em colaboração com João Miguel
Fernandes Jorge, sobre fotografias de Jorge Guerra, que só virá a público em 1984,
pela mão de José Sasportes.
1976
Publica
o livro de poesia Toda a Terra.
1977
Edita
a plaquette de poemas Despeço-me da Terra da Alegria, com desenho
de José Rodrigues.
Regressa a Lisboa.
Vê recusado pelo Ministério da Educação e Cultura um pedido de equiparação
a bolseiro, passando a leccionar em horário nocturno na Escola Técnica do Cacém.
Figura
na antologia de Pedro Tamen 20 Anos da Colecção Círculo de Poesia - 20
Anos de Poesia Portuguesa.
1978
Reedita Homem de Palavra[s].
A 8 de Agosto, quando se prepara para concorrer ao lugar de Assistente da Faculdade de Letras de Lisboa, instituição que sempre lhe recusou a possibilidade de nela leccionar, morre subitamente, na sua casa de Monte Abraão, em Queluz, vítima de edema pulmonar.
A revista Raiz e Utopia divulga o poema inédito «Na Noite de Madrid».
A Editorial Inova, do Porto, publica Homenagem a Ruy Belo, com o inédito «Poema para a Catarina» e colaboração de Ruy Cinatti, Eugénio de Andrade, Pedro Tamen, Fernando Assis Pacheco, Gastão Cruz, João Miguel Fernandes Jorge, Joaquim Manuel Magalhães, Manuel Cintra e José Rodrigues.
No final do ano, sai a reedição, aumentada com dois poemas, de Despeço-me da Terra da Alegria.
Ruy Belo será condecorado pelo «país possível», em 1991, no Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas, com o grau de Grande Oficial da Ordem Militar de Santiago da Espada.
“Cronologia e bibliografia de Ruy Belo”, por Maria de Fátima Pinheiro Alves e Ana Maria Pereira Soares in Todos os poemas, Ruy Belo – 4.ª ed. - Porto: Assírio & Alvim, 2014. - 894 p.: il. ; 23 cm. - (Obras de Ruy Belo). - Bibliografia, p. 875-880. - ISBN 978-972-37-1417-3
BIBLIOGRAFIA DE RUY BELO
POESIA
1961 Aquele Grande Rio Eufrates, Edições Ática, Lisboa.
1962 O Problema da Habitação - Alguns
Aspectos, Col. Círculo de Poesia, Livraria Moraes Editora, Lisboa.
1966 Boca Bilingue, Edições Ática, Lisboa.
1970 Homem de Palavra[s], Col. Cadernos de Poesia,
Publicações Dom Quixote, Lisboa.
1972 Aquele Grande Rio Eufrates, 2.ª ed., Col. Círculo de
Poesia, Moraes Editora, Lisboa.
1973 Transporte no Tempo, com prefácio do autor,
Col. Círculo de Poesia, Moraes Editora, Lisboa.
País
Possível, com
prefácio do autor, Col. Cadernos Peninsulares, Assírio &
Alvim,
Lisboa.
1974 A Margem da Alegria, Col. Círculo de Poesia,
Moraes Editora, Lisboa.
1976 Toda a Terra, Col. Círculo de Poesia,
Moraes Editora, Lisboa.
1977 Despeço-me da Terra da Alegria, com um desenho de José
Rodrigues, Col. O Oiro do Dia, Editorial Inova, Porto.
1978
Homem de Palavra[s}, 2.ª ed., com prefácio do autor, Col. Forma,
Editorial Presença, Lisboa.
ENSAIO E CRÍTICA
1958 Ficção Literária e Censura Eclesiástica, Tese de Doutoramento em
Direito Canónico, Roma, Faculdade de Direito Canónico (obra inédita em livro).
1961 Poesia Nova - Tentativa de
Caracterização da Poesia, separata da revista Rumo, Lisboa.
1968 Manuel Bandeira em verso e Prosa, separata da revista O Tempo
e o Modo, n.º 62-63, Lisboa.
1969 Na Senda da Poesia, União Gráfica, Lisboa.
Camões
e o Seu Crítico -
Jorge de Sena, separara da revista Ocidente, vol. LXXVII, Lisboa.
TRADUÇÕES DE RUY BELO
ANKER-GARIN,
Louise
[1967] Por esse Mundo Fora, Editorial Aster, Lisboa.
ARON,
Raymond
[1965] Ensaio sobre as Liberdades, Editorial Asrer, Lisboa.
BORGES,
Jorge Luis
1971 Poemas Escolhidos, selecção feita pelo Autor,
Publicações Dom Quixote, Lisboa; 2.ª ed., 1985.
2003 Poemas Escolhidos, selecção feita pelo
Autor, edição bilingue, Publicações Dom Quixote, Lisboa.
BOURLIAGUET,
L.
[1967] Os Canhões de Valmy, Editorial Aster, Lisboa.
CARTIER,
Raymond
1956 As 48 Américas, Editorial Aster, Lisboa;
reeditado com o título Um Europeu no País dos Dólares [1963].
CENDRARS,
Blaise
1974 Moravagine, com prefácio de Ruy Belo,
Ulisseia, Lisboa; 3.ª ed., Cotovia, Lisboa, 1992.
CRISENOY,
Maria de
[1965] As Três Tulipas, Editorial Aster, Lisboa;
2.ª ed., 1972.
DAUJAT,
Jean
1966 Conhecer o Cristianismo, Editorial Aster
Lda /Casa do Castelo, Lisboa /Coimbra.
DEFRASNE,
Jean
1965 Histórias da História de Roma, Livraria Moraes Editora,
Lisboa.
DIVIN,
Marguerite
1965 Contos e Lendas do Egipto Antigo, Livraria Moraes Editora,
Lisboa.
EYDOUX,
Henri-Paul
s/d
A História Arrancada à Terra, Editorial Aster, Lisboa.
FERRO,
Marc
1972 A Revolução Russa de 1917, Publicações Dom Quixote,
Lisboa, 1972; 2. ª ed., 1975.
GARCÍA
LORCA, Federico
1973 Dona Rosinha a Solteira ou a Linguagem das
Flores, Editorial
Estampa - Seara Nova, Lisboa; 2.ª ed., 1991; 3.ª ed., Assírio &
Alvim, Lisboa.
GEBHARDT,
Hertha von
[1965] As Cartas de Nic, Editorial Aster, Lisboa.
GUARDINI,
Romano
1960 Cartas de Formação, Editorial Aster, Lisboa.
MARROU,
H.I.
[1967] Do Conhecimento Histórico, Editorial Aster, Lisboa.
MASSIP,
Renée
[1964] O Animal Quaternário, Editorial Aster,
Lisboa.
MONTESQUIEU
1965 Considerações sobre as Causas da Grandeza e Decadência
dos Romanos, com introdução e notas de Ruy Belo, Editorial Presença, Lisboa;
2.ª ed., Assírio & Alvim, Lisboa, 2002.
MULLER,
Joseph-Emile
1964 A Arte Moderna, Editorial Presença,
Lisboa.
PÉREZ
DE URBEL, Justo
1959 Vida de Cristo, Editorial Aster, Lisboa;
2.ª ed., 1978.
SAINT-EXUPÉRY,
Antoine de
[1959] Piloto de Guerra, Editorial Aster, Lisboa;
9.ª ed., 1976.
[1966] Um Sentido para a Vida, com prefácio de Ruy Belo, Editorial
Aster, Lisboa; 4.ª ed., 1976.
[1968] Cidadela, com prefácio de Ruy Belo, Editorial
Aster, Lisboa; 4.ª ed., Editorial Presença, Lisboa, 2008.
EDIÇÕES ORGANIZADAS POR RUY BELO
CASTELO
BRANCO, Camilo
1965 Os Brilhantes do Brasileiro, com prefácio de Ruy Belo,
Parceria A.M. Pereira, Lisboa.
QUENTAL,
Antero de
1966 Prosas Dispersas, com prefácio de Ruy
Belo, Editorial Presença, Lisboa.
[…]
“Cronologia e bibliografia de Ruy Belo”, por Maria de Fátima Pinheiro Alves e Ana Maria Pereira Soares in Todos os poemas, Ruy Belo - 4.ª ed. - Porto: Assírio & Alvim, 2014. - 894 p.: il. ; 23 cm. - (Obras de Ruy Belo). - Bibliografia, p. 875-880. - ISBN 978-972-37-1417-3
CARREIRO, José. “Ruy
Belo: Despeço-me da Terra da Alegria”. Portugal, Folha de Poesia,
08-08-2022. Disponível em: https://folhadepoesia.blogspot.com/2022/08/ruy-belo-despeco-me-da-terra-da-alegria.html
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